DINHEIRO ? O Balanced Scorecard tornou-se uma referência mundial no campo da gestão das empresas. Qual a razão do sucesso?
ROBERT KAPLAN ? Havia a necessidade de se criar um sistema que pudesse contabilizar aquilo que realmente gerava valor para as empresas. O mercado pedia isso. Quando inicialmente desenvolvemos e introduzimos o sistema, em 1991 ou 1992, [ao lado do amigo e professor David Norton] estabelecemos quatro perspectivas para verificar a geração de valor para uma companhia. Essas perspectivas eram do ponto de vista financeiro, do cliente, dos processos internos e do aprendizado e do crescimento. Então, ficou bastante claro que não se poderia resumir como as organizações geram valor com eficácia contando apenas com medidas financeiras. Era preciso verificar, por exemplo, se o cliente via aquela empresa de forma positiva. Ou se o respeito ambiental e os índices de inovação internos eram realmente peças importantes naquela companhia. Nós antecipamos tudo o que o mercado vê e faz hoje. Ao mesmo tempo, isso tudo não poderia ser tão complexo que não se pudesse ser colocado no papel. O trabalho que foi feito por nós se mostrou acertado, e ainda estamos usando aquelas mesmas quatro perspectivas 18 anos após o começo de tudo. A lacuna maior que existia nas empresas era a falta de capacidade de implantar as suas estratégias.
 

DINHEIRO ? Mas muitas empresas ainda derrapam nesse processo. Elas implementam estratégias que se mostram rapidamente um fracasso. Como o sr. analisa essa situação?
KAPLAN ? Olha, eu acho que precisamos analisar esse fato da seguinte forma: vencer os desafios internos para implementar uma estratégia é um modo de fazer deslanchar o processo. Isso porque aprendemos melhor como fazê-lo, e sabemos como fazer, nesse processo de erros e acertos. Se você der uma olhada no nosso próximo livro [?Execution Premium?, a ser vendido a partir de agosto, escrito em parceria com o professor David Norton], fica mais fácil entender como implementar um plano novo numa empresa. O que constatamos é o seguinte: a única parte que não podemos controlar é a que se refere à liderança. Ou seja, a capacidade de bancar, de liderar esse movimento dentro da companhia. Portanto, liderança é o ingrediente crítico. Precisamos de um líder forte, que queira realmente conduzir a organização. Pode parecer que todo mundo está apto ou quer fazer isso, mas não é verdade. Não é necessário ter uma grande estratégia, apenas uma boa estratégia. Mas é preciso ter um grande líder. É necessário direcionar a organização e ligar as pessoas a essa estratégia, conectar as operações à estratégia, estruturar o sistema diário e as reuniões de gerenciamento, e por aí vai. O desafio continua sendo a liderança e a adoção de uma boa, senão perfeita, estratégia. Agora, é claro: falar é fácil.

DINHEIRO ? No Brasil, poucas empresas utilizam o sistema. Isso tem a ver com a maturidade do mercado ou com a gestão das empresas brasileiras?
KLAPAN ? Não, realmente não acho que isso dependa das características do país, da indústria ou da cultura da empresa. É mais simples que isso: é um trabalho duro. O fato de sabermos como fazer, não significa que seja fácil fazer. Por isso, nem sempre elas usam o modelo. Isso simplesmente depende do estágio em que a empresa se encontra. E o momento mais óbvio em que você necessita de uma nova estratégia é quando surge uma crise, quando tudo o que você está fazendo, ou tenha feito no passado, não está mais funcionando. Mas o contrário disso tudo também é ruim. É duro quando você pensa que está tudo bem, mas reconhece que está na hora de fazer algo diferente. Às vezes, é necessário delegar o problema a uma liderança forte. Isso porque ela pode reconhecer que hoje as coisas estão ótimas, mas há nuvens no horizonte. E é sábio reagir mais cedo antes que a chuva nos atinja.

