28/09/2025 - 14:39
Especialistas esperam leve recuperação do PIB nos próximos anos, mas alertam que situação geral do país ainda requer atenção e defendem corte de gastos.Cresce a frustração na economia alemã. Depois que o novo governo assumiu, a esperança do empresariado era de que o chanceler federal Friedrich Merz, da União Democrata Cristã (CDU), cumprisse logo suas promessas de campanha, tornando a Alemanha mais competitiva.
Passados quase cinco meses, porém, crescem os temores de que as tão esperadas reformas não venham assim tão rápido.
Merz sente a frustração do empresariado. “Nos últimos dias tive uma série de conversas com conselhos de administração, sindicatos, empregadores, industriários, técnicos”, disse em discurso ao Bundestag, a câmara baixa do parlamento alemão. “Todos estão profundamente preocupados com as perspectivas de futuro de suas empresas.”
Senso de urgência
“Esperamos que o governo finalmente consiga impor um rumo econômico claro e de longo prazo que alivie logo e sensivelmente os tributos, os custos de energia e a burocracia”, cobra Helena Melnikov, da Câmara Alemã de Indústria e Comércio (DIHK, na sigla em alemão).
A DIHK é uma das quatro maiores associações que representam os interesses do empresariado alemão. Merz recebeu representantes de todas elas recentemente em seu gabinete. Das conversas, diz ter concluído que já passou da hora de agir: “Precisamos correr atrás, precisamos ser mais rápidos, melhores.”
Preocupação também entre economistas
Economistas que pesquisam o tema também compartilham da avaliação de Merz. Em parecer apresentado nesta quinta-feira (25/09) em Berlim, o grupo afirma que reformas necessárias estão sendo negligenciadas, e que isso piora as perspectivas do país.
“Altos custos de energia e de salários na comparação internacional, falta de mão de obra qualificada e a queda da competitividade continuam a frear as perspectivas de crescimento econômico”, consta do relatório.
Os pesquisadores recomendam ao governo que adote uma série de medidas para o “outono das reformas” prometido por Merz. Entre as propostas estão aumentar a eficiência em todos os níveis do serviço público, reduzir cargos administrativos e melhorar a produtividade por meio, por exemplo, da digitalização e da otimização do sistema de saúde.
O grupo também recomenda que as aposentadorias não sejam ajustadas no mesmo ritmo dos salários dos trabalhadores na ativa, o fim de estímulos à aposentadoria precoce e a desburocratização do reconhecimento de qualificações profissionais de estrangeiros.
Mas, acima de tudo, os economistas defendem uma política orçamentária mais rígida, com menos dívidas. Segundo eles, faz mais sentido cortar gastos do que elevar impostos. Outra proposta é de que a infraestrutura pública seja mais bancada por aqueles que a utilizam.
Horizonte sombrio para a Alemanha
“A economia alemã continua na corda bamba”, alerta Geraldine Dany-Knedlik, do Instituto Alemão para Pesquisa Econômica (DIW Berlin), e que é uma das autoras do parecer.
Ela aponta que há apenas uma breve e leve recuperação da economia alemã: após dois anos de recessão, o PIB deve crescer 0,2% em 2025; em 2026, 1,3%; em 2027, outros 1,4%.
Esse crescimento deve ser alimentado pelas dívidas que o governo quer contrair nos próximos anos, com o investimento de 500 bilhões de euros (R$ 3,1 trilhões) em infraestrutura e proteção do clima – algo que, para os economistas que aconselham o governo, não passa de “política financeira expansionista para disfarçar o fraco crescimento”.
Não há um impulso com muitos investimentos privados à vista, alerta Stefan Kooths, do Instituto da Economia Mundial (IfW Kiel). Ele compara a estratégia de endividamento do governo a entregar drogas a um viciado: ele pode até se sentir melhor de imediato, “mas ninguém, muito menos um médico, diria que esse paciente se recuperou”.
Exportações em baixa
A economia alemã é muito dependente de exportações, que sustentam praticamente um em cada quatro empregos. A política de comércio exterior agressiva de Donald Trump e suas altas tarifas pioram o problema e ameaçam, na visão dos economistas, frear a conjuntura global.
A demanda por produtos alemães no exterior também caiu, apesar de o selo “made in Germany” ainda ter muito prestígio, como constatou um estudo do Instituto para Decisões de Mercado de Nuremberg. Mas os pesquisadores alertam: a boa imagem da Alemanha ainda é atrelada a produtos como carros movidos a combustíveis fósseis; quando o assunto são tecnologias do futuro, como inteligência artificial (IA), carros elétricos ou eletroeletrônicos, Estados Unidos e Japão ainda saem na frente.
Virada tecnológica é chave
Merz sabe disso. “Somos um país pobre em recursos naturais. Nosso bem-estar e nossa segurança dependem essencialmente de que lideremos os desenvolvimentos tecnológicos que estão acontecendo no mundo agora, e não de que corramos ofegantes atrás deles”, disse no Bundestag, para logo depois ponderar que mudanças demandam tempo e paciência.
E foi esse apelo que ele dirigiu também a empresários num evento do setor farmacêutico e químico, argumentando que as reformas necessárias não poderiam ser implantadas “do dia para a noite”. “Estamos lidando com rupturas profundas, às quais precisamos responder – política, economia e toda a sociedade lado a lado – com um processo abrangente de reformas e renovação.”
Segundo o chanceler federal, nos últimos meses uma série de decisões para reorientar a política econômica já foi tomada e encaminhada, mas muitas coisas ainda precisam passar pelo parlamento.
Reformas também no Estado de bem-estar social
Mas as palavras de Merz contam apenas metade da história. Críticos de seu governo alertam que o prometido “outono das reformas” – com mudanças na aposentadoria, no auxílio-desemprego e no seguro-saúde – pode demorar bem mais, ou nem sair do campo da retórica.
Os custos desses benefícios dispararam, e as contribuições que os financiam, pagas por empregadores e trabalhadores, não param de crescer. Mas a base aliada de Merz, formada por conservadores e social-democratas, não consegue chegar a um consenso sobre como reformar o Estado de bem-estar social.
Merz quer discutir a competitividade da Alemanha e a modernização do Estado com os membros de seu governo numa reunião agendada para a próxima terça e quarta-feira (01/10). Dali, diz esperar extrair “decisões muito concretas”. Aos parceiros social-democratas, mandou um recado: “O objetivo das reformas não é interromper o Estado de bem-estar social, e sim mantê-lo da forma que realmente precisamos dele. Quem rejeita essas reformas corrói as bases de nossa política social e de nosso Estado social.”