04/08/2001 - 7:00
Você envia um e-mail para um amigo, vai ao supermercado e depois janta com a família na pizzaria de sempre. Agora imagine que alguém acompanhou cada passo seu, anotando todos os detalhes, dos produtos que você colocou no carrinho de compras ao valor da gorjeta. Para completar, todos os seus dados estão sendo negociados com outras empresas num negócio lucrativo e cada vez mais comum: a comercialização de mailings. Aquelas listas com dados pessoais de consumidores valem ouro nas mãos de um profissional de marketing. Fácil entender a razão. Quanto mais dirigida for uma publicidade, mais chances de acertar no alvo. A questão é que no meio disso tudo estão dados pessoais de milhares de pessoas que, muitas vezes, sequer notaram que são vítimas de uma superexposição. Você já percebeu?
Tente lembrar quantas vezes você recebeu malas diretas em casa sem nunca ter fornecido o endereço. Ou quantos e-mails chegam por dia de destinatários que sequer conhece. A pergunta que fica nessas horas é como eles conseguem seus dados. Aqui está o grande alerta desta reportagem: há formas de se proteger da exposição sem limites de sua individualidade. Como? Comece evitando fornecer números pessoais cada vez que for solicitado. E saiba que ninguém pode negociar seus dados sem sua autorização. E se isso acontecer, reclame e até recorra aos órgãos de defesa do consumidor. ?A maioria dos consumidores só percebe o nível elevado de exposição quando ocorre um problema como clonagem de documentos, por exemplo?, diz Maria Inês Dolci, advogada do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). Só no ano passado, cerca de 700 mil pessoas tiveram esse problema nos Estados Unidos. O que pouca gente sabe é o tamanho do negócio que gira em torno do seu nome. E quanto ele vale dinheiro. O valor de um mailing depende muito do quanto ele pode dizer a seu respeito. No Brasil, uma empresa que vende uma lista segmentada pode cobrar até R$ 0,20 por nome. Nos Estados Unidos, já existem empresas cujo serviço é vasculhar a vida do consumidor, usando até mesmo meios controversos para chegar à informação desejada pelo cliente. E pedem alto pelo serviço. Descobrir, via Internet, o Social Security Number (um dos documentos de identificação mais importantes por lá) de um consumidor pode custar até US$ 26.
O direito à individualidade está garantido no Código de Defesa
do Consumidor e até na Constituição Federal. Você não precisa,
por exemplo, preencher um cadastro sempre que faz uma compra. Apenas nas financiadas isso é uma exigência. ?E se a loja quiser condicionar uma venda ao fornecimento de dados pessoais, o comprador precisa ser avisado da regra antes mesmo de escolher
o produto?, explica o advogado Ricardo Wada, do Procon de São Paulo. O advogado mineiro Luiz Fernando Augusto resolveu, por conta própria, tomar algumas precauções contra a superexposição. Quando usa cartão de crédito ou de débito automático, não
coloca seu telefone no verso. ?Às vezes escrevo o número da polícia, 190?, diz Augusto. Outro cuidado: ele não preenche
cadastro para correspondências. A única exposição que ele não consegue evitar é a dos planos de fidelidade e cartões de
crédito. E para saber por onde andam seus dados, Augusto muda
a grafia do endereço e do próprio nome, com abreviações. ?Assim, fico sabendo exatamente quem forneceu minhas informações
quando recebo qualquer mala direta.?
Para evitar a fama de vilãs, as principais empresas virtuais já discutem uma norma brasileira de privacidade on-line. Desde o
fim do ano passado, existe um selo criado pela Fundação Carlos Alberto Vanzolini, de São Paulo. ?Só recebe o selo as companhias
de Internet que garantirem o uso exclusivo dos dados pessoais do internauta?, conta Edmundo Barbosa, da Spectrum Engenharia, responsável pela certificação. ?Faz parte da nossa política não divulgar e-mail sem autorização?, diz Sérgio Pretto, diretor do portal Terra. O provedor IG garante que, mesmo que você aceite receber informações sobre determinados assuntos, ele estará sempre mediando a transmissão. Mas o principal transmissor de dados pela rede continua sendo você mesmo. Conhecer bem onde está colocando seus dados pessoais vale em qualquer circunstância,
no mundo real ou virtual.