O SORRISO FRANCO, ESPONTÂNEO, lembra o de um garoto ao ganhar a primeira bicicleta. Ou o de um empresário ao faturar seu primeiro bilhão. Aos 55 anos, José Ermírio de Moraes Neto sorri como o pai de um adolescente prodígio que acaba de conquistar o segundo bilhão. O garoto tem apenas 16 anos: é o Banco Votorantim, o empreendimento menos conhecido e mais rentável do grupo fundado em 1918 por José Ermírio de Moraes. O banco da família lucrou R$ 1 bilhão em 2006 e R$ 1,16 bilhão em 2007. E já representa 26% das receitas líquidas e 24% do lucro do conglomerado. Sem fazer muito alarde, a tradicional estirpe de industriais ? dona de um império nas áreas de metais, cimento, energia, papel e celulose ? produziu seu primeiro grande banqueiro.

José Ermírio de Moraes Neto conquistou devagar o seu lugar no seleto clube da banca nacional. Sorridente e muito gentil no trato pessoal, ele mostrou aos pares que é um concorrente sério e que não está para brincadeiras. O banco que preside saiu literalmente do nada, uma distribuidora de valores criada para gerir os recursos do grupo nos tempos da alta inflação, e em menos de duas décadas transformou- se no quarto maior banco privado nacional por ativos, atrás apenas de Bradesco, Itaú e Unibanco. No ranking geral, o Votorantim ocupa o nono lugar, à frente de casas tradicionais como Safra, Nossa Caixa, Citibank e UBS Pactual, segundo a Austin Rating. Seu crescimento tem sido vertiginoso. Nos últimos dez anos, o Votorantim cresceu quatro vezes acima da média dos dez maiores bancos. Com ativos de R$ 66 bilhões, é um fenômeno. A Votorantim Finanças, unidade de negócios que engloba banco, financeira, empresa de gestão de recursos e corretora, atua no atacado e no varejo. Ganhou relevância nacional sem comprar um único concorrente e sem abrir uma única agência bancária tradicional.

SEM FAZER AQUISIÇÕES NEM ABRIR AGÊNCIAS,
VOTORANTIM FICOU MAIOR QUE O SAFRA E O CITIBANK

Seu José Neto, como é chamado pelos funcionários, formou-se em administração de empresas na Fundação Getulio Vargas. Nunca pensou que chegaria tão longe nesse mercado. ?Por mais otimistas que tenhamos sido, conseguimos avançar muito mais do que imaginávamos?, afirma, em entrevista exclusiva à DINHEIRO. Ele sorri novamente quando perguntado sobre a notória antipatia do seu famoso tio Antônio Ermírio de Moraes pela atividade bancária. Os resultados têm sido tão vistosos que mataram qualquer discussão no comando do grupo sobre a escolha de ser ou não ser banqueiro.

O presidente do Banco Votorantim é um estrategista paciente e ambicioso. Seu escritório, em São Paulo, é decorado com documentos originais de Napoleão Bonaparte, dom João VI e dom Pedro I. Não por coincidência, José Neto exibe um balanço do Banco Mauá, escrito em caneta-tinteiro em 11 de fevereiro de 1869 pelo contador do banco do Barão de Mauá, o maior empresário do Império. Se alguém ainda duvida do apreço do banqueiro Ermírio pelas finanças, basta ver a foto dos seus filhos, na mesinha ao lado do sofá: eles seguram uma antiga revista Time, com capa sobre Alan Greenspan, recém-empossado na presidência do banco central dos Estados Unidos. ?The new Mr. Dollar?, diz a manchete. O apreço por figuras históricas tão marcantes não faz de José Neto um banqueiro personalista. As conquistas do Votorantim, insiste, são de toda a equipe. ?Aqui não tem eu. Tem nós?, prega. E quem são os outros?

Três vice-presidentes tocam o banco no dia-a-dia. O engenheiro e economista Wilson Masao Kuzuhara, que trabalha no grupo há 33 anos, cuida do negócio bancário propriamente dito. Foi o discreto Masao quem sugeriu a entrada da Votorantim na área financeira e, desde então, colocou a mão na massa. ?Somos o único banco de grupo industrial que deu certo?, afirma. Seus dois colegas no comando também são do ramo. Milton Roberto Pereira, há 28 anos no mercado financeiro, toca as áreas de back-office, recursos humanos, legislação e tecnologia da informação. E Marcos Arruda supervisiona os departamentos jurídico e de auditoria. Eles comandam a equipe de seis mil pessoas que faz o banqueiro Ermírio sorrir feito criança.

?O SER HUMANO É SHAKESPEARIANO?


A irracionalidade e a ganância movem o mercado, diz Ermírio

Além de presidir o banco da família, José Ermírio de Moraes Neto cuida doInstituto Votorantim e é conselheiro da Votorantim Participações. Ele falou à DINHEIRO:

Como surgiu o banco?
Foi idéia do Wilson (Masao) para a gente captar as vantagens fiscais. Criamos uma distribuidora em 1988, que depois se transformou em banco. Em 1992, passamos a atender outras companhias. Desde 1998, somos uma empresa financeira de serviços globais. O grupo representa menos de 10% do nosso resultado. Temos a paciência do capital privado e continuaremos a crescer de forma orgânica.

Por que cresceram tanto?
Sempre entramos nas áreas de forma competitiva. Criamos uma cultura de meritocracia. Nunca pagamos luvas para atrair talentos. Pagamos salários fixos baixos e distribuímos bônus de forma agressiva, da copeira ao vice-presidente. Só eu, que sou acionista, não recebo. Com esse modelo, eliminamos ao máximo a politicagem e trouxemos pessoas empreendedoras. O camarada trabalha 15 horas por dia, certo?

Qual foi a inspiração do modelo?
Garantia, Safra, JP Morgan. Vimos o que tinha de bom e que poderia ser adaptado ao Brasil. Muitas empresas trabalham com bônus em ações. Isso é muito complicado. O mercado fica eufórico, o cara ganha muito. Se o mercado cai, já viu. Nosso bônus é em dinheiro, conforme o valor gerado pelo negócio. É o modelo Warren Buffett. Você sabe como são os mercados, veja o que está acontecendo nessa crise do subprime.

Como os EUA chegaram a esse ponto?
Aprendemos a parte cartesiana da vida. Mas o ser humano é, por definição, shakespeariano. Como tinham bônus extraordinários com o subprime, as pessoas criavam novos produtos. A irracionalidade natural acaba gerando essa cadeia de eventos. Infelizmente, é a ganância do ser humano que move os mercados. Os sistemas de gerenciamento de riscos estão falhos. É um absurdo isso ter acontecido nos Estados Unidos, depois da bolha da internet e dos escândalos corporativos de 2001.

O dr. Antônio Ermírio sempre reclamou dos bancos. Houve discussão sobre isso na holding do grupo?
Respeitamos todas as posições pessoais. O dr. Antônio sempre fala em nome dele e sua posição deve ser respeitada. Hoje, os bancos estão fazendo cada vez mais seu papel principal, que é financiar o desenvolvimento.

O sr. gosta de ser banqueiro?
Durante 20 anos trabalhei na indústria. O banco é mais dinâmico. Aqui, os produtos mudam todo dia. Me sinto bem num ambiente com tanta inovação