Muito aguardado pelos investidores de todo o mundo, o Consumer Price Index (CPI), índice que mede a inflação no varejo nos Estados Unidos, surpreendeu negativamente o mercado. O Bureau of Labor Statistics (BLS), entidade do governo americano semelhante ao nosso IBGE, anunciou na semana passada que o CPI de outubro havia subido 0,9%. Com isso, a inflação acumulada em 12 meses até outubro avançou para 6,2%. Foi o maior nível em exatos 31 anos, desde os 6,3% de outubro de 1990. Esse resultado foi muito acima dos prognósticos dos especialistas, que eram de 0,4% para o mês e de 5,8% para 12 meses.

Pela teoria econômica, uma inflação acima das expectativas deveria disparar ondas de choque nos mercados, pois os investidores antecipariam um endurecimento da política monetária. Traduzindo, alta dos juros e redução do estoque de moeda. As consequências também são conhecidas. Supondo-se uma alta dos juros americanos, espera-se que os títulos do Tesouro subam, antecipando o aumento do custo do dinheiro. As ações deveriam cair devido à queda esperada do ganho das empresas. E o dólar deve se apreciar em relação às demais moedas. A alta das taxas torna os investimentos em dólar mais atraentes, o capital internacional flui para os Estados Unidos e o câmbio se aprecia.

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Apesar da surpresa negativa da alta dos preços, houve uma surpresa positiva, a reação fraca dos mercados. Os juros dos títulos de dez anos do Tesouro americano subiram, mas a alta foi de curta duração. Os índices de ações caíram, mas no fim do dia a desvalorização não chegou a 1%. E até a taxa de câmbio do dólar em relação às demais moedas oscilou menos do que seria de se esperar. Como explicar isso?

De novo, voltemos ao livro-texto. Há várias décadas, as autoridades americanas perceberam que os preços de alguns itens, como alimentos e combustíveis, oscilam muito devido aos ruídos momentâneos da oferta e da demanda e isso insere uma volatilidade extra nos índices. Para reduzir esse efeito e dar mais clareza às tendência para os preços, os estatísticos desenvolveram os índices que acompanham o “núcleo da inflação”, ou “core index”, que não consideram os preços dos alimentos e dos combustíveis. E nesse caso a inflação está mais baixa.

O “core index” do CPI em 12 meses até outubro está em 4,6%, bem abaixo dos 6,2% do índice “completo”. A diferença ocorreu porque nos últimos 12 meses os preços dos combustíveis nos Estados Unidos subiram 30%, a gasolina ficou 49% mais cara e o óleo combustível, essencial para o aquecimento e o transporte, viu os preços subirem estratosféricos 59%. Conclusão: boa parte da alta deve-se ao aumento das cotações do petróleo.

Não é coincidência que os índices estejam nos mesmos níveis de 31 anos atrás. Em setembro de 1990, Saddam Hussein, sanguinário ditador do Iraque, havia invadido o vizinho Kuwait de olho em uma saída para o mar e nas vastas reservas de petróleo do emirado. A reação americana levou à Guerra do Golfo, o que fez disparar os preços do petróleo e pressionou a inflação. Passado o susto as cotações retornaram aos níveis anteriores e a inflação baixou.

Agora está ocorrendo algo semelhante, mas sem guerra. A discrepância entre oferta e demanda levou o barril de petróleo aos preços mais elevados em décadas, com o barril superando US$ 82, e isso não deve se ajustar tão cedo. Assim, a causa da inflação não é a tradicional economia aquecida demais, mas um descompasso na oferta de um produto específico provocada por decisões extraeconômicas: um oligopólio defendendo suas margens de lucro às custas dos consumidores. E por isso não se justifica um endurecimento da política monetária por parte do Federal Reserve. Quando a demanda e a oferta do óleo se ajustarem, o que deve ocorrer em 2022, a pressão sobre os preços vai arrefecer.

E isso vale para a inflação no Brasil também.