O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, já se prepara para formar um governo inteiramente à vontade após a vitória esmagadora de seu partido nas eleições legislativas, comemorada nesta segunda-feira pelos mercados financeiros em busca de estabilidade, mas temida pela oposição.

Contra todas as probabilidades, o Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP, islâmico-conservador) conquistou 49,4% dos votos e uma maioria absoluta de 316 dos 550 assentos no Parlamento, de acordo com os resultados finais anunciados durante a noite pelos canais de notícias locais.

Cinco meses após o revés nas eleições de 7 de junho, esta vitória é vista como uma revanche para Erdogan, cujo reinado incontestável sobre o país durante treze anos provoca cada vez mais preocupações.

Simbolicamente, o homem forte do país comemorou nesta segunda de manhã com uma oração na mesquita de Eyup, assim como faziam os novos sultões do Império Otomano.

“A vontade do povo se manifestou a favor da estabilidade (…) sempre disse ‘uma nação, uma bandeira, um país, um Estado”, declarou depois de sua visita à mesquita.

Confiante, o chefe de Estado também alertou seus críticos, incluindo aqueles da imprensa internacional, instando-os a respeitar o veredicto das urnas. “O mundo inteiro deve respeitar a vontade nacional (…) e não vi muito desse respeito”, declarou.

Sua vitória tem sido considerada de forma unânime como a expressão do desejo de estabilidade dos eleitores turcos, em um país que enfrenta desde o fim do verão a retomada do conflito curdo e a ameaça jihadista, após o atentado suicida que fez 102 mortos em Ancara há três semanas.

Ao longo de toda a campanha, o presidente e seu primeiro-ministro Ahmet Davutoglu se apresentaram como os únicos capazes de garantir a segurança e unidade do país, jogando com o medo do “caos” na ausência de uma maioria absoluta de um partido.

“As eleições mostraram o sucesso da estratégia de Erdogan, que assumiu riscos ao convocar novas eleições e que mudou sua prioridade da economia para a segurança”, resumiu nesta segunda-feira o colunista Murat Yetkin no jornal Hürriyet Daily News.

Não surpreendentemente, os investidores comemoraram nesta segunda durante a abertura das Bolsas.

A Bolsa de Valores de Istambul subiu mais de 5%, enquanto a lira turca, que tinha perdido mais de 20% de seu valor desde o início do ano, recuperou as forças em relação ao dólar e ao euro.

Mas essa recuperação pode ser de curta duração. “Resta saber se o AKP vai se esforçar para recuperar a sua credibilidade econômica”, alertou William Jackson, da Capital Economics.

A União Europeia (UE) saudou “o forte empenho do povo turco em respeitar os procedimentos democráticos” e manifestou sua disponibilidade para trabalhar com o futuro governo, incluindo sobre a questão dos migrantes.

Berlim fez o mesmo e exortou o regime a liderar o país “em um espírito de unidade e compromisso nacional”.

Mas a oposição está preocupada com este retorno de Erdogan, muito criticado por suas tendências autoritárias. “Esta é a vitória de medo”, era a manchete do jornal Cumhuriyet desta segunda-feira.

Quatro dias antes das eleições, o ataque da polícia turca, ao vivo diante das câmeras, para assumir o controle de dois canais de televisão ligados à oposição em Istambul provocou indignação em todo o mundo.

“É provável que a Turquia se torne agora ainda mais autoritária em termos de liberdade de imprensa e respeito pela lei”, disse Natalie Martin, especialista sobre a Turquia na Nottingham Trent University (Reino Unido).

Os observadores da Organização para a Segurança na Europa (OSCE) lamentaram nesta segunda o nível de violência da campanha. “A campanha foi marcada pelo medo, que é o inimigo da democracia”, ressaltou Andreas Gross, deputado suíço do Conselho da Europa.

Em seu relatório, a OSCE também criticou o campo de Erdogan por “intervenções na autonomia editoral dos meios de comunicação”.

O líder do Partido Democrático Popular (HDP, pró-curdo), Selahattin Demirtas, denunciou no domingo uma eleição “injusta”, disputada sob a ameaça jihadista, mas prometeu continuar sua luta “pelo processo de paz” entre Ancara e os rebeldes do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK).