Desde que chegou ao poder em 2017, o presidente francês, Emmanuel Macron, enfrentou duros protestos contra suas reformas e uma pandemia global, com a mesma determinação com a qual agora opta pela reeleição em meio à guerra na Ucrânia.

O chefe de Estado vai anunciar na noite desta quinta-feira (3) sua intenção de concorrer a um segundo mandato com uma “Carta aos franceses”, segundo fontes de sua equipe, no momento em que o líder se encontra envolvido com a mediação internacional na Ucrânia.

Meses antes de chegar ao Eliseu, já avisava que seria um “presidente jupiterino”, expressão que, segundo o dicionário Larousse, evoca o “caráter dominador e autoritário” do deus romano Júpiter. E não decepcionou.

A crise dos “coletes amarelos” foi seu expoente máximo. Deflagrado em 2018 pelo aumento dos preços dos combustíveis, este protesto se espalhou por toda França para denunciar as medidas deste ex-banqueiro contra as classes populares.

A manifestação sustentou sua imagem de “presidente dos ricos” e desconectado da realidade, conquistada e reforçada com frases polêmicas. Entre elas, quando Macron disse que nas estações de trem “você encontra pessoas que fizeram sucesso e pessoas que não são nada”.

“Acho que cheguei [ao poder] com uma vitalidade que espero continuar tendo e com vontade de sacudir” o sistema, justificou-se em dezembro durante uma entrevista sobre seu mandato, na qual reconheceu “erros”.

A partir de 2020, a pandemia de coronavírus pôs fim a estes protestos em uma nova França de confinamentos e de máscaras e promoveu o perfil mais “jupiterino” de Macron: “Estamos em guerra” contra a covid-19, destacou então.

– “Hiperpresidencialização” –

Sua gestão pessoal da pior crise desde a Segunda Guerra Mundial rendeu-lhe ataques da oposição e, apesar da resistência inicial da população, soube ganhar sua confiança e impôs medidas polêmicas, como o passaporte sanitário.

“As crises exigem uma hiperpresidencialização (…). Nesses momentos, Macron está como um peixe na água”, ao contrário de quando o “mar está calmo”, analisou, recentemente, a jornalista Corinne Lhaïk no jornal L’Opinion.

A atual ofensiva russa na Ucrânia representa mais uma crise que trouxe à tona a hiperliderança do presidente centrista que, apesar de fracassar em sua tentativa de evitar a guerra, vê suas intenções de voto avançarem nas urnas.

Seu sucesso não seria, porém, resultado de sua popularidade.

“Sua principal força reside, sobretudo, na fraqueza dos outros candidatos”, afirmou, também recentemente, o diretor-geral da Fundação Jean Jaurès, Gilles Finchelstein.

Dois terços dos franceses veem-no como um presidente “autoritário”; metade, como “competente”; e apenas um terço, como “sincero”, ou “próximo”, dos problemas da população, segundo uma pesquisa do Ifop realizada antes da invasão russa.

Este homem elegante de corpo esguio e olhos azuis era pouco conhecido até sua nomeação como ministro da Economia em 2014 pelo então presidente francês, François Hollande, depois de ser seu conselheiro econômico.

Três anos depois, Emmanuel Macron, nascido em 1977 em Amiens (norte) em uma família de classe média, tornou-se o mais jovem presidente eleito da França, aos 39 anos, ao final de uma ascensão meteórica de um homem com pressa.

– “Brilhante e carismático” –

Em 1995, graduou-se com honras no prestigioso Lycée parisiense Henry IV, após o qual obteve o título de mestre em filosofia. Durante seus anos de faculdade, trabalhou como assistente editorial do renomado filósofo francês Paul Ricoeur.

Nos seus tempos de estudante já era “brilhante e carismático”, “um bom orador”, “com um perfil à la Barack Obama”, disse em 2016 Julien Aubert, seu colega na Escola Nacional de Administração (ENA), o antigo centro de formação de elites.

A essa altura, esse amante da filosofia e das letras já havia encontrado o amor de sua vida. Aos 16 anos, apaixonou-se por sua professora de teatro Brigitte Trogneux, 24 anos mais velha, uma história de amor atípica que cativou a imprensa.

Trogneux era casada e tinha três filhos, mas se divorciou. O casal que quebrou padrões se casou em 2007.

Se for eleito, como preveem as pesquisas, o líder europeísta terá de completar seu ambicioso programa de reformas interrompido pela pandemia, em linha com o que é recomendado pela Comissão Europeia para estabilizar sua economia.

Entre suas promessas já antecipadas de transformar a França, estão o “renascimento” da energia nuclear, alcançar a neutralidade de carbono até 2050 e retomar a reforma da Previdência, que já gerou protestos multitudinários em 2019 e 2020.

Algumas vozes, como o presidente do Senado, o direitista Gérard Larcher, alertam, no entanto, que se Macron for reeleito em abril sem um verdadeiro debate eleitoral, devido à guerra na Ucrânia, sua “legitimidade” estará em “risco” durante seu mandato.