08/03/2022 - 8:00
O empreendedorismo tem sido a saída encontrada por muitos brasileiros para tentar driblar a crise. Segundo o Relatório de Empreendedorismo no Brasil 2020 da Global Entrepreneurship Monitor (GEM), realizado pelo Sebrae e o Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBPQ), quase 55% das mulheres tiveram que recorrer ao empreendedorismo por não encontrar outro meio para ter uma renda. Elas representaram ainda 55,5% dos empreendedores nascentes (com até três meses de atividade) naquele ano, últimos dados disponíveis.
O empreendedorismo feminino no Brasil apresentou claros sinais de recuperação no último trimestre do ano passado, depois do forte impacto registrado a partir dos primeiros meses da pandemia de Covid-19. Após recuar para um total de 8,6 milhões de donas de negócio, no segundo trimestre de 2020, o número de mulheres à frente de um negócio no país fechou o quarto trimestre de 2021 em 10,1 milhões (mesmo resultado alcançado no último trimestre de 2019). É o que mostra um estudo do Sebrae feito a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do IBGE (PNADC).
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Apesar dessa evolução, a participação das mulheres empreendedoras no universo de donos de negócio no Brasil (34%), ainda está abaixo da melhor marca histórica, registrada no 4º trimestre de 2019, quando elas representavam 34,8% do total.
O levantamento mostra que a participação feminina entre os donos de negócios empregadores também continua abaixo do período pré-crise. No final de 2019, havia 1,3 milhão de donas de empresas que contratavam empregados (o que representava 13,6% do total das Donas de Negócio). Já no final do ano passado, esse número havia recuado para 1,1 milhão (11,4% do universo).
Para o presidente do Sebrae, Carlos Melles, as mulheres empreendedoras sofreram mais que os homens as perdas causadas pela crise pandêmica. “Empresas lideradas por mulheres tiveram um impacto maior em termos de redução de empreendedoras em atividade e uma recuperação mais lenta que a verificada entre os negócios dirigidos por homens. Uma das explicações para esse fato está na nossa cultura, onde elas acabam tendo de dividir seu tempo entre a gestão da empresa e os cuidados com a família. Com as medidas de isolamento social, muitas empresárias tiveram de encerrar suas atividades ou reduzir a operação do negócio para dedicarem mais horas aos filhos e idosos”, comenta.
“Pelo empreendedorismo, muitas mulheres conseguem tomar as rédeas da sua vida e da sua carreira”, considera a empreendedora Camile Just. Até 2015, Camile trabalhava como gerente de uma loja de shopping. Com uma filha pequena, à época com 10 anos, Camile queria mais tempo para cuidar da criança. “Decidi que eu queria um trabalho que me desse mais liberdade, mais realização. Eu não me sentia feliz no mercado formal de trabalho, queria passar mais tempo com a minha filha e explorar outros talentos”, conta.
Foi aí que Camile juntou todas as suas competências, teve a ideia de formatar o trabalho de assistente virtual e empreender. Mas, não foi tão simples assim. Conforme a pesquisa Mulheres Empreendedoras 2021, feita pelo Instituto Rede Mulher Empreendedora, esse caminho é mais difícil para elas. Segundo o levantamento, 79% das mulheres afirmam que funções relacionadas a cuidados da casa e dos filhos são um empecilho mais para elas do que para eles na hora de empreender.
Atenta às próprias dificuldades, Camile Just criou uma atividade que pudesse ser desenvolvida concomitante com os afazeres relacionados à família. A nova profissão proporcionou independência financeira para ela que, com sucesso pessoal, desenvolveu um curso para treinar outras mulheres. “No início da pandemia, quando muitas delas ficaram desempregadas, puderam se redescobrir prestando serviços online e se empoderaram com isso”, lembra.
O fato é que quando o assunto é empreendedorismo, as mulheres ainda atuam em um universo de atividades mais restrito que os homens. Segundo o relatório GEM de 2020, mais da metade das empreendedoras iniciais, aquelas com empreendimento de no máximo 3,5 anos, ou seja, quase 60%, atuam em apenas seis atividades. Já entre os homens, o número das principais atividades sobe para 14, mais do que o dobro.
“A questão cultural ainda afeta muito o empreendedorismo feminino. A sociedade acaba colocando barreiras adicionais para as mulheres expandirem sua presença para outras atividades além das culturalmente aceitas, como alimentação e beleza. Trabalhamos para mudar esse cenário e destravar o potencial empreendedor das mulheres em todos os setores”, comenta o presidente do Sebrae.
Estudo realizado pelo Movimento Expansão, NOZ Inteligência, Plataforma Empreendedoras Maduras e o Grupo Mulheres do Brasil mostra que 74% das entrevistadas têm vontade de empreender, enquanto 24% já estão planejando um novo negócio.
Depois de 20 anos trabalhando como executiva em grandes empresas, Patricia Y Agopian, decidiu abrir a Bússola Executiva em março de 2020, início da pandemia. A empresa ajuda pessoas no desenvolvimento pessoal e corporativo, traçando uma rota diferente dos demais, tornando possível o sonho de dezenas de profissionais. Até o momento já formou 954 alunos (55% do sexo masculino e 45% do sexo feminino). Cerca de 15% foram promovidos ou tiveram aumento salarial, transição ou recolocação em seus empregos – em três meses, na média. Do total, 15,3% foram mulheres e 16% homens.
Cleusa Maria da Silva, fundadora da Sodiê Doces, rede de franquias especializada em bolos artesanais, viu no empreendedorismo a possibilidade de mudar de vida. Em 2020, com o país em plena restrição devido às regras sanitárias impostas pela disseminação da Covid-19, a marca assinou 11 contratos, entre lojas e PDVs (Pontos de Venda). No ano passado, esse volume saltou para 17%, obtendo crescimento de 55%.
“Acredito na capacidade de expansão da marca. A rede fechou o ano de 2021 com faturamento de R$ 465 milhões de reais e 341 lojas em funcionamento. Para este ano pretendemos ultrapassar a quantidade de 350 lojas e projetamos 7% de aumento no faturamento anual”, projeta a CEO e fundadora da Sodiê.
De família pobre, Cleusa trabalhou como boia-fria, cortando cana, e empregada doméstica. O empreendedorismo teve início em 1997, quando iniciou seu negócio em pequeno espaço, na cidade de Salto, interior de São Paulo. Funcionária de uma empresa de alto-falantes, ela passou a ajudar a mulher de seu patrão, que fazia bolos para fora. Aos poucos, passou a ‘tocar’ o negócio.
Com o sucesso das balas de coco e bolos, em 2001, mudou o empreendimento para espaço maior e, dez anos depois, em 2007, a Sodiê Doces virou franquia. Hoje, Cleusa está à frente das mais de 340 lojas espalhadas pelo País e duas em Orlando, nos Estados Unidos. Apesar de as unidades serem administradas por seus franqueados, todos são orientados por uma equipe gestora, onde há o acompanhamento da padronização dos produtos e o lançamento de itens, mantendo a qualidade em toda rede.