Com a proximidade das eleições, deputados ampliaram o gasto de dinheiro público para fazer autopromoção. Desde o início do mandato, os parlamentares usaram R$ 179 milhões com a divulgação de seus mandatos nas bases eleitorais e, principalmente, na internet. Somente no primeiro bimestre deste ano eleitoral, foram R$ 10,7 milhões destinados à divulgação de suas imagens. O valor supera o que foi gasto no mesmo período de 2021, quando não havia eleição, e dá aos deputados vantagem competitiva em relação aos candidatos que não têm mandato.

A verba sai de uma cota que os congressistas usam para custeio de seus mandatos. Podem pagar despesas de alimentação, transporte, segurança e contratação de consultorias. No ano eleitoral, porém, grande parte dos deputados decidiu ampliar os gastos com promoção de suas atividades, turbinando a divulgação de postagens nas redes sociais.

Ao destinar dinheiro para impulsionar suas publicações, deputados conseguem atingir um maior número de eleitores. As plataformas permitem a delimitação de um público alvo, e publicações específicas chegam a um número de internautas que não seria possível com um post não patrocinado. Com R$ 100, por exemplo, é possível alcançar mais de 10 mil pessoas. Tudo é pago com dinheiro público.

Para o cientista político e professor da Mackenzie Rodrigo Prando, a cota para propaganda é uma vantagem para o parlamentar. “Obviamente, é uma vantagem competitiva em relação, por exemplo, aos que concorrem pela primeira vez”, afirmou. Prando considera que essa divulgação deveria servir como prestação de contas do deputado ao eleitor.

Os dados refletem essa vantagem dos que têm mandato. A taxa de reeleição no País está na casa dos 60% (índice de 2018). Em 2014, chegou a 70%. Não à toa, o valor gasto com promoção do mandato pelos atuais deputados é maior do que o registrado no período anterior. Foram R$ 179 milhões de 2019 até fevereiro deste ano ante R$ 168 milhões na legislatura passada.

O líder do PL, Wellington Roberto (PB), consumiu R$ 1,2 milhão de recursos públicos para autopromoção nesta legislatura. O deputado vai tentar o sexto mandato. O dinheiro foi destinado à edição de materiais gráficos, consultorias e a um blog da Paraíba pago para fazer “divulgação de notícias referentes ao mandato”. Ele foi o parlamentar com maior gasto desse tipo na Câmara.

Candidata ao governo de seu Estado, a deputada Mara Rocha (PSDB-AC) gastou R$ 1,1 milhão para promover seu mandato. A parlamentar acriana privilegia rádios e sites regionais, além de consultorias de comunicação. Jéssica Sales (MDB-AC) e Paulo Teixeira (PT-SP) são os outros que alcançaram patamar milionário. A emedebista aposta na propaganda em rádios locais e usou a verba para contratar serviços de seis empresas. Do milhão gasto pelo petista, 70% foram destinados a uma empresa que faz as gestões das redes sociais do parlamentar.

Lucro

Levantamento do Estadão/Broadcast mostra ainda que, apesar do foco em veículos de comunicação locais, o perfil da propaganda vem mudando. Nos últimos dois anos, o Facebook se consolidou como a empresa que, individualmente, mais lucra com a autopromoção de congressistas entre as mais de 5 mil contratadas para a finalidade. Na atual legislatura, já são R$ 2,2 milhões gastos para disseminar posts dos políticos no Facebook e no Instagram.

Em 2021, os deputados pagaram R$ 1,07 milhão à empresa de Mark Zuckerberg. O valor é quase três vezes maior que os R$ 471 mil pagos à segunda que mais faturou com a cota parlamentar no ano passado – uma empresa de consultoria e gestão de redes sociais.

Com atuação discreta no plenário, Weliton Prado (PROS-MG) é o deputado que mais gastou com posts patrocinados, R$ 231 mil. Ele costuma impulsionar fotos em reuniões com sindicalistas e representantes de hospitais, além de compras de equipamentos viabilizadas por meio de suas indicações. “Entregue! Ambulância UTI Móvel para Santa Juliana. Emenda de minha autoria no valor de R$ 300 mil, atendendo reivindicação da vereadora Erica Naves e do deputado Elismar Prado”, escreveu em uma publicação. A propaganda alcançou 8 mil pessoas, mais da metade da população total do município. Procurado para comentar a estratégia, ele não se manifestou.

