27/03/2002 - 7:00
“Depois de 11 de setembro ninguém mais questiona a legitimidade do governo Bush”
“Roseana reverterá a crise. Basta admitir, lidar e deixar o problema para trás”
DINHEIRO ? Estamos a poucos meses das eleições presidenciais no Brasil. Como o sr. conduziria uma campanha vitoriosa por aqui?
MARK MCKINNON ? Há algumas questões fundamentais que você tem de olhar em qualquer campanha. Uma delas é determinar se os eleitores concordam com o rumo que foi dado ao país. É preciso saber se os eleitores querem mudança ou continuidade. Sempre que há mais de 50% dos eleitores querendo mudanças, é ruim para a situação. Existe ainda uma sabedoria convencional de que uma boa situação econômica garante a vitória. Mas quebramos isso com a eleição de George W. Bush. Economicamente, durante o governo Bill Clinton, os Estados Unidos nunca estiveram tão bem. Mas nós vencemos as eleições. Então, vamos à primeira regra para vencer uma eleição: não existem regras absolutas. Outra coisa, nunca deve-se recorrer à última eleição como exemplo. Normalmente, os marqueteiros olham o passado como modelo para o futuro. Não adianta. Numa campanha presidencial, os eleitores escolhem muito mais do que plataformas políticas ou econômicas.
DINHEIRO ? O que os eleitores procuram?
MCKINNON ? Eles querem votar em um candidato que tenha caráter e qualidades humanas. E, mesmo que não concordem com determinados aspectos da plataforma de governo, querem grandes líderes. Procuram alguém que os entenda, que tenha bom senso e bons valores. É isso que atraiu o eleitorado do presidente Bush. Ele era quem ele era. Bush dizia: ?Esse sou eu. Se você gostar, ótimo. Se não, vote no outro candidato?. É um homem muito confiante. Diferentemente de seu oponente, Bush não estava todo o tempo se reinventando. Estava na cara que Al Gore não tinha vida própria e seu único objetivo era ser presidente da República. Os eleitores não são bobos. Eles perceberam isso.
DINHEIRO ? O sr. acredita que
os eleitores passaram a fazer ?escolhas pessoais? na hora do
voto porque as plataformas de governo são sempre parecidas?
MCKINNON ? Sim. Com o desenvolvimento dos institutos de pesquisa, como Gallup e Nielsen, os candidatos saem para campanhas sabendo exatamente o que os eleitores esperam deles. E todos acabam se pautando no mesmo plano: segurança, garantias básicas, fim da inflação, etc. Mas os eleitores não têm tempo para conhecer todas as plataformas. O que fazem? Transferem para alguém o poder para tomar conta de todas essas questões por elas. Eleger um presidente é como eleger um pai para a nação. Alguém que cuide da população. Que seja um de nós, mas esteja acima de nós. Pode parecer estranho, mas isso adquire características paternais ou maternais. Nos Estados Unidos, por exemplo, existe uma busca pela compaixão (que é feminina) e competição (que é masculina). Não queremos simplesmente um presidente. Queremos alguém que cuide de nós.
DINHEIRO ? No Brasil, a pré-candidata à Presidência, Roseana Sarney, estava em segundo lugar nas pesquisas mas foi envolvida em um escândalo de corrupção. É possível reverter o quadro?
MCKINNON ? É claro que é possível reverter. Basta um exemplo: o ex-presidente Bill Clinton era muito popular na primeira campanha, passou por inúmeros escândalos e se reelegeu. O fato dele virar o jogo bastou para que mostrasse que não existe escândalo que acabe com uma campanha. Tudo pode ser resolvido. Depende apenas da forma como os candidatos lidam com problemas. A dica é ser honesto e não permitir que o escândalo se estenda por muitas semanas. Para a Roseana Sarney, por exemplo, a equação é simples: admitir, lidar e deixar o problema para trás. Os eleitores sempre tendem a perdoar os candidatos.
DINHEIRO ? Como é seu trabalho com George W. Bush?
MCKINNON ? Fui seu diretor de mídia quando ele era governador do Texas e em sua campanha presidencial. Hoje, sou uma espécie de conselheiro. Tenho um escritório a três quadras da Casa Branca, que é a minha empresa: a Public Strategies. Mas continuo colaborando em programas legislativos, campanhas de educação e assuntos ligados à mídia. Tenho um papel informal no governo.
DINHEIRO ? Mas como funciona na prática o seu dia-a-dia?
MCKINNON ? É bastante pró-ativo. O presidente é rodeado de uma equipe muito competente e leal. Nosso trabalho é antecipar as questões e desafios que virão durante o governo. Nunca ficamos na defensiva. Antes de 11 de setembro, já tínhamos planejamento de um ano inteiro. Tivemos que mudar.
DINHEIRO ? Aliás, antes dos atentados, o presidente Bush não passava uma imagem de credibilidade. O que mudou?
MCKINNON ? Eu já havia previsto que, durante uma crise, a nação conheceria a sua verdadeira capacidade de liderança. Mas eu não imaginaria que seria um evento tão catastrófico, é claro. Conheço Bush há muitos anos e sei que, quando os tempos estão ruins, ele demonstra o seu melhor. Foi o que o mundo viu após 11 de setembro. Desde então, ele detém os melhores índices de popularidade da história americana. Sempre que me perguntam sobre essa mudança na popularidade de Bush, tenho dois argumentos opostos. Quem conhecia ele antes, não ficou surpreso com seu posicionamento. E quem não conhecia, achou que ele mudou para melhor. Dos dois lados, conseguimos reverter a tal falta de credibilidade.
