Os países emergentes estão desenvolvendo um processo mais saudável e sustentável de queda dos juros, enquanto no mundo desenvolvido a expectativa é de manutenção dos juros altos por mais tempo, reiterou nesta quarta-feira, 22, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Ele citou o caso da Austrália, em que o mercado ainda espera elevação dos juros, mas frisou que em grande parte do mundo desenvolvido o discurso é de manutenção dos juros elevados, a exemplo de Estados Unidos e União Europeia.

Sobre o caso norte-americano, Campos Neto afirmou que os juros nos Estados Unidos subiram mais do que qualquer um poderia imaginar. Ele argumentou que há dois fatores que podem ser levantados para responder o porquê desse movimento: a expectativa de uma inflação mais alta e o aumento do prêmio de risco do país.

O problema fiscal nos Estados Unidos, com aumento da dívida americana, foi alertado recentemente pela Fitch e pela Moodys, frisou o banqueiro central. “O prêmio de risco subiu. Tem impacto do gasto que foi feito.”

Campos Neto defendeu, no início de sua fala, que houve uma coordenação menor dos países entre a política monetária e fiscal na saída da pandemia, em comparação à entrada.

“Vemos os bancos centrais subindo juros, mas em vários países do mundo o fiscal não acompanha o mesmo esforço”, afirmou o presidente do BC, que participa nesta quarta-feira de café da manhã com a Frente Parlamentar pelo Livre Mercado, no Senado Federal.

Efeitos da pandemia

Ele acrescentou que há dificuldade para reverter programas criados na pandemia.

O banqueiro central reiterou que houve um endividamento grande dos países durante o período de crise sanitária e que agora há uma dívida global muito mais alta.

Campos Neto alertou que, com as taxas de juros mais altas também, se tornou mais caro rolar a dívida, o que implica em falta de liquidez. “Esse é um processo cumulativo. À medida que os meses vão passando e o custo de dívida subindo no mundo desenvolvido, vai tirando liquidez do mundo privado e emergente.”

Fatores da desinflação

O recuo dos preços de alimentos foi um dos principais elementos para o processo de desinflação global, mas recentemente houve uma estabilização, reiterou Campos Neto, ao listar os motivos porque a segunda parte do processo desinflacionário tem sido lenta e difícil.

Ainda sobre os alimentos, Campos Neto afirmou que ainda não é possível atrelar de forma empírica o aumento da incidência de desastres naturais à elevação dos preços dessa categoria, mas que já é possível estabelecer uma correlação com a volatilidade dos preços. “Olhando para frente, como vemos o aumento dos desastres em uma curva subindo bastante forte, a volatilidade no preço dos alimentos também será forte”, projetou.

Sobre a dificuldade atrelada à segunda parte do processo de desinflação, o presidente da autarquia também comentou sobre a incerteza recente ao redor do petróleo. Campos Neto frisou que o preço está “resistindo bem” aos conflitos no Oriente Médio, mas que há muitas variáveis. “Existe o tema se será negociada a paz ou se o Irã vai entrar na guerra”, exemplificou. “Não tem um movimento fácil de preço de petróleo à frente.”

O presidente do BC reiterou ainda que existiam expectativas iniciais de que a desinflação seria consolidada pelo mercado de trabalho ou pelo consumo do excesso de poupança, mas que esses caminhos não estão progredindo como o esperado. “Em quase todos os países, o mercado de trabalho está igual ou mais apertado do que estava antes da pandemia. Se está igual ou mais apertado, não parece que os salários irão cair”, pontuou o banqueiro central, que acrescentou que a poupança também está no campo positivo ou neutro em grande parte do mundo.

A fragmentação das cadeias globais também foi listada como um dos vetores que não estão contribuindo com pressão desinflacionária. “O mundo está se reorganizando. O elo asiático quer ter menos dependência dos Estados Unidos e do mundo Ocidental. Vemos isso com queda das importações e do movimento de comércio entre Estados Unidos e China”, disse Campos Neto, que ponderou que esse movimento cria um custo para as empresas.

O presidente do BC também repetiu que havia uma percepção de que os juros mais elevados diminuiriam os preços do mercado imobiliário, mas que esse movimento não está se concretizando.