Na semana passada, a De Faire Medical lançou no Reino Unido uma pílula antirressaca que virou febre entre os britânicos. A ideia do medicamento é retardar os efeitos do álcool no corpo após uma noite de bebedeira.

Em menos de 24 horas, o lote inicial, que era destinado para comercialização de seis meses, esgotou e a myrkl (analogia à palavra miracle, ou milagre, na tradução direta) deve chegar com força no mercado inglês nos próximos dias.

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O composto utiliza probióticos, bactérias consideradas boas para o intestino, a cisteína e uma dose de vitamina B12. De acordo com os fabricantes, a pessoa se sente mais fortalecida no período seguinte ao consumo de álcool, uma vez que os microrganismos estão trabalhando contra os efeitos da bebida, impedindo sua entrada na corrente sanguínea e a posterior absorção do fígado, onde o líquido é metabolizado.

Estudo clínico da pílula antirressaca é polêmico

A polêmica, no entanto, está no estudo clínico realizado para atestar a eficácia da pílula. Levando em conta o resultado padrão da ingestão de duas doses de destilados, o produto alcançou uma taxa de redução dos efeitos do álcool em 70% e a recomendação do fabricante é de tomar dois comprimidos de uma a 12 horas antes da ingestão alcoólica.

No levantamento, somente 24 pessoas foram avaliadas com o composto, número considerado baixíssimo para atestar qualquer tipo de medicação e insuficiente para dar uma base estatística confiável. Segundo a endocrinologista da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo, Andressa Heimbecher, os dados são baixos e a explicação está no padrão de regulação das agências sanitárias. Segundo ela, por ser um probiótico, em tese, não existe a necessidade de aprovação da agência europeia e do FDA, nos Estados Unidos.

“Quando você tem bactérias que são colocadas no intestino, aparentemente essas bactérias são benignas, mas será que elas não gerariam nenhum desequilíbrio na flora intestinal das pessoas? Por exemplo, se ela tiver intolerância ao glúten, ou se a pessoas tiver uma doença inflamatória intestinal, será que ela pode fazer uso da pílula?”, indagou a endocrinologista.

De acordo com a especialista, existe uma imagem na indústria farmacêutica de que probióticos não geram danos aos usuários, porém são necessários estudos mais robustos sobre os efeitos desses medicamentos na flora intestinal.

No Reino Unido o medicamento é vendido como suplemento alimentar e é outro ponto que pode gerar incômodos entre a comunidade médica. Heimbecher comenta que as agências, inclusive a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), são mais tolerantes com os suplementos e não exigem longos estudos sobre potenciais riscos de saúde.

“A gente nunca sabe quando uma coisa que, aparentemente, é do bem, pode ter efeitos de longo prazo ruins. Os estudos científicos servem para garantir que o remédio não cause danos a quem está usando e garantir sua eficácia. Um estudo de 24 pessoas é muito pequeno”, ponderou.