16/07/2010 - 6:00
DINHEIRO ? Terminada a Copa da África, os chefes da Fifa acabam de declarar que ainda falta tudo no Brasil para 2014. Eles estão certos?
JUAN QUIRÓS ? De certa forma, sim. Muitos estádios não foram licitados, os aeroportos estão numa situação precária, com o transporte de passageiros crescendo 30% ao ano, e ainda existem problemas políticos como o do estádio de São Paulo. É muita coisa para resolver, num prazo relativamente curto. Mas acredito que a partir de agora as decisões serão tomadas aceleradamente.
DINHEIRO ? Qual é a melhor alternativa para São Paulo?
QUIRÓS ? Hoje, ainda é a reforma do estádio do Morumbi, onde um dos principais problemas é resolver a questão do estacionamento. O estádio já está lá, existem soluções para o sistema de transporte e a reforma pode ser feita no prazo necessário. Só que São Paulo precisa tomar uma decisão com rapidez porque esse tema acabará sendo utilizado na eleição estadual. Não faz nenhum sentido a região mais rica do País não ter um estádio apto para sediar uma Copa do Mundo no Brasil.
“Ampliar Viracopos é mais barato do que fazer outro aeroporto em São Paulo”
Terminal de Viracopos, em Campinas (SP)
DINHEIRO ? Mas se a Fifa é contra o Morumbi, sobrou o de Pirituba, não?
QUIRÓS ? Na minha opinião, o projeto do Piritubão não atende aos prazos de 2014. Isso porque não está pronto o acesso viário para a região. E o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, já disse que é contra um projeto que envolva o dispêndio excessivo de recursos públicos. De que adianta construir uma nova arena com recursos privados, se toda a infraestrutura será muito mais cara? O projeto do Piritubão não custaria menos de R$ 1 bilhão, enquanto o gasto estimado da reforma do Morumbi é da ordem de R$ 650 milhões. Ainda assim, é muito dinheiro para São Paulo.
DINHEIRO ? Há risco de São Paulo ficar de fora?
QUIRÓS ? Se o Morumbi não for aceito, acredito que ainda existe uma terceira alternativa, que talvez seja a mais barata de todas.
DINHEIRO ? Qual seria?
QUIRÓS ? Eu defendo a construção de um estádio na região próxima ao aeroporto de Viracopos, em Campinas, que já é servida pelas rodovias Anhanguera e Bandeirantes. Até porque o projeto do trem-bala, que está sendo licitado agora, só terá uma parte pronta antes de 2014, que é justamente a ligação entre São Paulo e Campinas. Um estádio novo, para 60 mil espectadores, no padrão exigido pela Fifa, custaria entre R$ 350 milhões e R$ 400 milhões. É bem mais barato do que o Piritubão e do que a própria reforma do Morumbi.
DINHEIRO ? Mas não seria estranho abrir a Copa fora de uma capital?
QUIRÓS ? Não, porque as regiões de São Paulo e Campinas estão se fundindo. Esse estádio estaria a menos de uma hora da Marginal Tietê. É menos tempo do que muita gente que vive na própria cidade de São Paulo levaria para ir ao Morumbi ? e isso sem falar no trem-bala. Além disso, há todo um público de regiões prósperas do interior de São Paulo.
DINHEIRO – Mas se muita gente diz que São Paulo não precisa de um quarto estádio, o que dizer de Campinas? Não seria mais um grande elefante branco?
QUIRÓS ? Acho que não. O interior de São Paulo tem clubes fortes, que mandam seus jogos em estádios dentro das cidades. Como muitos desses times estão quebrados, deveriam demolir seus estádios e investir em outro tipo de imóvel, como um shopping, para obter renda extra. E mesmo os grandes clubes da capital paulista, como Corinthians, São Paulo e Palmeiras, têm atraído mais público quando mandam seus jogos no interior.
“O estádio do Morumbi ainda é mais viável do que o projeto de Pirituba”
Estádio do São Paulo, que, até agora, não foi aceito pela Fifa
DINHEIRO ? A sua empresa pretende participar da construção dos estádios?
QUIRÓS ? Sim, mas para isso é preciso abrir o mercado da construção. Não adianta fazer uma licitação exigindo capital social mínimo de R$ 1 bilhão das empresas. Se for assim, vai acabar sendo um jogo para poucas empresas.
DINHEIRO ? Empresas menores teriam capacidade para fazer os estádios?
