23/07/2021 - 18:47
Depois de operar em queda firme pela manhã, diante da expectativa de que uma eventual alta mais pronunciada da taxa Selic, na esteira do IPCA-15 de julho, aumente a atratividade da renda fixa brasileira, o dólar ganhou força à tarde e, em meio a muita volatilidade, fechou praticamente estável.
A percepção nas mesas de operação é que o comportamento do dólar no exterior, aliado ao quadro político interno conturbado, acabou levando investidores a realizar lucros e recompor posições defensivas, algo típico em véspera de fim de semana. Além disso, a liquidez é reduzida (cerca de US$ 10 bilhões no contrato futuro para agosto), o que torna o mercado muito suscetível a oscilações mais fortes e abruptas.
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Com mínima de R$ 5,1590 pela manhã, quando chegou a recuar mais de 1%, e máxima de R$ 5,2330 (à tarde), o dólar à vista fechou praticamente estável, a R$ 5,2105 (-0,05%). A moeda americana encerra a semana com valorização de 1,86%, em razão, sobretudo, do avanço de 2,64% na segunda-feira, 19, no auge dos temores com eventual impacto da disseminação da variante Delta do coronavírus sobre o crescimento global. Em julho, a alta acumulada é de 4,77%.
Pela manhã, o real esboçou uma rodada de forte apreciação, na esteira da divulgação de alta de 0,72% do IPCA em julho. Apesar de ter desacelerado em relação a junho (0,83%), o índice veio acima das expectativas, de 0,65%, pela mediana do Projeções Broadcast. Além disso, houve uma aceleração do segmento de Serviços, mais sensível ao ritmo da atividade econômica.
Para o sócio e economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho, o resultado do IPCA-15 fez o mercado começar a flertar com a possibilidade de a taxa Selic atingir 7% ou 7,5% no fim do ano, em uma eventual aceleração do ritmo de aperto monetário, de 0,75 ponto para 1 ponto porcentual, já na reunião do Copom em agosto. “Isso aumenta a atratividade da renda fixa e ajuda a tirar um pouco de pressão sobre o dólar, o que explica esse alívio pontual da taxa de câmbio mais cedo”, diz Velho.
Para o economista, uma eventual rodada de apreciação do real esbarra, contudo, em obstáculos externos e domésticos. Por aqui, começa a surgir uma preocupação com a questão fiscal, diante do temor de uma guinada populista do governo Jair Bolsonaro, que deu mais espaço ao Centrão no governo e já se prepara para as eleições de 2022.
“É preciso ver com atenção qual vai ser a proposta orçamentária de 2022 e o tamanho do reajuste do Bolsa família para saber a direção que o governo vai tomar”, diz Velho, ressaltando que o rearranjo ministerial, com o avanço do Centrão, consolida o apoio político ao presidente Jair Bolsonaro e tira o impeachment do radar, mas pode agravar a pressão por gastos.
Velho também destaca que o real pode sofrer com o fortalecimento global do dólar diante da expectativa crescente de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) possa começar a reduzir o ritmo de estímulos monetários. Isso inibiria as operações de ‘carry trade’, apesar de a liquidez seguir farta e da expectativa de taxa Selic mais elevada.
O economista-chefe da Integral Group, Daniel Miraglia, ressalta que as bolsas americanas se recuperaram da onda de aversão ao risco, mas o índice DXY não “está conseguindo acompanhar”, porque a “verdadeira preocupação do mercado” é com o início da redução de compra de bônus pelo Fed, o chamado ‘tapering’.
“A cepa Delta pode provocar aumento do número de casos, mas não de hospitalizações e mortes, porque as vacinas são eficazes. O que assusta é a inflação nos Estados Unidos e a resposta do Fed”, diz Miraglia, que aposta em início do ‘tapering’ ainda neste ano, o que limitaria espaço para queda adicional do dólar por aqui.