DINHEIRO ? Há uma séria crise no setor imobiliário dos EUA e algumas empresas no Brasil já puxaram o freio de mão, com a redução no ritmo de IPOs. Estamos reagindo ?antes que a chuva caia??
KAPLAN ? Sim, e isso requer liderança pró-ativa. Não há nada dentro da sua organização que diga: ?Temos que mudar?. O líder está sentindo o ambiente competitivo e pensa: ?É hora de procurar novas formas de abordar o mundo competitivo e ajustar nossos recursos?.

DINHEIRO ? Grandes companhias têm anunciado freqüentemente reestruturações em seus modelos de negócios. A cada troca de presidente, iniciam um ?choque de gestão?. Como o sr. vê isso isso?
KAPLAN ? Algumas delas realmente se reestruturam, outras não. Elas talvez não estejam mudando as estratégias. Elas podem apenas estar reduzindo a atuação ou se redirecionando. Talvez estejam procurando se aperfeiçoar ou reagir a um problema de curta duração. Todo o grande problema está aí. Atualmente, as empresas têm que fazer reformulações ano após ano. Mas isso não faz parte de uma estratégia coerente. É como se o paciente estivesse sangrando, e eu não tivesse a certeza se devo cortar-lhe a mão ou deixála lá… E então pondero: ?Cortarei isto e mais isto e aquilo…?. E vou cortando até não saber mais onde queria chegar. Portanto, isso pode não ser um sinal de mudança de estratégia. Mas muito pior, de ausência de estratégia.

DINHEIRO ? Como o sr. analisa os erros dos bancos norte-americanos, que acabaram concedendo empréstimos imobiliários sem os cuidados necessários para esse tipo de operação?
KAPLAN ? Eles não estão se tornando melhores. Estão apenas cometendo menos erros. Portanto, em grandes empresas como o Citibank e o Merrill Lynch estão realmente ocorrendo coisas tolas, que fazem pensar que elas estejam menos maduras. Eu acho que as companhias não estão fazendo análises de risco corretas em relação aos seus próprios projetos. Portanto, elas imaginam que tudo pode funcionar. Presumem que podem ir em frente e que tudo vai dar certo. Pensam: ?Esta é uma boa idéia, e os resultados dos últimos 12 meses nos mostram que poderemos contornar resultados inesperados?. Mas não funciona assim. Alguém tem uma idéia ambiciosa de abrir um negócio em uma nova região. Isso soa bem. Soa como crescimento. Será que alguém pergunta o que pode dar errado nesse projeto? Nem sempre. É necessário que haja alguém que desafie o outro, porque as pessoas freqüentemente têm idéias muito animadas. E algumas delas até são extraordinárias, mas há aquelas que colocam a empresa em risco.
 

DINHEIRO ? O sr. pode me dar exemplos desses tropeços?
KAPLAN ? Em muitos casos, a origem do erro é o desconhecimento do seu cliente. Vamos ser honestos. Hoje, com os bancos de armazenamento de dados e com a área de Business Inteligence, não há desculpa para esses erros.

DINHEIRO ? O sr. acha que as empresas brasileiras estão no caminho certo? KAPLAN ? De certa forma, sim, mas ainda há o que fazer. Estive falando com um colega meu que mora no Chile. Ele me contou que, anos atrás, os empresários chilenos começaram a dizer: ?Oh, meu Deus, o preço do cobre está despencando?. E ele lhes respondeu: ?Vocês estão pensando no ?agora?. Vocês têm de inventar novos projetos e mostrar novos modos de usar o cobre?. Então, aos brasileiros, eu digo o seguinte. Não pensem em si mesmos como empresários de mineração, pois a mineração será negócio perdido. Então, criem uma nova demanda para esses itens e mostrem que os seus produtos de valor agregado podem substituir outros. Assim, vocês estão feitos. É bem diferente de, simplesmente, arrancar algo do solo, colocá-lo em um barco, e acabou-se. Esta é a hora de tomar ciência de que novas empresas estarão ocupando esse mesmo espaço. E a capacidade competitiva do Brasil pode diminuir se não houver investimentos em infra- estrutura.