DINHEIRO ? Passada a crise, Bush conseguiu conquistar o apoio público para questões políticas mais delicadas?
MCKINNON ? Sim. Ele conseguiu um enorme apoio popular
para a guerra, por exemplo. Juntou todos os membros de seu
partido e, de certa forma, unificou os discursos de democratas e republicanos. Isso se traduziu na possibilidade de aprovar uma agenda mais agressiva.
DINHEIRO ? O sr. era do Partido Democrata e agora trabalha como ?guru? do Partido Republicano. Teve problemas éticos nessa transição?
MCKINNON ? A resposta é difícil. Foi uma decisão complicada que tive que tomar em 1997. Eu era, como a maioria dos americanos, um homem frustrado com a política. Pensava que a situação era horrível, mas ainda acreditava que havia bons e maus democratas e bons e maus republicanos. Um dos republicanos que eu gostava era George Bush. Eu morava no Texas e ele era um governador competente. A meu ver, fazia um governo brilhante, que os democratas jamais teriam feito. A certeza veio quando o conheci pessoalmente. Gostei dele. Ele me perguntou se eu trabalharia para sua reeleição. Tive dúvidas devido ao meu passado, mas já havia decidido que o mais importante não era partido, mas personalidade. Topei o desafio.
DINHEIRO ? Há a informação de que o governo americano procurou Hollywood para produzir filmes que melhorassem a imagem do país depois dos atentados de 11 de setembro. Algum resultado prático nesta parceria?
MCKINNON ? Não. O que aconteceu foi que Hollywood nunca foi amiga dos republicanos. Ironicamente, Bush conseguiu ir muito mais além que Bill Clinton nas questões de liberdade individual. Eu fui a Hollywood para muitos encontros. Mas não queríamos criar uma máquina de propaganda. O que fizemos foi simplesmente criar um canal de comunicação, que não havia antes.
DINHEIRO ? O que o sr. achou da idéia do Pentágono de criar uma agência de informação que iria manipular a mídia com notícias falsas que atendessem os interesses do governo?
MCKINNON ? Não sei as particularidades do projeto do Pentágono. Assim que o presidente Bush soube da proposta, que era algo que havia partido de lá de dentro, ele pediu para abortar o projeto. Fez bem. Não creio que alguém concordaria em ?manipular? as informações da imprensa em qualquer país e em qualquer época.
DINHEIRO ? O presidente Bush parece não gostar muito
de mídia como seu antecessor. Há dados que demonstram que, antes dos incidentes terroristas, ele tinha aparecido muito menos que Bill Clinton nas tevês. Como vocês lidam
com a mídia?
MCKINNON ? Acredito que algumas pessoas precisam aparecer na imprensa para ver seu reflexo. E George Bush não precisa. Ele sabe quem é e não tem apetite por notícias.
DINHEIRO ? Ele é tímido?
MCKINNON ? Não. O presidente simplesmente não é metido, não gosta de aparecer e não está procurando a atenção para si. Ele tem um trabalho a fazer e sua única preocupação é que a imprensa fale de seu trabalho e não dele. Mas certamente há também uma balança entre a exposição boa e ruim na imprensa. Há tempos, durante a guerra, por exemplo, que toda a nação precisava e queria ver o presidente. E ele estava lá. Mas hoje não há mais essa necessidade. É questão de saber balancear sua exposição.
DINHEIRO ? Bush ganhou uma eleição disputada voto a voto. Teve tanta confusão que foi preciso contar e recontar até a decisão final. Isso atrapalha qualquer político.
MCKINNON ? Certamente. Mas das muitas coisas que aconteceram em 11 de setembro, nossa única certeza é de que os eventos ajudaram a estabelecer a legitimidade deste governo. Ninguém mais questiona isso.
DINHEIRO ? Existe a crença de que basta uma boa campanha de marketing para vencer uma eleição. O que o sr. acha disso?
MCKINNON ? Em uma eleição presidencial, é o candidato que toma as rédeas. Não é o consultor. Normalmente, os consultores acabam ganhando créditos quando os candidatos vencem e não a culpa quando perdem. Mas nossa posição tem que ser discreta. Os eleitores não são bobos. Eles percebem quem é o verdadeiro candidato e quem é o ?boneco? atrás do marketing. Meu objetivo nunca foi o de criar alguém, apenas acentuo suas forças e diminuo seus problemas. É errado tentar passar coisas que o candidato não é. O melhor marketing do mundo não consegue alçar um mau candidato ao poder. Sabe por quê? De uma hora para outra, os problemas de determinado candidato podem vir à tona. Se os eleitores percebem que você está tentando enganá-los, aí você está seriamente encrencado.
DINHEIRO ? Maquiavel dizia que todos os fins justificam os meios. É assim no marketing político?
MCKINNON ? É uma pergunta difícil. Política é muito dura em qualquer lugar do mundo, nos Estados Unidos ou no Brasil. É uma guerra por liberdade, democracia e poder. É dinheiro. E as pessoas se matam por cada voto. Mas acho que há uma linha que envolve honestidade e ética. Se você cruzar, terá que pagar por isso.
DINHEIRO ? Qual é o preço?
MCKINNON ? Ou você perde nessa eleição ou na próxima.