18/08/2001 - 7:00
Cinco anos depois, a explosão do Osasco Plaza Shopping, em São Paulo, continua fazendo estragos. Dessa vez, os estilhaços ameaçam atingir o poderoso Grupo Ultra. Famílias de vítimas, empresas envolvidas no caso e especialistas acusam a dona da marca Ultragaz pelo acidente. A nova versão foi denunciada à Justiça e ao governo.
Nos tribunais, correm mais de 20 processos movidos por parentes de pessoas atingidas pela explosão. A Itaú Seguradora também pede judicialmente que a companhia do empresário Paulo Cunha ressarça o valor do seguro pago. Entre custos para reerguer a construção e cobrir indenizações, a quantia se aproxima dos R$ 20 milhões. ?O Grupo Ultra tinha a obrigação de saber das irregularidades cometidas na construção e evitar a tragédia?, afirma Maurício Luís Pinheiro Silveira, que representa a seguradora. Os efeitos explosivos do
caso não param por aí. Em junho, pousou sobre a mesa do ministro da Justiça, José Gregori, um dossiê relatando detalhes das
condições em que o sistema de gás foi instalado. São atas de reuniões, propostas, contratos e laudos até então mantidos sob sigilo. O documento, a que a DINHEIRO teve acesso com exclusividade, está sendo avaliado pela Ouvidoria da República
e Corregedoria Geral da União.
A explicação levantada por esses processos pode dar uma guinada no caso. Até hoje, cinco pessoas foram condenadas: dois
executivos do shopping e três representantes da Wisling Gomes Construtora, responsável por parte das instalações de gás.
Ficaram de fora a Projeção, autora do projeto; a BRR Gerenciadora, administradora das obras, e principalmente o Ultra, distribuidor
do gás. Eles são os alvos das iniciativas que retomaram o debate sobre o caso. Acusação: foram inúmeras as irregularidades cometidas nas instalações de gás. Todas elas, afirma o dossiê, conhecidas pelos fornecedores.
Para começar, a canalização foi instalada diretamente no subsolo. Boa parte dela ainda acabou fixada diretamente no concreto, sem contar sequer com tubos-luva, usados para evitar o confinamento do fluido em locais não ventilados e permitir que, num caso de vazamento, seja conduzido ao exterior. ?Com essa instalação, fica impossível detectar um vazamento e corrigi-lo?, afirma o técnico de gás Bernardo Roberto de Souza. ?Não daria para tomar qualquer providência preventiva para evitar a explosão?, diz Cláudio Cordeiro, perito do Instituto de Criminalística.
O dossiê mostra que profissionais da Ultragaz acompanharam a adoção do sistema. Em reunião do dia 23 de fevereiro de 1995, por exemplo, o técnico de instalações industriais da empresa, Alexandre Toledo, chegou a apresentar uma alternativa improvisada para a baixa pressão e a inviabilidade no transporte do gás da central para as lojas. Vinte dias depois, a empresa entregou proposta para fornecer a instalação para armazenagem e consumo de GLP (Gás Liqüefeito de Petróleo). Ao contrato firmado acrescentou adendo estabelecendo assistência técnica gratuita. Nas ações judiciais, o Grupo Ultra tem se defendido argumentando que ignorava o projeto, desconhecia o estado das instalações e sequer havia assumido a responsabilidade de prestar serviços de manutenção da rede. ?A Ultragaz tinha a responsabilidade legal de se certificar se todo o sistema estava correto?, dispara Silveira. ?A empresa não pode chegar e ir distribuindo o gás onde bem entender.? Para o advogado da Ultragaz, Rodrigo Arantes Barcellos, o compromisso com o shopping se limitava à central de gás. ?Ela continuou incólume.? E acrescenta: ?Estão querendo encontrar alguém para arcar com os gastos causados pela explosão?.
A legislação exige que a distribuição de gás seja condicionada às perfeitas condições do sistema de gás. Segundo o artigo 4º da portaria 16/91 do Departamento Nacional de Combustíveis (DNC) ? substituído pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) ?, a distribuidora de GLP só poderá abastecer uma instalação centralizada após comprovar que tanto a construção quanto os ensaios e testes foram realizados de acordo com as normas vigentes. ?Esse cuidado não foi tomado?, acusa Silveira. O mecânico da Ultragaz Antônio Carlos de Souza, por exemplo,
foi convocado três vezes para verificar queixas sobre o cheiro de gás alguns dias antes da explosão, mas não fez qualquer teste para tentar detectar um vazamento. ?Usei
o olfato?, disse, em depoimento à Polícia Civil sobre o acidente.
?Pelo tipo de instalação e as reclamações sobre vazamento, ali poderia haver risco de algum acidente.? O alerta, na
delegacia, chegou tarde demais.