No mundo dos negócios existe uma regra clássica: há sempre alguém pronto para ocupar o espaço deixado por outro alguém. Pode parecer cruel, mas é assim que funciona o capitalismo. A empresa de laticínios gaúcha Elegê pode confirmar a regra. Quase três anos depois de a italiana Parmalat entrar em colapso, ela tomou conta do pedaço. Hoje tem a liderança do mercado nacional de leite longa vida, com 9,5%. Trata-se de uma parcela considerável, levando-se em conta que o segundo e terceiro colocados somam juntos 7%, conforme dados da Latin Trade. O avanço num mercado que tem mais de 140 concorrentes não veio por acaso. É fruto de um planejamento estratégico elaborado pela empresa de consultoria Galeazzi & Associados, que tem no currículo a recuperação e profissionalização de companhias como Eletrolux, Cecrisa e a própria Parmalat. Desde 2004, o resultado da Elegê dobrou, superando R$ 1 bilhão de receita anual. Hoje, 680 funcionários da maior fábrica da empresa, situada em Teutônia, a
100 km de Porto Alegre, um reduto da colonização alemã, encaixotam 2 milhões
de litros de leite por dia.

É claro que a bandeira do Grupo Avipal, grande produtor de frangos e suínos, que adquiriu a marca Elegê em 1996, ajudou. ?Abrimos os braços para os fornecedores da Parmalat, que de uma hora para outra ficaram na mão, e eles sentiram-se confortáveis em trabalhar com uma marca sólida?, diz o superintendente da Avipal, Rami Goldfajn, sócio da Galeazzi & Associados. Assim que entrou na empresa, a nova diretoria implantou várias medidas visando a redução de custos ? sem demissões ? e o aumento de vendas. Entre elas, passou a embarcar 10% da sua produção por estrada de ferro, opção 15% mais em conta do que o transporte rodoviário.

Além disso, investiu R$ 40 milhões para chegar mais perto do mercado paulista, seu grande sonho de consumo. A captação de leite, antes restrita a fornecedores da região Sul do País e de Minas, agora também conta com a produção de pecuaristas de São Paulo. O resultado já apareceu. Em setembro, a Elegê comemorou a liderança em solo paulista, com 7,7% da preferência na região mais rica do País. Agora, a empresa planeja entrar no Nordeste, onde já manda 60% do leite em pó ? um hábito de consumo da região. Sob a nova gestão também lançou várias categorias de produtos, como iogurtes, achocolatados de caixinha que levam na embalagem os personagens Disney e leites especiais, com reforço de cálcio, fibras e baixo teor de lactose.

As exportações, que já são o destino de 80% da produção de frango e suínos da Avipal, é o grande projeto do grupo para o setor lácteo. ?O Brasil tem um dos maiores potenciais mundiais de produção de leite?, afirma Goldfajn. Segundo ele, o País tem área sobrando para a criação de gado leiteiro, o que começa a faltar em países como a Nova Zelândia, maior exportadora do produto, com o dobro da produtividade brasileira. Hoje, 53% do negócio do Grupo Avipal já vêm da área de leites. Para ganhar mercados internacionais, a Elegê ganhou um departamento de comércio exterior, contratando 40 pessoas especializadas. Até aqui, as vendas externas eram terceirizadas. Os volumes embarcados ainda representam pouco, mas a meta é atingir 10% da produção de leite (em pó) no ano que vem. ?Aproveitamos a estrutura da Avipal para colocarmos nosso leite lá fora?, explica Hélio Vilas Boas, diretor industrial, responsável da área de leite. Vilas Boas, aliás, veio da Parmalat, onde trabalhou por mais de 10 anos. A Elegê pensou em todos os detalhes.