08/10/2003 - 7:00
Já não há mais nenhum obstáculo visível na pista para que as novas apostas da Embraer, os aviões EMB 170 e 190, possam decolar. Depois de nove meses com sérias dificuldades de obter crédito do governo para a exportação, o presidente da companhia, Maurício Botelho, tem tudo certo para assinar nesta semana com o BNDES um contrato de US$ 1 bilhão para o financiamento à exportação de suas aeronaves. O valor garante as vendas efetivadas este ano. Para 2004, uma outra linha de crédito está sendo negociada. Os detalhes do contrato estão cobertos de sigilo, para não instigar a concorrência da Bombardier, do Canadá, que há dez anos disputa com a Embraer, palmo a palmo, o terceiro lugar como a maior indústria de avião do planeta. Para não afetar o pregão da Bolsa de Valores, a empresa e o banco estão mantendo sob sigilo a data exata da assinatura do contrato. Segundo apurou DINHEIRO, será uma complexa operação triangular, decidida no Palácio do Planalto, na qual o Tesouro Nacional vai transferir ao banco 2,5% do valor de cada avião exportado, a título de redução dos riscos. Cada aeronave custa cerca de US$ 30 milhões. ?A saúde da Embraer é fundamental?, disse o presidente do banco, Carlos Lessa. ?Qualquer turbulência na empresa afeta a saúde do banco.?
Este ano, o BNDES chegou a soltar US$ 790 milhões para a
Embraer financiar a venda de 40 aviões ERJ 145, mas fez exigências quase insuperáveis para alavancar o lançamento do EMB 170. A empresa pediu a intervenção de Brasília. Lessa então apresentou aos chefes números assustadores, ainda hoje mantidos no mais absoluto sigilo. Segundo suas contas, o banco comprometeu R$ 22 bilhões (US$ 8 bilhões) em operações diretas e indiretas da Embraer, para um patrimônio líquido de R$ 16 bilhões. No governo passado, a Embraer tinha uma relação privilegiada com o BNDES. ?Eles exportavam primeiro e comunicavam depois?, queixa-se Darc Costa, vice-presidente da instituição. A Embraer precisa produzir 160 jatos por ano para se manter no azul. Precisa também de US$ 4,5 bilhões ao ano de financiamentos. Com um ministro, Lessa foi catastrófico: ?Se algum cliente da Embraer quebrar nos Estados Unidos, o BNDES quebra junto?. A direção do banco vem forçando a Embraer a encontrar fontes externas de financiamento. Também está exigindo que a indústria aumente o percentual de partes e peças fabricadas no Brasil, hoje em 40%. Neste momento, a Embraer está forçando a GE a aumentar as peças brasileiras das turbinas do 170 e do 190. ?Temos uma relação inseparável com o BNDES?, lembra Horácio Aragones Forjaz, vice-presidente da Embraer.
A produção da nova família de aviões da empresa foi uma decisão ousada e perigosa. Foi preciso antes conspirar com as companhias aéreas dos EUA para minar o poderoso lobby dos sindicatos de pilotos de jatos de grande porte. A partir de 1994, os sindicatos acertaram com as companhias a proibição de vôos regionais com mais de 50 lugares. Foi ótimo para a expansão da Embraer e a Bombardier. Mas deixou um nicho de mercado em aberto, os vôos de média distância, em aviões entre 60 e 100 lugares. Esse nicho representou, em 2002, 61% do mercado dos EUA. O menor Boeing tem 113 lugares; a nova família da Embraer tem entre 70 e 108 assentos. Antes de iniciar a produção industrial, há três anos, o diretor de Inteligência de Mercado da empresa, Orlando Ferreira Neto, acertou em segredo com a direção da US Airways quebrar o acordo com os sindicatos. Isso ocorreu em janeiro. Em meados do ano, a American Airlines e a Delta também mudaram seus acordos. Neste momento, Continental e United renegociam com os sindicatos. ?A aposta de todas essas empresas é nos EMB 170 e 190?, comemora Ferreira. ?Será difícil à Bombardier correr atrás do prejuízo.? Em fins de novembro, será entregue o primeiro EMB 170, à Alitalia. Na seqüência, cinco outras aeronaves irão para a US Airways. Já foram vendidos 244 aviões EMB 170, com pagamentos fechados, e há outras 309 opções de vendas. Em 2004, a Embraer deve subir ao pódio da aviação comercial como a terceira maior em volume de vendas, descolando-se da Bombardier, atrás apenas da Boeing e Air Bus. O acordo com o BNDES será como um vento de cauda.