Depois de trabalhar por alguns anos no mercado financeiro, o engenheiro João Paulo Pacifico, 45 anos, enxergou problemas no setor de capitais que contribuíam para a injustiça social e decidiu abrir a sua própria empresa de investimentos: o Grupo Gaia. O objetivo era criar uma companhia que fosse mais humana e com passar o tempo passou a atuar com melhorias de índices sociais e ao impacto social como um todo.

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“Trabalhando nessa área, observei que a forma como o mercado financeiro atua não considera o bem comum como um fator positivo para todos. Esse mercado foi para um caminho materialista, menos humano, com claro e único objetivo pelo lucro, explorando o trabalho enquanto muitas pessoas empobrecem”, conta João.

Após a criação do Grupo Gaia, o empresário se dedicou a fazer com que sua companhia tivesse a premissa de tornar o mercado financeiro mais humano, ao mesmo tempo que seus colaboradores contassem com um ambiente de trabalho mais saudável.

João sempre pertenceu a classe média, não é herdeiro, mas conquistou uma estabilidade financeira com os retornos obtidos por meio da Gaia.

Em 2014, decidiu criar a Gaia+, formando uma Organização Não Governamental (ONG) inteiramente dedicada a educação com compaixão. No mesmo ano, o Grupo Gaia se tornou em uma empresa certificada B.

Em 2017, por exemplo, o Grupo Gaia entrou nos investimentos de impacto a partir de um projeto que levava reformas residenciais a pessoas que moravam em favelas. “Fizemos uma debênture do bem. Ganhamos prêmio da Organização das Nações Unidas (ONU) e vi que o impacto que causamos na vida das pessoas atingidas era muito bacana”, explica Pacifico.

Enquanto isso, o Grupo Gaia, de forma paralela, atuava também no setor de agronegócio, o que trouxe ainda mais dúvidas a João sobre como o capitalismo estava contribuindo para o aumento dos índices de desigualdade social.

“Financiávamos muito o agronegócio. Mas eu pude conhecer os seus impactos. Parte desse mercado é voltado a alimentar as pessoas em outro países, ao mesmo tempo que a pobreza e a fome no país aumentava, além de contribuir para o maior desmatamento. Até que conheci a agricultura familiar”, relata.

Após ver de perto o trabalho das famílias produtoras, Pacifico também enxergou que o movimento trazia mais vantagens para a sociedade como um todo. Então, decidiu tornar o Grupo Gaia numa empresa voltada inteiramente aos investimentos de impacto social.

Em 2022, Pacifico vendeu um dos braços do Grupo Gaia, a Planeta, e destinou todos os recursos oriundos da transação a novos investimentos de impacto e à continuação do trabalho desenvolvido pela companhia.

“Após essa decisão, o Grupo Gaia criou um Fundo Patrimonial de Impacto. O lucro é todo revertido em novos projetos. Não via mais sentido em continuar lucrando como estava”, diz Pacifico.

Já com uma vida financeira estabilizada e se vendo em uma posição de privilegiado, o empresário também passou a se dedicar a estudar ainda mais o capitalismo e suas injustiças. Desde então, passou a liderar projetos que envolvem maior taxação de impostos sobre milionários, a cultura de proteção ambiental e a diminuição das desigualdades.

“Visito lugares em que vejo as condições reais de pessoas em situação de alta vulnerabilidade. Qual a chance daquela pessoa chegar à classe média ou sequer ter uma vida financeira equilibrada? Nenhuma. Se não mudarmos a forma como o capitalismo se estabeleceu, os pobres vão ser ainda mais pobres e os ricos, mais ricos. O que não é bom para ninguém”, comenta.

Por isso, Pacifico é defensor ferrenho da maior taxação de impostos para a classe mais abastada do País. Ele publica vídeos recorrentes em seu Instagram explicando a necessidade de se ajustar essa tributação para que haja um maior equilíbrio social. Confira no link.

“A gente tem que ressignificar isso. Acho assustador, pois o que eu falo parece bem óbvio. O capitalismo e o neoliberalismo fomentam a exploração do trabalho, contam a história de que tem dinheiro para todo o mundo, mas sabemos que não é assim. Para enriquecer alguém nesses moldes, você empobrece outra pessoa que precisaria daquele recurso”, afirma.

João conta, ainda, que sua condição financeira é bastante favorável, mas que está longe de ser um bilionário. Inclusive, nesse sentido, não é seu objetivo se tornar ainda mais rico.

“Pessoas bilionárias representam uma anomalia do capitalismo. Deveriam existir sistemas capazes de evitar que existam pessoas nessa condição. Ao meu ver, há na sociedade um ‘vício em dinheiro’ que leva esses atores do capitalismo a uma glamourização da riqueza, o que por sua vez atrai outros ao mesmo caminho”, diz Pacifico.

Proud to Pay More

O empresário sugere uma maior taxação na renda dos mais ricos como forma de combater a desigualdade, deixando para o estado o papel de distribuir essa renda da melhor forma. A tributação sobre patrimônio e heranças, hoje também pouco explorada no Brasil, são outras ferramentas defendidas por Pacifico.

Recentemente, o CEO do Grupo Gaia assinou uma carta junto com 250 outros milionários e bilionários do mundo. O documento, batizado de Proud To Pay More (orgulho em pagar mais, na tradução), foi apresentado durante a última edição do Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos, na Suíça, em meados do início de janeiro. A lista também leva a assinatura de Abigail Disney, herdeira da Disney, e do ator escocês Brian Cox.

Questionado se a maior taxação de ricos seria um risco à fuga de capitais do País, Pacifico é direto:

“Em alguns países já há essa cobrança. Quem diz que se for tributado mais sairá do Brasil é um chantagista. Não concordo com essa leitura e acho muito difícil alguém estruturado financeiramente a abrir mão de tudo, fechar seus negócios e ir embora porque está sendo mais taxado. Fomos para um caminho mais individualista. Precisamos ter menos competição e mais colaboração”, encerra.

Além de empresário, Pacifico atua como escritor, ativista e conselheiro do Greenpeace. Ele também é autor dos livros “Onda Azul” e “Seja Líder Como o Mundo Precisa”, já foi apresentador de programas na Rádio Globo, além de ter escrito artigos sobre bem-estar corporativo.