20/09/2025 - 8:00
A Selic está em 15% ao ano, e a tendência é que ultrapasse o calendário de 2025 e siga assim, pelo menos, até o começo de 2026. A última vez a taxa de juros esteve nesse patamar foi em meados de 2016. Entre junho e julho, ficou em 15,25%, até sofrer um corte de 0,50 ponto percentual na reunião de agosto daquele ano.
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E o comunicado do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central (BC) após a decisão dessa semana de não mexer nos juros não deixa dúvidas de que eles seguirão altos por mais alguns meses. O documento registra que o colegiado seguirá avaliando a manutenção desse patamar da taxa de juros “por período bastante prolongado”, até que seja suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta.
Mais que isso, enfatizou (usando essa palavra) que não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso julgue apropriado. “Entendemos que essa decisão está alinhada com a necessidade de não abrir espaço, neste momento, para interpretações que enfraqueçam a estratégia de manutenção de juros elevados por período prolongado”, apontou análise do banco Daycoval.
A taxa de juros é um instrumento de política monetária para tentar controlar a inflação. Juros mais altos “seguram” a atividade econômica, principalmente os investimentos do setor produtivo, o que ajudar a domar a subida de preços.
A meta de inflação estabelecida pelo BC para 2025 é de 3% ao ano, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor -Amplo), índice que mede a inflação oficial no país, marca 5,13% em doze meses. Aqui, uma indicação de que os juros seguirão em alta. O Boletim Focus mais recente, pesquisa semanal feita pelo BC com agentes do mercado, aponta um IPCA de 4,83% para 2025, e de 4,30% para 2026.
“O Copom vai seguir com uma taxa de juros contracionista até o Focus sinalizar melhora na inflação”, avalia o economista Andre Perfeito. “E por melhora da inflação, estou me referindo ao primeiro semestre de 2027, o horizonte relevante da política monetária”, diz. Para 2027, o Focus aponta o IPCA mais próximo da meta, a 3,90%.
Além da inflação, o Comitê considera outros indicadores econômicos para definir os juros, como mercado de trabalho, atividade econômica e câmbio. E, novamente, segue tendo motivos para sustentar o juro em patamar mais elevado.
O desemprego está no patamar mais baixo da série histórica, o que os economistas chamam de “mercado de trabalho pressionado”. Além disso, a massa salarial também está em patamares de máxima histórica. População empregada e com renda, aquece a economia, o que, por sua vez, empurra a inflação para cima.
O PIB (Produto Interno Bruto) do segundo semestre mostra uma desaceleração da atividade econômica em relação aos meses anteriores, mas ainda segue aquecida, tendo crescido 0,4% no período ante os 1,3% do primeiro trimestre. O Focus vê um PIB com alta de 2,16% para 2025 e de 1,80% em 2026.
Outra retração foi na valorização do dólar. Se no início do ano a moeda norte-americana estava no patamar de R$ 6,20, na última semana fechou a R$ 5,32. A projeção do Focus é que a divisa encerre o ano em R$ 5,50. O real mais valorizado ajuda a segurar os preços, tanto que o IPCA mensal mais recente registrou deflação de 0,40%, mas no consolidado do ano, como projeta o Focus, ainda estará fora da meta.
Em relatório, o Itaú destaca o recuo da inflação, mas reforça que a expectativa ainda é de fechar acima da meta. “As expectativas de inflação recuaram modestamente e a atividade dá sinais de desaceleração. Ainda assim, com inflação corrente e expectativas substancialmente acima da meta. E cenário externo incerto, é essencial cautela e perseverança na estratégia de manutenção de juros elevados por período prolongado, evitando cortes prematuros. Mantemos a projeção de início do ciclo de flexibilização apenas no 1T26”.
Adiciona-se ainda o grau de incertezas na economia global, principalmente pela política comercial do governo de Donald Trump, nos Estados Unidos, que pode mexer com o tabuleiro geopolítico econômico. Na cena doméstica, também há um ambiente hesitante em relação ao cenário fiscal, ou seja, das contas públicas, que pode afetar a política econômica.
Para além dos fatores econômicos, outro ponto que reforça a tendência de alta, apontado pelo colunista Guilherme Amado, do PlatôBR, é a mudança próxima de membros do Copom. Os mandatos de Renato Dias de Brito Gomes (Organização do Sistema Financeiro e Resolução) e Diogo Abry Guillen (Política Econômica) terminam em 31 de dezembro. “Um diretor em fim de mandato não tende a antecipar riscos, e quem entra provavelmente preferirá esperar para ganhar credibilidade antes de votar pela queda dos juros”, diz Lucas Farina, economista da Genial Investimentos.
Confira o comunicado do Copom na íntegra
“O ambiente externo se mantém incerto em função da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos. Consequentemente, o comportamento e a volatilidade de diferentes classes de ativos têm sido afetados, com reflexos nas condições financeiras globais. Tal cenário exige particular cautela por parte de países emergentes em ambiente marcado por tensão geopolítica.
Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica segue apresentando, conforme esperado, certa moderação no crescimento, mas o mercado de trabalho ainda mostra dinamismo. Nas divulgações mais recentes, a inflação cheia e as medidas subjacentes mantiveram-se acima da meta para a inflação.
As expectativas de inflação para 2025 e 2026 apuradas pela pesquisa Focus permanecem em valores acima da meta, situando-se em 4,8% e 4,3%, respectivamente. A projeção de inflação do Copom para o primeiro trimestre de 2027, atual horizonte relevante de política monetária, situa-se em 3,4% no cenário de referência (Tabela 1).
Os riscos para a inflação, tanto de alta quanto de baixa, seguem mais elevados do que o usual. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma desancoragem das expectativas de inflação por período mais prolongado; (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais positivo; e (iii) uma conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto inflacionário maior que o esperado, por exemplo, por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma eventual desaceleração da atividade econômica doméstica mais acentuada do que a projetada, tendo impactos sobre o cenário de inflação; (ii) uma desaceleração global mais pronunciada decorrente do choque de comércio e de um cenário de maior incerteza; e (iii) uma redução nos preços das commodities com efeitos desinflacionários.
O Comitê segue acompanhando os anúncios referentes à imposição de tarifas comerciais pelos EUA ao Brasil, e como os desenvolvimentos da política fiscal doméstica impactam a política monetária e os ativos financeiros, reforçando a postura de cautela em cenário de maior incerteza. O cenário segue sendo marcado por expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho. Para assegurar a convergência da inflação à meta em ambiente de expectativas desancoradas, exige-se uma política monetária em patamar significativamente contracionista por período bastante prolongado.
O Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 15,00% a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
O cenário atual, marcado por elevada incerteza, exige cautela na condução da política monetária. O Comitê seguirá vigilante, avaliando se a manutenção do nível corrente da taxa de juros por período bastante prolongado é suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta. O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e que não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso julgue apropriado.
Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Gabriel Muricca Galípolo (presidente), Ailton de Aquino Santos, Diogo Abry Guillen, Gilneu Francisco Astolfi Vivan, Izabela Moreira Correa, Nilton José Schneider David, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo Alves Teixeira.”