23/03/2001 - 7:00
Uma maravilha, a vida de tabelião nesses tempos de real. Estabilidade até os 70 anos, autonomia e dinheiro, muito dinheiro. Essas vantagens transformaram o cargo de dono de cartório no emprego mais cobiçado do setor público brasileiro. Com a mudança na legislação a partir de 1988, os cartórios deixaram de ser transferidos de pai para filho e são comandados agora por jovens advogados admitidos por concurso público para um boquinha quase vitalícia. Eles são a nova elite do carimbo. Chegam a faturar R$ 400 mil por mês em um negócio líquido, certo e sem concorrentes, tudo garantido pelo contribuinte, já que os tabeliões acabam recolhendo dinheiro do grande público para oficialização de documentos.
Na semana passada, 13 tabeliões assumiram novos postos em Brasília, que já possui 21 cartórios. Conseguiram a façanha de, no terceiro concurso realizado desde 1963, vencer outros 1.500 candidatos e garantir o cargo. Com idade média de 27 anos e ternos bem cortados, eles fazem questão de deixar para trás a imagem dos batedores de carimbos. Falam dos planos de expansão do negócio, de melhoria dos serviços, da informatização dos arquivos. Tudo com a desenvoltura de um empresário do setor produtivo, cuja produção se resume a rubricas, garranchos e carimbos, como no início do século passado.
Um exemplo é Luiz Gustavo Leão Ribeiro, um advogado de 28 anos que assumiu na segunda-feira, 19, o 1º Ofício de Registro de Imóveis do Distrito Federal. Ribeiro, que iria ganhar R$ 4 mil após passar em um concurso de procurador do Rio de Janeiro, decidiu abandonar a idéia ao saber que tinha conseguido o cargo de tabelião. Ele nega, no entanto, que a opção foi pelo dinheiro. ?Sempre quis exercer uma função pública. Não quero apenas faturar?, diz Ribeiro, que se formou em 1996. Mas vai faturar alto, sim.
O cartório que ele passa a comandar já tem 127 mil registros e faz outros 25 a cada dia, em média, por R$ 190 a unidade. O jovem tabelião faz planos. Vai investir R$ 250 mil para informatização dos registros e alugar um amplo andar para seu novo negócio. Usando técnicas de marketing, decidiu tirar a palavra cartório dos documento. No lugar, vai imprimir a expressão ?serviço registral?. ?Assim, vamos aumentar ainda mais nosso faturamento?, aposta.
O advogado McArthur de Andrade Camargo, de 30 anos, também está entusiasmado com o comando do rentável Serviço de Distribuição do Distrito Federal. Contratou a própria mulher, Leide Jane, e pretende informatizar o cartório e treinar a equipe de 30 pessoas. ?Claro que lucro é importante. Mas quero exercer bem uma função pública. Não pretendo apenas sentar e faturar?, diz, sem citar números do seu novo negócio. De vida nova, o ex-auditor fiscal vai usar seu super-salário para comprar uma casa própria. Como seus colegas, Camargo poderá ficar em seu cargo até os 70 anos. Mesmo assim insiste que seu objetivo não é a estabilidade do emprego. ?Isso não me engrandece. Quero estudar e crescer na carreira.? Ah, bom…