28/01/2004 - 8:00
CLAUDIO VAZ O homem da situação sai em vantagem
Começou por esses dias, no número 1313 da Avenida Paulista, no centro financeiro de São Paulo, algo que não se via por lá há mais de 20 anos ? uma eleição empresarial de resultado imprevisível. A briga pela presidência da Fiesp, que será decidida nas urnas em 25 de agosto, tem tudo para reeditar o calor da famosa disputa de 1980, quando o jovem Luís Eulálio de Bueno Vidigal bateu o veterano Theobaldo de Nigris por um único e histórico voto. Aquela vitória foi um divisor de águas. Ela promoveu a troca de gerações no comando da Federação das Indústrias e colocou a velha instituição paulista, criada na década de 20, no centro do debate econômico e político nacional. Desde então a Fiesp tornou-se a porta-voz da moderna indústria brasileira e seu presidente um interlocutor obrigatório de sucessivos ocupantes do poder. A partir de 80, porém, ocorreu no prédio da pirâmide uma série de eleições previsíveis e desiguais, nas quais o candidato da situação mais ou menos esmagou seus opositores. Foi assim quando Carlos Eduardo Moreira Ferreira derrotou Emerson Kapaz em 1992 e foi assim também quando Horácio Lafer Piva bateu Joseph Cury, em 1998. Este ano o roteiro promete ser bem mais emocionante. O sucessor de Piva, que encerra seu segundo mandato em setembro, será escolhido entre três empresários atuantes e conhecidos ? e pelo menos dois deles, Claudio Vaz e Paulo Skaf, parecem ter fôlego, currículo e sobretudo apoio para levar o embate ao 12º round. O terceiro candidato é Synésio Batista da Costa, o ativo presidente da associação dos fabricantes de brinquedos, que, por enquanto, corre por fora, como azarão.
PAULO SKAF Oposição tem forte apoio interno
Tribuna e máquina. Quem quer que seja o vencedor da maratona, herdará uma tribuna e uma máquina capazes de determinar a qualidade da relação entre o governo e a indústria. A Fiesp representa 18 mil empresas, dispõe de um orçamento anual de R$ 700 milhões e tem sob sua tutela nada menos que 42% do PIB industrial do País. Por mais que a economia brasileira tenha se descentralizado, São Paulo ainda concentra um poder desproporcional de mobilização econômica e política. E neste momento, como em boa parte do governo FHC, a massa empresarial congregada em torno da Fiesp fermenta de insatisfação. As empresas sofrem com a política de juros altos, que põe o setor produtivo de joelhos e enriquece os bancos. ?Meu sucessor precisa defender ativamente um novo modelo?, prega Piva. Ele fez cinco anos de oposição econômica a Fernando Henrique e teme que o próximo presidente da Fiesp tenha de seguir na mesma trilha ? com o benefício de uma máquina mais rica e mais influente do que aquela que ele recebeu há quase seis anos. ?O próximo presidente terá mais condições de exercer influência sobre o governo e de criar uma nova aliança econômica com a sociedade brasileira?, acredita. Não é por outro motivo que Brasília acompanha atentamente os movimentos da disputa em São Paulo e que o núcleo do governo prefira o candidato da oposição. Skaf é considerado um aliado que elogia o governo em público e guarda as críticas para conversas privadas. O presidente Lula já o recebeu quatro vezes fora da agenda oficial e as portas do ministro Palocci têm estado sempre abertas para ele. O poder executivo não se engaja na campanha de Skaf para não colar no candidato a pecha de chapa branca, mas torce.
SYNÉSIO BATISTA O homem da Abrinq corre por fora
A eleição deste ano será mais um choque de personalidades do que de programas. Vaz e Skaf, os dois candidatos com chances reais no momento, são pessoas radicalmente diferentes entre si, embora de biografias assemelhadas. Ambos são empreendedores que começaram com pouco, construíram empresas médias bem-sucedidas e as venderam nos anos 90. Os dois têm projeção empresarial graças à representação em entidades patronais ? Skaf dirige a Associação Brasileira da Indústria Têxtil, a Abit, e Vaz dirigiu o Sindipeças, agremiação das indústrias produtoras de autopeças. Tanto um quanto outro são integrantes da atual diretoria da Fiesp e dispõem de ativos essenciais para exercer a liderança empresarial: tempo e dinheiro. Nenhum deles precisa ganhar a vida tocando seus negócios a partir do chão de fábrica e podem, portanto, dedicar seu tempo às atividades públicas. As semelhanças, entretanto, param por aí. Enquanto Vaz, de 57 anos, é um operador discreto e rigoroso, com vocação para o trabalho em equipe e grande talento para a discussão de detalhes, Skaf é um individualista carismático com gosto e inclinação para a política. Ele movimenta-se em Brasília com a mesma naturalidade com que Vaz discorre sobre as mudanças estruturais do setor automobilístico. Tanto um quanto outro são homens de evidente capacidade, mas enquanto um parece ter alma de engenheiro o outro age como senador.
