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“Cláudio Vaz, meu candidato, conhece a indústria como poucos”

 

 

DINHEIRO ? O sr. também acha que agora vai?
HORÁCIO LAFER PIVA ? Depende do que você entende por ?agora vai?. O ministro Antônio Palocci fez um trabalho importante de ajuste, mas ainda não temos garantia de crescimento sustentado, que é o que o Brasil precisa. Temos vivido nos últimos anos com ciclotimia, com volatilidade, com esse stop-and-go da economia brasileira. O trabalho feito até agora garante que teremos em 2004 um crescimento melhor do que tivemos em 2003. Mas quando chegarmos em 2005 poderemos sofrer um novo recuo se não partirmos já para uma nova fase de investimento.

DINHEIRO ? Que tipo de investimento?
PIVA ? Sobretudo aqueles de infra-estrutura. A infra-estrutura é um gargalo na economia brasileira. Temos problemas em energia e logística, com portos e estradas. Estamos vivendo um momento de oportunidades. O ajuste foi feito e a macroeconomia vai bem. O desafio é contemplar a microeconomia.

DINHEIRO ? Palocci dá a entender que o Brasil superou a crise e o crescimento não será um vôo de galinha.
PIVA ? Não sou capaz de garantir que não haverá vôo de galinha porque isso vai depender dos investidores colocarem recursos no
País. Se não houver investimento em 2004 teremos outra queda em 2005. É bom lembrar que temos um Estado que engole 42% da renda nacional. Quero ver de que maneira conseguiremos adequar esse Estado à renda nacional.

DINHEIRO ? Quanto tempo leva para a indústria recuperar as vagas que foram fechadas ao longo do tempo?
PIVA ? Bastante tempo. Em épocas de dificuldade você incorpora tecnologias que poupam mão-de-obra. Se houver segurança de crescimento sustentável, o empresário se sente mais tranqüilo em relação a abertura de novas vagas. Caso contrário ele continua usando horas extras. O tema do emprego é um dos mais dramáticos no Brasil. Os 10 milhões de empregos propostos pelo governo Lula dificilmente serão criados.

DINHEIRO ? O sr. disse outro dia que a Fiesp vai começar a cobrar. Acabou o namoro com o governo Lula?
PIVA ? No início de qualquer governo existe um olhar mais generoso por parte da sociedade em relação àqueles que chegam. Principalmente quando se trata de um governo que não tem experiência anterior de poder. Nós passamos esse primeiro ano com um grau de interlocução muito positivo com o governo, mas agora a conversa tem de se transformar em ação. O governo precisa colocar o resgate do crescimento como meta central da agenda.

DINHEIRO ? A boa relação com o governo não se refletiu na reforma tributária. O empresariado se sentiu ouvido?
PIVA ? Na reforma tributária, não. Recebemos um projeto de reforma
que era muito tímido em relação a
tudo o que tínhamos discutido com o governo. Quando o projeto
foi para o Senado, acreditávamos que poderia sofrer modificações importantes, mas acabou se transformando em um grande
Frankstein. Por fim surgiu a proposta de fatiamento apresentada
pelo senador Tasso Jereissati, que serviu para o governo escapar
de uma situação encrencada.

DINHEIRO ? Essa proposta foi uma reforma tributária?
PIVA ? Não mesmo. Ela resolve os constrangimentos financeiros do Estado e mexe algumas coisas, mas está longe de ser uma reforma tributária ? embora a cada dia que passe fique mais claro a falta que faz uma boa reforma. Este ano, por exemplo, nós teremos negociações internacionais. Alca e União Européia saem do ambiente acadêmico e vão para a prática. Aí vai deixar muito clara a nossa assimetria tributária em relação aos países desenvolvidos.

DINHEIRO ? O governo foi débil na condução da reforma?
PIVA ? Acho que o governo ficou com medo de que a reforma pudesse representar uma perda de arrecadação. Não se sentiu
seguro para ousar, como prometeu que faria na campanha. Com
isso acabou ouvindo muito mais os governadores, que colocaram
seus pequenos cacos no projeto. Ou seja: de um lado o governo
ficou com medo de perder receita e de outro de perder apoio
político. E aí fez uma não-reforma.

DINHEIRO ? No capítulo das coisas que faria e não fez, o governo também disse que daria maior apoio à produção…
PIVA ? Nós achamos que o ajuste macroeconômico tinha que ser feito. Não adiantava colocar a produção no centro da agenda se não tivesse estabilidade. Mas não tenho dúvida que poderíamos ter andado melhor em uma série de questões.

DINHEIRO ? O sr. está satisfeito com o ministro Furlan?
PIVA ? Acho que o Ministério do Desenvolvimento pode fazer muito mais e que o ministro Furlan tem competência para isso. Mas é preciso resolver a questão da atribuição. A política industrial é um exemplo: o Desenvolvimento discutiu, o ministro Gushiken tinha outro grupo discutindo, o Palocci também tinha uma equipe tratando do assunto e o BNDES uma outra. Acho que o Ministério do Desenvolvimento é quem deve coordenar uma política industrial, tecnológica e de comércio exterior.

