12/11/2018 - 13:21
Desde a eclosão da Revolução Industrial, no século 19, a cadeia produtiva se baseou em três pilares: criação, uso e o descarte. O chamado sistema linear impulsionou a economia mundial por meio da agilidade na produção e consumo. Porém, refletiu na exploração desenfreada de recursos naturais e um incalculável passivo ambiental e social.
As consequências deste modelo são visíveis em todo o Planeta, desde a formação de imensas ilhas de plástico nos oceanos ao esgotamento dos aterros sanitários nas áreas urbanas.
Foi observando o sentido natural do ecossistema que se desenvolveu a ideia da economia circular. Assim, como um organismo vivo se decompõe e gera energia e meio para a criação de outro, o conceito preconiza a reutilização dos produtos, transformando aquilo que iria para o lixo como matéria-prima para o desenvolvimento de algo novo.
É uma mudança não apenas na forma se de produzir, mas também na comercialização. Além do princípio da reciclagem, a economia circular incentiva a reutilização de algo já pronto, como frascos plásticos, restos de tecido, componentes eletrônicos, entre outros materiais.
“A economia circular olha do ponto de vista de gerar e regenerar o valor do capital natural, e não extrair esse valor. É uma economia regenerativa por princípio”, afirma Luísa Santiago, representante da Fundação Ellen MacArthur, entidade pioneira na disseminação do modelo no mundo.
Modelo abriga todos os segmentos
Desde 2010, a entidade com sede na Inglaterra incentiva a transformação nos meios de produção. De forma gradual, grandes, médias e pequenas empresas aderem ao modelo.
“Os segmentos com maior potencial são aqueles que fazem algum tipo de transação material, mas existem outros diversos modelos que também podem dialogar com a economia circular”, diz Santiago, citando nomes como Coca-Cola e Natura, até pequenas startups de tecnologia e prestadores de serviço.
A aplicação do sistema varia com o segmento e tamanho da empresa. A representante da Fundação Ellen MacArthur não dispõe de uma cartilha com regras a seguir, mas sim uma gama de opções que se adaptam dentro do contexto de cada meio.
“Na nossa experiência no Brasil e América Latina, não existe uma forma de entrar. Existem múltiplas formas que dependem do que vai fazer sentido para a empresa”, afirma. “O primeiro passo é absorver alguns dos princípios: como eu penso em eliminar resíduos, manter materiais em reuso e regenerar os sistemas naturais.”
Pioneirismo brasileiro
A Natura é um dos exemplos da prática da economia circular no mercado nacional. Na década de 1980, a empresa lançou o sistema de embalagens com refil, eliminando o descarte imediato do plástico.
Na última década a Natura também investiu na reciclagem das embalagens PET da linha Ekos. Em 2007, os recipientes continham 30% de material reciclável. Em 2011 a taxa passou para 50% e desde 2016 são totalmente produzidas com material sustentável. A empresa também desenvolve um projeto para utilização de vidro reciclável em seus produtos.
“Quando começamos tínhamos o preço adicional de 20% em relação ao material virgem, mas conforme foi aumentando o percentual e o trabalho com fornecedores, hoje temos o mesmo custo comercial”, afirma Keyvan Macedo, gerente de sustentabilidade da Natura.
Apesar de afirmar que o movimento da economia circular está se expandindo para outros segmentos e empresas, ele ressalta que ainda será necessária uma união maior dos atores sociais para a consolidação da ideia.
De acordo com Macedo, as empresas precisam priorizar a agenda, o governo deve estimular e elevar a régua no conceito de ser uma obrigatoriedade, e o consumidor também precisa eleger as marcas que já estão oferecendo um produto com a mesma qualidade e preço.
Faturamento de € 1,8 trilhões na Europa até 2030
A possibilidade de balancear os custos e aumentar a rentabilidade já foi estudada pela Fundação Ellen MacArthur. Um levantamento feito na Europa estimou a captação de até € 1,8 trilhões por empresas que aplicam o sistema circular até 2030.
O estudo foi feito com base dos números dos setores de alimentação, mobilidade e construção. De acordo com Santiago, o uso dos princípios circulares também pode triplicar a renda e o Produto Interno Bruto (PIB) do continente.
União impulsiona estratégias
Um outro estudo está sendo desenvolvido no Brasil e em outros países. Pesquisadores estão analisando oportunidades e projeções de lucro do meio circular na cadeia da industria de alimentos, incluindo resíduos e esgoto. O resultado será apresentado no Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, em janeiro do próximo ano.
A Fundação Ellen MacArthur está presente no País desde 2015 e foi o primeiro escritório montado fora da Europa. Em parceria com a Universidade de São Paulo (USP) e outros centros de ensino e pesquisa, os princípios da economia circular vão sendo difundidos.
“Veio com uma estratégia de criar uma rede de empresas, governo e academia para inovar na economia circular. Era um mercado (Brasil) que não conhecia o tema”, diz Santiago.
“O número de casos reais de economia circular dentro das empresas aumentou muito. Teve um avanço muito forte em pesquisas e artigos acadêmicos.”
Acordo une 250 empresas na exclusão do uso de plástico
No último mês, 250 empresas, entre elas a Coca-Cola, L’Oreal, H&M e Unilever, assinaram um termo para excluir o uso de plástico em suas embalagens até 2025. O acordo idealizado pela Fundação Ellen MacArthur é um dos maiores avanços no estímulo da economia circular registrados nos últimos anos.