09/04/2018 - 9:40
O motivo não é claro, mas há mais de 100 anos a viúva Maria Angélica de Sousa Queirós desistiu de homenagear o ex-marido na avenida que acabara de ampliar. Em vez de manter o nome da via que seria estendida (Avenida Itatiaia), a empreendedora decidiu colocar o próprio nome no local, que fica na região central da cidade. A situação perdurou até 1907, quando toda a extensão do logradouro foi oficializada como Avenida Angélica. E a homenagem ao ex-marido? Ficou em uma travessa, a Alameda Barros, onde ambos moraram.
Parte dessa história é resgatada pelo coletivo PISA: cidade + pesquisa, que reúne pesquisadores, estudantes, arquitetos, historiadores . A primeira série de atividades foi encerrada com a realização de três passeios sobre as “fundadoras” de Higienópolis, Santa Cecília e Vila Buarque: Veridiana da Silva Prado, Maria Angélica de Sousa Queirós e Maria Antônia da Silva Ramos.
Roteiro
O tour, feito em parceria com o Sesc Consolação, é dividido em três passeios, cada um focado em uma das “donas”. Para a coordenadora do “Três Donas”, a pesquisadora Karoline Barros, a classe social foi um dos motivos que garantiu a permanência do nome dessas mulheres nas três vias.
“Muitos nomes de ruas e avenidas mudaram ao longo do tempo, de mulheres especialmente. Mas a importância dessas mulheres acabou resguardando o nome delas nessas vias”, diz. “O sobrenome era muito ligado ao marido. E elas conseguiram de uma maneira ou de outra cuidar dos negócios”, diz.
O passeio liga cada uma das mulheres à área em que mais se destacaram (educação, empreendedorismo e artes e vida social). No caso de Maria Antônia da Silva Ramos, seu maior legado é ter vendido por um valor baixo parte do terreno da Chácara Lane à Escola Americana, em 1879, primeira instituição de educação mista de São Paulo (com meninos e meninas) – que, desde o início, aceitava estudantes negros. A Escola Americana deu origem ao Instituto Presbiteriano Mackenzie.
O roteiro seguinte é focado na mais famosa das três donas: Veridiana da Silva Prado, que se destacou pelos eventos artísticos e sociais que realizava e pelo fato de ter se separado em um período muito anterior à legalização do divórcio. O palacete em que ela viveu era o grande espaço de reunião da elite intelectual e, atualmente, é sede do Iate Clube.
Por fim, o trajeto de Maria Angélica está focado nos dois perfis da via, que tem propriedades de maior dimensão (e mais abastadas) no trecho abaixo do Parque Buenos Aires, e um comércio mais variado na outra metade da avenida. O motivo, segundo Pedro Beresin, que estudou a via em sua dissertação de mestrado, é que a proximidade com o Cemitério da Consolação e o antigo Hospital de Isolamento (hoje Hospital Emílio Ribas) afastava as elites por questões sanitárias e de status – atraindo a classe média e também operários.
Enquanto a nova edição do “Três Donas” não ocorre, o PISA realiza o “PISAço pelo Centro” no próximo sábado, com saída às 9 horas do Sesc 24 de Maio. O passeio é gratuito e não é preciso fazer inscrição. Ainda há a ideia de reunir o conteúdo do tour em um livro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.