23/03/2017 - 17:57
Erros imprevisíveis e aleatórios no processo de duplicação do DNA são responsáveis por cerca de dois terços das mutações celulares que causam câncer, de acordo com um novo estudo realizado por cientistas americanos e publicado nesta quinta-feira, 23, na revista Science. Tradicionalmente, as causas dessas mutações são atribuídas a dois tipos de fatores: hereditários ou ambientais.
No estudo, os cientistas utilizaram um modelo matemático para analisar sequências de DNA de 32 tipos de tumores e associaram esses resultados a dados epidemiológicos obtidos em 423 base de dados de 69 países. Eles concluíram que, na média para todos os tipos de câncer, 66% das mutações são atribuídas a erros aleatórios no processo de cópia do DNA, durante a divisão natural de células saudáveis.
“Já é bem conhecido que devemos evitar fatores ambientais como o tabagismo para reduzir nosso risco de ter câncer. Mas é preciso lembrar que cada vez que uma célula normal se divide e faz uma cópia de seu DNA para produzir duas novas células, ela comete múltiplos erros”, disse um dos autores do estudo, Cristian Tomasetti, da Universidade Johns Hopkins.
“Esses erros de duplicação são uma potente fonte de mutações tumorais que historicamente têm sido cientificamente subestimadas. Esse novo estudo fornece pela primeira vez a estimativa da quantidade de mutações que é causada por esses erros”, explicou.
Segundo outro dos líderes do estudo, Bert Vogelstein, também da Johns Hopkins, apesar das conclusões do estudo, é preciso continuar a estimular as pessoas a evitar agentes ambientais e estilos de vida que aumentem o risco de desenvolver mutações que levam ao câncer.
“No entanto, muita gente ainda desenvolverá tumores por conta desses erros aleatórios na duplicação do DNA. Por isso, precisamos com urgência de métodos melhores para detectar todos os tipos de câncer mais precocemente, enquanto eles ainda são curáveis”, afirmou Vogelstein.
O cientista explicou que, toda vez que uma célula normal se divide, ela comete vários erros – as mutações.
“Na maior parte das vezes esses erros não causam dano algum, não alteram o DNA em lugares importantes para o câncer. Mas ocasionalmente, eles ocorrem em um gene que leva ao câncer. O objetivo do estudo era tentar pela primeira vez calcular quantas dessas mutações encontradas no câncer são causadas pelo ambiente, hereditariedade, ou por um fator aleatório.”
A equipe liderada por Tomasetti e Vogelstein já havia observado, em um estudo publicado também na Science em 2015, que os erros de duplicação do DNA poderiam explicar porque nos Estados Unidos alguns tipos de tumores, como os do cólon, são mais comuns que outros, como o câncer de cérebro. A pesquisa já mostrava que há uma alta correlação entre a incidência de câncer e o número total de divisões de células saudáveis.
No novo estudo, no entanto, os cientistas utilizaram dados obtidos em todos os continentes, com o objetivo de descobrir que fração de mutações causadoras do câncer podem ser atribuídas aos erros no processo de cópia do DNA.
Acaso infeliz
Uma das conclusões é que na média de todos os tipos de tumores – independentemente das diferentes condições ambientais dos países e da genética de suas populações – cerca de 29% das mutações podem ser atribuídas a fatores ambientais, 5% a fatores hereditários e 66% a erros aleatórios nas cópias do DNA.
De acordo com os cientistas, as conclusões do novo estudo são razoavelmente coerentes com os estudos epidemiológicos, que estimam que cerca de 40% dos tumores podem ser prevenidos apenas evitando ambientes e estilos de vida pouco saudáveis.
Utilizando o modelo matemático, a equipe de Tomasetti e Vogelstein concluiu, por exemplo, que as mutações cruciais para os tumores do pâncreas são provocadas por erros aleatórios de duplicação do DNA em 77% dos casos, fatores ambientais – como o fumo – em 18% e por fatores hereditários em 5%.
Nos tumores da próstata, do cérebro ou dos ossos, mais de 95% das mutações são atribuídas a erros aleatórios de duplicação, segundo o estudo. Já no câncer de pulmão, 65% das mutações são atribuídas a fatores ambientais – especialmente o tabagismo – e 35% aos erros aleatórios de cópia do DNA. Não há notícias de fatores hereditários envolvidos com tumores no pulmão.