30/03/2001 - 7:00
O relacionamento entre o Banco Central e o ex-banqueiro Arthur Falk, do quebrado Banco Interunion e da loteria Papa Tudo, nunca foi modelo de paz e harmonia. Mas agora vai ficar impraticável. Sem banco desde que o Interunion foi liquidado pelo BC, em 1996, Falk, munido de uma liminar obtida em uma das centanas de varas de Justiça do País, chegou a conseguir pôr as mãos de novo em sua instituição, mas por apenas dois dias, no fim de fevereiro. Foi pior para sua imagem em Brasília do que se nunca tivesse tentado. O BC conseguiu suspender o efeito da liminar e, ao reassumir a liquidação do grupo, deu de cara com uma ordem interna de Falk para transferir o caixa do Interunion, recheado com R$ 30 milhões, para contas em outros bancos. O caldo engrossou. O diretor de finanças públicas e regimes especiais do BC, Carlos Eduardo de Freitas, perdeu a paciência. ?Essa tentativa de retirar o dinheiro é coisa de mau elemento?, disse. Falk, que andara usando expressões ainda menos polidas em Brasília para se referir a Freitas, negou qualquer tentativa de sacar dinheiro do banco e entrou com processo na Justiça contra o diretor. E ainda recorreu para tentar fazer valer de novo a liminar de fevereiro, para retomar o comando do banco. ?Queremos acabar com essa brincadeira?, contra-ataca o advogado do ex-banqueiro, Fernando Orotavo.
Antes da ofensiva judicial para tentar reaver o Interunion, Falk havia procurado o seu mais novo desafeto, em Brasília, para tentar resolver com uma conversa o destino de seu finado banco. Como nada conseguiu, segundo Freitas, disparou declarações ofensivas por toda a capital. ?Xingou até a minha mãe?, protesta o diretor. Foi então que Falk se saiu com a ação pedindo a suspensão da liquidação extrajudicial do banco. Fernando Orotavo argumentou, em nome do ex-dono do Papa Tudo, que o BC não pagou um credor sequer em quatro anos à frente do que restou do Interunion. Afirmou também que o banco tem patrimônio no azul, suficiente para pagar todos os credores.
Falk pediu então para ele próprio liquidar o banco e quitar as dívidas, com o compromisso de prestar contas dos pagamentos a cada mês. Conseguiu a liminar e partiu para a ação. Segundo Freitas, a primeira atitude do ex-banqueiro de volta ao Interunion foi a de tentar transferir todo o caixa para o Bradesco, que, desconfiado, exigiu de Falk uma vasta papelada para confirmar a transação. O dinheiro tomou então outro rumo e foi todo para o Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. O BC, ao reassumir a liquidação, deu com esse fato, mas não o tomou como consumado. As transferências foram desfeitas em menos de 24 horas. ?O dinheiro já está no Banco Central.?, comemora Freitas.
A conta de Falk para afirmar que seu banco tem patrimônio positivo gera controvérsia. O motivo para a quebra do Interunion, em 1996, havia sido a recusa do banco estadual da Paraíba, o Produban, em cumprir um compromisso de recomprar títulos do Estado de Alagoas que ele próprio havia vendido ao Interunion. Isso deixou a instituição de Falk com os títulos na mão e sem dinheiro para cobrir um furo na conta de reservas bancárias, no BC, e motivou a liquidação. Alagoas acabou mais tarde dando o calote nos títulos e deixou-os sem valor. Mas veio a renegociação do estado com a União e os títulos foram trocados por outros, federais. Falk quer esse benefício contabilizado a favor de seu banco e afirma que, com isso, seus ativos crescem e passam a ser suficientes para pagar o que deve. Não é pouco. No mercado, suas dívidas chegam perto dos R$ 30 milhões que o Interunion tem hoje em caixa. Junto ao BC deve cerca de R$ 50 milhões, que quer pagar justamente com os títulos que o levaram à bancarrota.
Dar ou não a Falk mais uma chance de sair da liquidação pelas próprias pernas está agora nas mãos dos 26 desembargadores do Tribunal Regional Federal do Rio de Janeiro. A liminar que devolveu o banco a ele em fevereiro pode voltar a valer no dia 5, quando os desembargadores julgam se mantêm ou não a suspensão concedida ao BC. A ação de Falk contra Freitas, porém, está apenas começando. Apesar do tom inflamado da briga com o ex-banqueiro, o diretor do BC foi surpreendido na semana passada pela intimação que recebeu. ?Estou ganhando mais um inimigo?, disse.