11/04/2012 - 21:00
Jobs vivia em um bairro operário, cercado por empresas de tecnologia e os seus vizinhos estavam sempre envolvidos em projetos de ponta. “A maioria dos pais do bairro fazia coisas realmente legais, como células fotoelétricas, pilhas e radares”, contou ele ao jornalista Walter Isaacson, autor do best seller Steve Jobs. “Ao crescer, fui inspirado pela história do lugar.” O resultado dessa inspiração é bem conhecido. A passagem relatada pelo empresário ilustra bem o ambiente favorável que havia nos Estados Unidos daquela época, no qual já existiam empresas-modelo como a HP, IBM e Intel, para que surgissem start-ups vitoriosas como a própria Apple. Ao ler o livro, me lembrei de uma das primeiras entrevistas que fiz com um empresário brasileiro, nos anos 1990. Era fundador de uma companhia da área de eletroeletrônicos, com uma marca muito famosa, na ocasião.
Na década de 1960, já havia um ambiente favorável à inovação nos Estados Unidos,
no qual a HP (foto), IBM e Intel prosperavam.
Ele foi de uma sinceridade tão assombrosa que nunca mais esqueci. “A qualidade dos nossos produtos está de acordo com o padrão do mercado brasileiro”, disse ele. “Não tenho parâmetro da qualidade internacional porque não preciso, o consumidor não me exige.” Entre a SunnyVale dos anos 1960 e o empresário brasileiro dos anos 1990 há uma relação direta com o Brasil de 2012. O governo ainda precisa repetir pacotes de medidas para a indústria, como o anunciado na semana passada, para corrigir o gap entre esses dois mundos. O Estado brasileiro continua sem ousadia para oferecer um ambiente inspirador a empresas inovadoras, assim como falta ambição aos empresários brasileiros em mirar-se no padrão mundial para ter mais qualidade. Não por acaso, as companhias exportadoras, ou que competem em setores mais abertos à competição global, são as mais inovadoras e lucrativas.
É o caso da Embraer, da Petrobras, da Totvs e da Vale, as raras representantes locais que entraram na lista das companhias mais inovadoras do mundo da consultoria Booz Company. Elas também pagam o custo Brasil e sofrem com a burocracia nacional. Ah, sim, alguém dirá que uma é protegida por ser estatal, outra recebeu incentivos do BNDES e a terceira teve aporte de capital internacional. Mas o fato de elas terem investimentos consistentes em inovação não conta? Durante o anúncio das novas regras para o acordo automotivo, o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, fez uma ponderação importante. Ao explicar que as montadoras deveriam investir 0,15% do seu faturamento em inovação, Pimentel admitiu que o porcentual que passa a tornar-se obrigatório parecia pequeno.
“Quero dizer que a maioria das empresas instaladas no Brasil, hoje, infelizmente, aplica menos do que isso em inovação stricto sensu.” A alfinetada é justa, mas também precisa ser partilhada com o poder público. Isso porque embora incentive a inovação com regimes especiais, como a Lei do Bem, lançada há seis anos, o Estado não facilita o acesso às isenções fiscais para empresas de pequeno porte, que é onde efetivamente começa a inovação. Ao tornar-se a sexta economia do mundo, o Brasil não pode mais pensar como o empresário dos anos 1990, que fora protegido pela Reserva da Informática. Agora não há mais fronteiras no planeta. Por isso precisamos de um salto quântico de mentalidade. Em tempo: o empresário citado quebrou na virada do século 21.