Quem tem carro, moto ou caminhão vive um drama desde 2016. Foi quando a Petrobras adotou a política de Preço de Paridade de Importação (PPI). De lá par cá, os reajustes dos combustíveis se tornaram quase semanais. Quando o dólar sobe, gasolina e diesel ficam mais caros. Se o preço do barril de petróleo dispara, seja por decisão dos países produtores ou por fatores como a guerra na Ucrânia, os combustíveis no Brasil acompanham. Mas, se petróleo e dólar caíam, os preços demoravam a recuar, sob argumento de reposição de margens antigas. Esse sobe e desce acabou. Ao menos, por enquanto.

A pedido do presidente Lula, a Petrobras aprovou, na segunda-feira (15), o fim do PPI para definição de preços de diesel, gasolina e gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás de cozinha.

Petrobras anuncia fim da paridade internacional do petróleo

A partir de agora, as referências de mercado serão o “custo alternativo do cliente” como prioridade e o “valor marginal” para a Petrobras.

Traduzindo: o custo alternativo do cliente contempla alternativas de suprimento por fornecedores dos mesmos produtos ou de produtos substitutos. Já o custo marginal da Petrobras se baseia em uma cesta de despesas e receitas para a empresa, entre elas a produção, importação e exportação do produto.

As premissas, segundo nota divulgada pela estatal, são preços competitivos por polo de venda, participação da Petrobras no mercado, otimização dos seus ativos de refino e rentabilidade de maneira sustentável. Um belíssimo blá-blá-blá que nada explica e deixa muita margem de ingerência.

Ainda assim, há uma certeza: os reajustes continuarão a ser feitos sem uma periodicidade definida e a empresa evitará repasses da volatilidade dos preços internacionais e do câmbio aos consumidores brasileiros.

Investimentos em plataformas de extração para elevar a produtividade da empresa foram anunciados. (Crédito:Shutterstock)

Em nota, a companhia afirmou que “a precificação competitiva mantém também um patamar de preço que garante a realização de investimentos previstos no Planejamento Estratégico”.

Isso inclui se manter lucrativa, mesmo que com uma diretriz mais voltada para atenuar o impacto dos combustíveis na inflação e, por tabela, nos juros. “A Petrobras reforça seu compromisso com a geração de valor e com a sustentabilidade financeira de longo prazo, preservando a sua atuação em equilíbrio com o mercado, ao passo que entrega aos seus clientes maior previsibilidade por meio da contenção de picos súbitos de volatilidade”, diz a nota.

O fim do repasse automático e quase imediato do dólar e da cotação do petróleo aos preços é o cumprimento de uma das principais promessas de campanha de Lula.

O presidente atribui boa parte da inflação dos últimos anos à PPI. “O Brasil é autossuficiente em petróleo, e o custo do nosso petróleo é em real. Nos governos do PT, a gasolina, o álcool e o diesel eram em real. E lutar para abrasileirar os preços dos combustíveis é um compromisso do PT”, afirmou na campanha.

Só esqueceu de dizer que ser autossuficiente em petróleo não siginifica ser autossuficiente no refino, e que o Brasil importou em 2022, cerca de 22% de sua gasolina, por exemplo.

Jean Paul Prates, presidente da Petrobras (Crédito: Mauro Pimentel)

“O que estamos garantindo é sujeição à volatilidade especulativa internacional. Vamos ter o efeito da referência internacional, mas vai estar refratado em uma série de possibilidades nacionais”
Jean Paul Prates, presidente da Petrobras.

Jair Bolsonaro também criticou a PPI e fez o possível para controlar os preços para manter sua poularidade. A ponto de demitir três presidentes da Petrobras: José Mauro Coelho, Joaquim Silva e Luna e Roberto Castello Branco.

O atual presidente, Jean Paul Prates, afirmou que o objetivo agora é reduzir a oscilação e a especulação sobre os preços. “O que estamos garantindo é menos sujeição à volatilidade especulativa internacional”, afirmou. “Vamos ter o efeito da referência internacional, mas vai estar refratado em uma série de possibilidades nacionais.”

A redução gerada pelo fim do PPI deve baratear em 21,3% o gás de botijão, em 12,8% o diesel e em 12,6% a gasolina. Mas poderá ser neutralizada nos próximos meses com a recomposição das alíquotas de ICMS a partir de junho, conforme decisão do Comitê de Política Fazendária (Confaz).

O tributo estadual deverá ser cobrando em valor fixo de R$ 1,22 por litro. Mesmo assim, o economista Amance Boutin, especialista em combustíveis da Argus, acredita que se pode esperar preços mais baixos. “A leitura do preço dos derivados, principalmente do diesel, tem sido dificultada pelo surgimento de dois preços distintos no mercado nacional, como o produto russo e o não-russo”, disse.