QUIRÓS ? Ninguém no Brasil tem experiência nessas novas arenas. Nem nós, nem as grandes empreiteiras. Os estádios que estão aí foram feitos há décadas. O que defendo é a democratização das oportunidades. Gostaríamos de participar associados a grupos estrangeiros, como os que fizeram os estádios das duas Copas mais recentes.
DINHEIRO ? A Copa da África pode ser um bom modelo?
QUIRÓS ? Acredito que sim. Um ano atrás, muita gente dizia que iria dar errado. Hoje, todos dizem que foi um sucesso. Estádios belíssimos, modernos e com uma boa infraestrutura ao redor. O Brasil tem obrigação de, no mínimo, fazer algo tão bom como a África do Sul foi capaz de realizar e temos capacidade técnica para procurar fazer melhor.
DINHEIRO ? Ainda assim, os custos estouraram.
QUIRÓS ? Quanto mais se demora a licitar, maior o risco. Mas não adianta fazer com pressa. É preciso fazer rápido, mas também com correção. A sociedade, o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União estão atentos aos custos dos estádios. Se fizerem com pressa, restringindo a participação a poucas empresas, o risco é o governo se tornar prisioneiro de uma guerra de liminares, movida por aqueles que se sentirem prejudicados.
DINHEIRO ? Os estádios são um ponto importante para a Copa. Mas e os aeroportos?
QUIRÓS ? É um problema ainda mais urgente. E também neste caso é importante fazer licitações mais inteligentes, distinguindo o que é construção pesada do que é uma construção mais leve. Em vez de licitar toda a reforma ou a construção de um novo terminal, é possível dividir as disputas em blocos. Empresas de construção pesada, por exemplo, podem construir as novas pistas. E grupos como o nosso entrariam nas disputas dos terminais, que hoje são praticamente shopping centers. É a saída mais eficiente para o poder público.
DINHEIRO ? Por quê?
QUIRÓS ? Porque existe uma especialização na engenharia. Uma grande empreiteira é mais eficiente na construção de uma estrada ou de uma ponte. Mas outras, especializadas em construções comerciais e industriais, podem ser mais ágeis para construir um terminal.
DINHEIRO ? São Paulo precisa de um terceiro aeroporto ou pode-se resolver o problema com a ampliação de Guarulhos?
QUIRÓS ? O problema de São Paulo não é o excesso de tráfego aéreo, mas sim a superlotação dos terminais. E bem melhor e mais barato do que construir um outro aeroporto seria fazer a terceira pista em Guarulhos e também ampliar o terminal de Viracopos, na cidade de Campinas, de onde partirá o trem-bala.
DINHEIRO ? Vocês pretendem também participar do projeto do trem-bala?
QUIRÓS ? Não das grandes obras em si, como a perfuração dos túneis e a instalação dos trilhos. Mas nós temos muito interesse em construir as estações, que também serão pequenos shopping centers, como são na França, na Coreia, no Japão e em todos os países que têm trens de alta velocidade. O importante é que as grandes empreiteiras também enxerguem que não podem fazer tudo sozinhas. É preciso dividir para que todos os grupos empresariais se beneficiem.
DINHEIRO ? O grupo Advento também participa de grandes projetos comerciais e industriais. Vocês sentem que o investimento voltou para valer?
QUIRÓS ? Está voltando. No primeiro semestre, na verdade, as empresas ficaram em compasso de espera. E só agora estão investindo pesado, em ampliação da capacidade, para recuperar o tempo perdido. De um mês para cá, ganhamos uns sete projetos importantes, considerando fábricas, hipermercados e shoppings.
DINHEIRO ? Com a economia crescendo 7%, o nível de investimentos já garante a retomada sem inflação?
QUIRÓS ? Ainda havia uma certa ociosidade na indústria. Mas, como a tendência é de que a economia brasileira continue crescendo forte, entrando de fato num ciclo de desenvolvimento de longo prazo, será preciso investir mais. Temos hoje 8,5 mil funcionários distribuídos nas nossas obras em todo o Brasil e devemos chegar ao fim do ano com dez mil. Estamos estimando uma receita de R$ 1,1 bilhão, mas a nossa carteira de contratos, o chamado backlog, está crescendo.
DINHEIRO ? A infraestrutura não será uma barreira ao desenvolvimento?
QUIRÓS ? Acho que todos os candidatos já têm consciência do tamanho do desafio. E acredito até que as concessões dos aeroportos serão licitadas neste governo, depois das eleições.