PIVA, ATUAL PRESIDENTE: ungiu Vaz como sucessor e terá uma eleição difícil
Vaz passou os últimos anos mergulhado na reengenharia da Fiesp: cortou 4 mil postos de trabalho, desenhou um modelo mais eficiente de gestão e resgatou a entidade de uma situação semi-falimentar. Pela firmeza com que foi conduzida, essa reforma rendeu-lhe um bocado de admiração interna e uma quantidade equivalente de ressentimentos. Enquanto isso, Skaf afastou-se do cotidiano da Paulista e concentrou-se em fazer da Abit um aparelho eficaz e bem-sucedido de lobby empresarial. Sob a sua liderança, e o apoio do Itamaraty, a entidade conseguiu derrubar em 2002 as cotas de importação de têxteis que ameaçavam bloquear as vendas da indústria brasileira para a União Européia. Em seu período ativo na Fiesp, no início da gestão de Piva, Skaf coordenou o grupo de trabalho que permitiu o refinan-
ciamento da dívida das empresas junto ao governo federal, o Refis. Vaz, por seu turno, formulou a abrangente proposta de reforma tributária da entidade e coordenou sua defesa técnica junto ao governo e ao Congresso. Embora contasse com forte apoio do setor produtivo, essa proposta, como outras do setor empresarial, acabou abandonada pelo executivo petista em meio às negociações políticas com os governadores.
PIRÂMIDE DA PAULISTA: Orçamento de R$ 700 milhões e 42% do PIB industrial do Brasil em ritmo de eleição
Diferenças de estilo. Nas próximas semanas e meses, à medida em que a campanha esquentar, as diferenças de estilo ficarão mais patentes. Ungido por Piva como candidato oficial pela sua capacidade de debater e organizar, Vaz irá enfatizar a continuidade da gestão e seu desdobramento. Sua tese fundamental é que as condições estão dadas para a retomada do desenvolvimento e que cabe à Fiesp, revitalizada e reposicionada, empurrar o governo e articular a sociedade na direção certa. ?A Fiesp tem um papel fundamental em ajudar a formular uma nova estratégia de crescimento, baseada na indústria e na economia real?, diz Vaz. Preterido por Piva, Skaf tem pela frente a tarefa de atrair para a oposição um corpo de eleitores pequeno e historicamente conservador, que só votou contra a situação na eleição de 1980. A seu favor, o líder da indústria têxtil tem a imagem pública reluzente e a reconhecida capacidade de liderança. Mais importante ainda, ele não é um estranho à Fiesp. Ao contrário dos candidatos derrotados nos últimos anos, Skaf tem forte apoio interno entre os 126 delegados de sindicatos patronais que votam na eleição para a Fiesp ? embora sua penetração seja pequena entre os cerca de seis mil eleitores do segundo corpo eleitoral do pleito, no qual os empresários votam diretamente. Para todos eles, a mensagem de Skaf é uma só: liderança e resultados. ?Não podemos mais correr atrás de fatos consumados?, diz ele. ?A indústria tem de se antecipar aos problemas e apresentar soluções.? Até agosto também terá de decidir quem é o homem mais adequado para representá-la.
Com reportagem de Thaís Lobo
O QUE ELES PENSAM
As idéias dos três candidatos à presidência da Fiesp
CLÁUDIO VAZ TRABALHO DE EQUIPE
?Equipes são a chave do sucesso. Comecei do
nada e cresci formando grupos que acreditavam?
RETOMAR O CRESCIMENTO
?O governo ainda hesita em ousar, mas os juros
têm de cair. As condições estão dadas para crescer?
POLÍTICA INDUSTRIAL
?Os setores têm de ser ecolhidos para gerar empregos, saldo comercial e vetores de desenvolvimento?
LOBBY INDUSTRIAL
?Agora podemos pagar uma estrutura de lobby
em Brasília para articular nossas propostas?
PAULO SKAF PERFIL POLÍTICO
?O presidente da Fiesp tem de ser político. Tem de
ser um negociador com liderança e trânsito?
ATUAÇÃO PRÓ-ATIVA
?A Fiesp não pode apenas comentar a decisão de
ontem. Tem de se antecipar, agir e obter resultado?
PARTICIPAÇÃO TOTAL
?As micro, as pequenas e as grandes empresas vão
atuar unidas na Fiesp. Muitos setores estão fora?
GESTÃO INTERNA
?Esta não é uma eleição para gerente.
O presidente é para atuar extramuros.
Gestão é para profissionais?
SYNÉSIO BATISTA HOMEM DE RESULTADOS
?A Fiesp precisa de um executor de resultados,
um articulador político. O resto é bobagem?
GESTÃO PLURALISTA
?O modelo presidencialista de gestão entre amigos envelheceu. Não é tarefa para um homem só?
LIMITE DA OUSADIA
?Faço o que for necessário em defesa da indústria, até
greve na porta do ministério. O que der resultado?
TRABALHO NO DOMINGO
?Nunca fui à praia. Sou obcecado por
resultado. Trabalho sábado e domingo.
Sou fanático por trabalho?