Nunca uma palavra teve tanto significado. O desaparecimento do termo “paciente” do comunicado mais recente, emitido pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) na quarta-feira 18, causou comoção nos mercados ao redor do mundo. O índice Standard & Poor’s de 500 ações (S&P 500) subiu 1,2% na quarta-feira, para recuar 0,5% na quinta-feira 19. Em Londres, o comportamento foi semelhante. O que parece ser uma discussão meramente semântica mascara a discussão econômica mais importante desta década. Em 2008, a crise do subprime provocou um terremoto no sistema financeiro e lançou Europa, Estados Unidos e Japão nos abismos da recessão, gerando a pior crise desde 1929.

Naquela ocasião, os banqueiros centrais seguiram o receituário ortodoxo, cortando o crédito para impedir um descontrole nas contas públicas. O resultado foi uma quebradeira dos bancos, que faria a recessão prolongar-se pela década de 1930. Na crise de 2008, a estratégia foi inversa. Liderados por Ben Bernanke, então presidente do Fed, os bancos centrais dos Estados Unidos, Europa, Inglaterra e Japão inundaram o mercado de dinheiro a custo zero. O objetivo foi salvar os bancos e impedir um aprofundamento da recessão. O resultado foi um aumento dos preços dos ativos que, até agora, não dá sinais de acabar.

Os índices de ações dos Estados Unidos registram recordes históricos. Essa exuberância, porém, não vinha tendo contrapartida na economia real. A criação de empregos permanece fraca na Europa até hoje. No entanto, o mercado de trabalho americano mostra sinais de aquecimento. Em janeiro e fevereiro foram abertas 552 mil novas vagas. Foram mais de 1,2 milhão de novos postos de trabalho em três meses, o melhor resultado desde 1997. O desemprego recuou para 5,5% em janeiro, o menor nível em sete anos. A inflação está controlada.

O índice de preços ao produtor registrou deflação entre outubro de 2014 e fevereiro passado, graças, principalmente à queda dos preços do petróleo. “A dúvida é até quando o petróleo em queda e o dólar valorizado vão manter os preços baixos”, diz Ian Shepherdson, economista-chefe da consultoria Pantheon Macroeconomics. Tudo isso anima as apostas de quando o Fed vai começar a elevar os juros, o que deve fortalecer o dólar e derrubar as ações – inclusive no Brasil.

O banco indicou que os juros não vão disparar. “É pouco provável que as taxas subam em abril”, informou o banco por meio de um comunicado oficial. Os juros para dezembro no mercado futuro de Chicago fecharam indicando taxas entre 0,5% e 0,75% ao ano no início de 2016. O temor do mercado é justificado. Nos dias antes da reunião, os analistas americanos compararam as condições econômicas atuais com as de 1937. Naquele ano, após ter mantido os juros em baixa por um longo período, o Fed voltou a elevar as taxas, o que não apenas derrubou as ações como mandou os Estados Unidos de volta à recessão.

A alta dos juros fortalece o dólar. No Brasil, o câmbio fechou a R$ 3,30 na quinta-feira 19, o maior nível desde abril de 2003. Isso prejudica as empresas americanas. Uma pesquisa do Deutsche Bank indica que 40% dos resultados das companhias com ações listadas no S&P 500 vêm de fora dos Estados Unidos, e um câmbio valorizado deverá submeter esses resultados a uma dieta. Por isso, em uma entrevista após a reunião, a economista Janet Yellen, presidente do Fed, tentou atenuar o impacto da decisão. “Só porque não estamos mais dizendo que seremos pacientes, não quer dizer que nos tornamos subitamente impacientes”, disse ela.