07/06/2019 - 7:02
Em 2013, percebendo os rumos da economia, Marcos Lisboa, presidente do Insper, disse que tinha medo de que o Brasil pudesse ter uma nova década perdida. “Agora, tenho medo de que possa ser mais do que uma década”, diz. “Teses estapafúrdias estragaram a microeconomia e a macroeconomia e vamos precisar de anos para arrumá-las.”
O ex-ministro da Fazenda e do Planejamento Delfim Netto concorda que a situação do País é preocupante, mas diz ser importante os economistas manterem um diálogo permanente com a sociedade, sobretudo em um momento de forte embate ideológico. “Essa discussão pretensamente ideológica que domina o debate nacional hoje é simplesmente um disfarce para falta de conhecimento”, diz.
Expoentes do pensamento nacional, eles foram alguns dos convidados do seminário promovido ontem pelo Centro de Debates de Políticas Públicas (CDPP) em homenagem ao também economista Affonso Celso Pastore, que completa 80 anos este mês.
“Para as pessoas que hoje estão envolvidas em um debate ideológico muito acirrado, é preciso ter um momento de tolerância, de reconhecimento de erros”, diz Pastore. “O País está em uma crise de crescimento econômico, na qual a renda per capita está 8% abaixo de onde estava antes de começar a recessão, há cinco anos. A resolução desse problema é o que deve nos unir.”
Amplitude. Para o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, as discussões sobre os rumos da economia do País também passam por uma reflexão sobre quais deveriam ser os objetivos do Banco Central (BC). No mundo todo, afirma ele, os bancos centrais têm assumido mais responsabilidades. “O principal objetivo do BC é buscar a estabilidade de preços”, afirma Arminio, que também é sócio e fundador da gestora Gávea Investimentos. “Um objetivo secundário é atuar para suavizar os ciclos econômicos.”
Arminio afirma que não é possível ao BC ter uma meta para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), nos mesmo moldes que tem para a inflação. “Mas desde que fique claro uma das metas ser a contribuição para suavizar períodos recessivos, vale a pena incluir (essa outra meta) na lei.”
Trajetória. Pastore, que é colunista do Estado, foi presidente do Banco Central entre 1983 e 1985, no fim do regime militar. Na instituição, ele teve de enfrentar a crise da dívida externa do Brasil. “Eu não carreguei esse piano sozinho”, afirma. “O Banco Central trabalhou em conjunto com o ministro Ernane Galvêas, da Fazenda, e Delfim, no Planejamento, que foi meu professor e me levou com um grupo de ex-alunos para Brasília alguns anos antes, quando foi escolhido para pilotar a economia do País.”
Ao Estado, ele disse que a economia sempre o atraiu e que nunca pensou em seguir uma outra carreira. Nos anos 60, diz, tinha optado por estudar como o aprimoramento da agricultura poderia contribuir para o desenvolvimento econômico brasileiro. “Hoje, dá orgulho de ver como nos tornamos uma referência no campo e como o investimento em educação e pesquisa são importantes”, afirmou Pastore.
“O esforço empírico, baseado em observação e experiência, é uma das principais características de Pastore”, diz José Júlio Senna, professor da Fundação Getúlio Vargas e diretor da Dívida Pública e Mercado Aberto do Banco Central. “Sua passagem pelo BC é um marco em 80 anos muito frutíferos e suas contribuições têm sido de grande importância, sobretudo nos anos da recessão recente e neste momento de rumos ainda por definir.”
“Ele é uma pessoa de coragem e de coerência demonstrados ao longo de décadas, o que não é fácil”, diz Arminio. “Ele consegue unir a honestidade intelectual ao rigor, sem ser dogmático. Isso foi importante no Banco Central e é muito importante agora.”
Para o também ex-presidente do Banco Central Ilan Goldfajn, a crise enfrentada por Pastore no Banco Central deixou lições sobre responsabilidade que valem até hoje. “Ainda há muito por fazer, mas a situação do País é diferente. As reservas internacionais que o Brasil conseguiu fazer, por exemplo, são um seguro que permitem ajustes e reformas necessários de forma mais acertada.”
Doutor pela USP. Formado em Economia pela Universidade de São Paulo, na qual também obteve seu doutorado, Pastore deu aulas na Fundação Getúlio Vargas (FGV) e no Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibemec). Hoje, atua como consultor da A.C. Pastore e Associados.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.