Célio Studart (PSD-CE), por sua vez, gastou com Facebook nesta legislatura R$ 108 mil. Defensor da causa animal, não impulsiona somente publicações relacionadas à atuação parlamentar em defesa da dignidade dos bichos. Costuma pagar para que seus posts de resgate e recuperação de cachorros abandonados cheguem a mais gente.

Segundo o deputado, é uma forma de falar com um eleitor qualificado, que não deu a ele um mandato para um trabalho de distribuição de emendas para prefeituras. “É mais eficiente. Conseguimos atingir um público-alvo. Um outdoor numa avenida, por exemplo, não conseguimos saber com precisão qual é o público alcançado.”

Embora restrita para divulgação do mandato, deputados usam a verba para a narrativa política geral. Sidney Leite (PSD-AM) usou R$ 95 mil da cota para alavancar publicações. Entre elas, algumas sobre datas comemorativas, aniversários de cidades amazonenses e de críticas ao governo estadual. “Vivemos um caos na saúde do Estado do Amazonas, além de todas as dificuldades impostas pela pandemia, existem mais de 100 mil pessoas na fila de regulação”, publicou em junho passado.

O pré-candidato à Presidência André Janones (Avante-MG) também aparece na lista de maiores cifras usadas para aparecer mais no Facebook durante o mandato, R$ 92 mil. A estratégia digital do deputado já lhe rendeu, em 2020, um recorde de live mais comentada entre usuários do Ocidente ao falar de auxílio emergencial.

TSE

O crescimento de pagamentos ao Facebook é influenciado por uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral, de agosto. Os ministros entenderam que não há propaganda eleitoral antecipada no impulsionamento de publicações nas redes sociais, desde que não haja pedidos de votos.

Cada deputado tem, em média, R$ 40 mil mensais da chamada cota parlamentar. O valor varia de Estado para Estado. A divulgação do mandato costuma ser a principal finalidade da verba, vantagem que pode ser estratégica na busca da reeleição. Com o mecanismo, deputados do baixo clero conseguem trabalhar suas imagens nas bases e encurtam caminhos para um novo mandato. A tendência é a de que os gastos sejam contidos em abril. Uma regra da Câmara veda essa despesa seis meses antes da eleição da qual o deputado vai participar.

Doutoranda em Ciência Política pela USP e pesquisadora do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB), Joyce Luz criticou o crescimento da despesa com promoção em ano eleitoral. “Esse gasto deveria ser permanente ao longo dos anos, e não aumentar perto das campanhas”, disse ela.

Contato

Os deputados afirmaram que todas essas despesas são legais, lastreadas no interesse público e na necessidade de prestar contas e informar a população sobre a atividade em Brasília. Wellington Roberto disse que seu perfil de atuação é municipalista, o que demanda um contato permanente com as cidades da Paraíba. “Faço informativos impressos e uma série de ações para fazer a nossa atuação chegar. O cidadão e a cidadã ainda gostam muito de ver, de ler, de pegar um folheto. Por isso, deixo documentado”, afirmou.

A equipe de Mara Rocha informou que os custos da deputada são similares aos dos demais parlamentares e que a realidade social de grande parte dos eleitores do Acre exige um contato mais direto, por meio de rádios, sites, outdoors e informativos impressos. “Durante a pandemia, a divulgação ajudou muito com relação aos abonos e pagamentos do governo. Era uma forma de informar a essas pessoas. São 22 municípios distribuídos de forma irregular. Para isso é necessário um tipo de abordagem.”

Alexandre Padilha (PT-SP), que gastou R$ 953 mil, disse que a comunicação direta sempre foi uma marca de sua atuação política e que a demanda por informações das bases aumentou muito durante a pandemia por causa da atuação do governo Jair Bolsonaro. Os demais citados na lista de maiores gastos não responderam até a conclusão desta matéria. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.