DINHEIRO ? O empresariado paulista está perdendo poder?
PIVA ? As pessoas tendem a lembrar de um tempo em que existiam apenas três interlocutores na cena nacional: as Forças Armadas, os sindicatos e a Fiesp. Hoje em dia há uma multiplicidade de representações. O cenário é diferente e a Fiesp se legitima pela qualidade do seu discurso. Mas também não é bom ter poder absoluto, porque cria a impressão de que São Paulo detém o monopólio da representação econômica e política.

DINHEIRO ? No caso da Zona Franca de Manaus, São Paulo tem sido impotente para fazer valer seu ponto de vista.
PIVA ? A Zona Franca é um bom exemplo da capacidade de união dos Estados daquela região na defesa dos seus interesses. Agora, finalmente, parece que ela vai se voltar para a exportação, como previa o projeto original que nunca ocorreu. Tomara. O Brasil todo perdeu com as isenções da Zona Franca e talvez agora haja algum tipo de compensação com as exportações.

DINHEIRO ? E a redução do spread bancário? Também aí o esforço da Fiesp não deu em nada…
PIVA ? Mas o próprio sistema financeiro está percebendo que vai ter de discutir esse assunto. Não há condições de seguir como está. Tenho conversado regularmente com o setor financeiro, troco e-mails freqüentemente com o Roberto Setubal (do Itaú) e com o Pedro Moreira Salles (do Unibanco) sobre essa questão. Estamos preparando um seminário junto com a Febraban. O sistema bancário ainda tem dificuldade em trocar spread por escala, mas certamente será levado a isso. Primeiro, porque faz parte da personalidade deste governo. Segundo, porque, à medida que o mercado cresce, novas oportunidades surgem. Se eles não pegarem, outros pegarão.

DINHEIRO ? Como o sr. avalia a negociação da Alca?
PIVA ? Vejo que os EUA e a União Européia ainda acreditam que podem forçar temas como serviços e investimentos sem incluir agricultura. Mas isso não vai dar certo. Se nós não tivermos condições de abrir para nossa agricultura, onde somos competitivos, não vamos dar espaço em outras áreas.

DINHEIRO ? Mas existem setores na indústria que querem assinar a Alca a qualquer preço…
PIVA ? São três ou quatro setores que fazem pressão, como o têxtil. A maioria não pensa assim. Acho que o projeto apresentado pelo governo brasileiro traz riscos, mas criou um certo alívio. Mas os empresários precisam se envolver muito mais do que fizeram até agora. A Alca vai ser aquilo que sair da mesa de negociação. Imaginar que o governo sozinho tem todas as ferramentas e sabe o que a indústria precisa é um enorme risco.

DINHEIRO ? Em setembro o sr. deixa a Fiesp. Como está a entidade?
PIVA ? Acredito que fizemos um bom trabalho de reforma administrativa e reposicionamento político. A Fiesp é uma grande máquina, com orçamento de quase R$ 1 bilhão. Deixarei ao meu sucessor uma organização melhor.

DINHEIRO ? Por que o sr. decidiu apoiar a candidatura de Claúdio Vaz?
PIVA ? Em primeiro lugar porque a Fiesp precisa de uma pessoa com grande capacidade técnica de discussão. Em segundo, porque essa pessoa precisa conhecer a entidade. O Cláudio reúne as duas qualidades. Tenho muito respeito pelos outros candidatos, reconheço que são pessoas vencedoras nos segmentos em que atuam, mas estou muito seguro com a minha escolha. Acho que o Claúdio está melhor preparado para as grandes discussões que esperam a indústria nos próximos anos.

DINHEIRO ? Mas seu candidato não é mais empresário…
PIVA ? Como não? Ele é muito mais industrial do que os outros dois: um aluga imóveis e o outro é um executivo profissional. O Cláudio tem as aplicações dele como eu tenho as minhas. Minhas ações da Klabin renderam 400% em 2003 e ninguém fica falando que eu sou especulador. O Cláudio tem sociedade em três empreendimentos, embora não esteja à frente de nenhum deles. Ele é um sujeito que começou de baixo, com uma pequena empresa com seis funcionários. Quando vendeu, essa empresa tinha US$ 140 milhões de faturamento. Não sei de onde tiram que ele não é mais empresário. É um sujeito que conhece a indústria como poucos.

DINHEIRO ? O sr. tem pretensões políticas?
PIVA ? Não tenho nenhuma pretensão política. Muitos apostavam que eu me candidataria a prefeito de São Paulo e ficaram esperando até o último minuto para ver se eu me filiaria. Tenho um perfil mais privado. Quando terminar meu mandato quero conviver com a minha filha. Ela tem cinco anos e eu preciso levá-la à escola.