01/11/2019 - 16:24
Na frente da antiga casa de Malcolm X, Aaron Sims hesita um momento antes de confessar que votou no republicano Donald Trump. Em Detroit e no restante dos Estados Unidos, os negros, cruciais para os democratas em qualquer eleição, parecem ter perdido seu entusiasmo pelo partido.
“Sei que me vão me criticar se eu disser, mas, sim: votei em Trump” em 2016, admitiu Sims, de 42 anos, ativista em um bairro permeado de conflitos e símbolo do desencanto dos negros em relação à sigla do ex-presidente Barack Obama.
“Os democratas deram como certo que os afro-americanos iam lutar por eles”, opina. “Então, ninguém realmente falou dos nossos problemas”, criticou.
Com seu voto, ele explica que quis mandar uma mensagem: “Não fizeram nada por nós, embora a gente tenha dado nosso apoio a eles até agora”.
Em 2016, o republicano Trump superou a democrata Hillary Clinton com uma diferença de menos de 11.000 votos em Michigan, um destes estados do Meio-Oeste que se inclinaram em favor do atual presidente, após optarem pelos democratas durante anos.
E, embora eleitores brancos, trabalhadores e mulheres com formação universitária tenham tido um papel decisivo na vitória de Trump, Detroit também contribuiu para a mudança: ali, Hillary recebeu 76.000 votos a menos do que Obama em 2012.
Sims trabalha como jardineiro, após passar dez anos em uma das fábricas de automóveis que se concentram na zona metropolitana de Detroit, uma cidade de maioria negra, berço do mítico selo da indústria fonográfica Motown.
Depois de cair na bancarrota em 2013, Detroit se tornou uma das mais pobres zonas urbanas do país, com o aumento da população de rua e de casas desertas, já que muitas pessoas foram embora.
Nos últimos tempos, Detroit experimenta uma recuperação no setor turístico no centro, mas a grande maioria de sua população negra não se beneficia dessa retomada.
– Decepção –
Em uma agradável manhã de outono, Sims conta que sua cidade, Inkster, ao lado de Detroit, foi criada na época da segregação racial para alojar os operários negros.
Para ajudar a juventude dessa localidade, atingida pela criminalidade, criou a associação “Project We Hope Dream and Believe”, e sonha com transformar em museu a pequena casa, onde, segundo ele, Malcolm X viveu nos anos 1950.
Três anos depois da eleição de Trump, não notou a melhoria na economia de que tanto fala o presidente, ainda que o desemprego tenha atingido um piso histórico para os afro-americanos.
Ele voltará a votar em Trump, em novembro de 2020?
“Estou bastante certo de que não, mas também dependerá dos democratas”, afirmou.
Por meio de debates, conferências e comícios, os grandes nomes das primárias democratas já começaram a cortejar Detroit.
Sims aprecia a nova favorita Elizabeth Warren, uma senadora progressista, assim como o também progressista Bernie Sanders e os senadores negros Cory Booker e Kamala Harris.
Danielle Atkinson, de 37, fundadora da organização Mothering Justice, que ajuda mães negras, ou de outras minorias em situação de pobreza, também acompanha as primárias com atenção.
Assim como Sims, porém, ela não coloca Joe Biden, o vice de Obama, entre seus favoritos. Prefere Harris, Sanders, ou Warren.
Danielle não votou em Trump, mas compartilha a impressão de que os democratas não lutaram o suficiente para atrair o voto das minorias em 2016.
– Eleição “crucial” –
“Os afro-americanos são, de longe, o grupo mais fiel de eleitores democratas e somos muitos a votar”, lembra Eric Williams, advogado da organização Detroit Justice Center.
Mas “se alguém quiser melhorar a participação afro-americana, então, tem que responder realmente às preocupações dos negros”, alerta.
Vozes importantes desta comunidade, como a de Martin Luther King III, filho mais velho do ícone da luta contra a desigualdade racial, tentam mobilizar esta parcela do eleitorado.
“A próxima eleição é uma das mais cruciais da nossa época”, disse à AFP, após um encontro com moradores de Detroit.
“Vimos o começo de uma mudança fundamental em 2018” com vitórias democratas nas legislativas, afirma.
“E estou convencido de que essa mesma energia, essa mesma coalizão de jovens, de mulheres, de negros e de outras minorias pode fazer a diferença” em 2020, convoca.