Presidente Lula (crédito: Gabriela Biló)

“O Brasil é autossuficiente em petróleo, e o custo do nosso petróleo é em real. Lutar para abrasileirar os preços dos combustíveis é um compromisso do PT”
Luiz Inácio Lula da Silva, durante a campanha de 2022.

Mais previsibilidade, segundo analistas

Na ponta do lápis, a nova equação dará mais previsibilidade, embora não esteja claro qual será a periodicidade dos reajustes.

Segundo Diogo Catão, CEO da Dome Ventures, “a política de preços está direcionada para uma estabilidade”. Isso explica a boa reação do mercado ao anúncio. Os papéis da Petrobras subiram na terça-feira (16), mas tiveram ligeira queda nos dias seguintes.

Para Frederico Nobre, líder da área de análise da corretora Warren, “o contexto atual de câmbio e as quedas no mercado internacional das cotações de petróleo e diesel são propícios para um reajuste de preços para baixo”. Na manhã da quinta-feira (18), um dólar valia R$ 4,96. Agora, a nova política de preços será colocada à prova. Mesmo em uma situação de subida das cotações lá fora.

Namoro ou amizade?

Sede da Petrobras no Rio de Janeiro (Crédito: Wagner Meier)

A Petrobras escolheu o 12 de junho, Dia dos Namorados, como a data com dividendos, ou seja, o dia em que o investidor precisa estar posicionado para receber os lucros da empresa.

A estatal lucrou R$ 38 bilhões no primeiro trimestre de 2023, 14% abaixo do mesmo período de 2022 por causa da queda do preço do petróleo no mercado internacional. Mesmo com a baixa no resultado, a companhia anunciou que distribuirá R$ 24,65 bilhões em dividendos aos seus acionistas, o equivalente a R$ 1,89 por ação.

Os lucros serão pagos em duas parcelas, em 18 de agosto e 20 de setembro. No último trimestre de 2022, a petroleira havia pago o equivalente a R$ 2,74 por ação em dividendos.

Em nota em 11 de maio, a Petrobras explicou que o montante está alinhado com a Política de Remuneração aos Acionistas. Essa regra prevê que, em caso de endividamento bruto inferior a US$ 65 bilhões, a companhia deverá distribuir 60% da diferença entre o fluxo de caixa operacional e as aquisições de ativos imobilizados e intangíveis (investimentos).

Para efeito de comparação, nos governos Lula I e Lula II, a estatal distribuía o mínimo de 25% do lucro, exigido pela Lei das S/As de 1976.

Ainda segundo a Petrobras, o valor aprovado é compatível com a sustentabilidade financeira da companhia. O anúncio fez a alegria dos investidores. As ações preferenciais (PN) subiram 3,67% no dia 11 e avançaram mais 3,22% no dia 12.

Entre os analistas, a avaliação é que ainda não dá para saber se é namoro ou amizade, ou seja, se a distribuição de dividendos irá permanecer robusta nos próximos trimestres, pois a direção da empresa pretende aumentar investimentos daqui para frente, o que, com base na regra atual, naturalmente provocará redução do volume de dividendos, ao menos no curto prazo.

Em relatório, o head de Óleo, Gás e Petroquímicos da XP, André Vidal, considerou que a definição de uma nova política de dividendos da Petrobras será o próximo evento importante a ser observado.

Em relação, a mudança na precificação dos combustíveis, Vidal manteve sua visão marginalmente positiva sobre a Petrobras. “Quanto mais as coisas mudam, mas elas permanecem as mesmas de novo”, afirmou.

O analista conclui que a Petrobras tem boas probabilidades de continuar a ser um bom investimento de retorno total devido ao pagamento de dividendos.

Já os analistas da Genial Investimentos Vitor Sousa e Israel Rodrigues observaram que o Conselho de Administração (CA) da Petrobras determinou que a diretoria executiva elabore uma proposta de ajuste de planejamento estratégico e aperfeiçoamento de remuneração aos acionistas, incluindo a possibilidade de recompra de ações, e submeta essas matérias para deliberação do CA antes do encerramento de julho de 2023.

“Por um lado acreditamos que o anúncio de dividendos foi muito positivo, por outro, a nota deixou claro que a remuneração de acionistas poderá se estabelecer de outras maneiras, que não via distribuição de dividendos”, afirmaram os analistas.

Pela lógica da recompra de ações, os investidores poderiam ser mais beneficiados pela valorização dos papéis do que pelo pagamento dos lucros.

O fato é que em comparação aos pares internacionais, a Petrobras está barata até para o governo recomprar. Cálculos apontam que, por causa do risco de ingerência política, a empresa brasileira está entre 70% e 80% abaixo dos preços avaliados de petrolíferas ocidentais, que surfaram com a alta do petróleo derivada da Guerra na Ucrânia. Os próximos meses dirão como será o namoro da Petrobras com o mercado.