Um antigo provérbio escocês diz que, quando uma pessoa morre, alguns choram e outros aproveitam para vender lenços. O gargalo na infraestrutura tem sido motivo para muitas lágrimas, e os lenços para conter esse pranto só virão com muitos investimentos. Pelas contas dos economistas, até 2017 será preciso investir de R$ 1 trilhão a R$ 1,5 trilhão. Tamanho apetite por capital cria oportunidades de ouro para os investidores. “O financiamento da expansão da infraestrutura terá de passar, obrigatoriamente, pelo mercado de capitais”, diz Ricardo Mizukawa, coordenador de um grupo de trabalho específico da Anbima, associação que representa gestores de fundos e bancos de investimento.

 

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Os bancos sempre estiveram ansiosos por intermediar negócios desse tipo. A diferença, agora, é que há muito mais clientes dispostos a cacifar esses projetos. “O corte nas taxas de juros tem atraído muitos investidores e a demanda está tão forte que justifica a criação de produtos específicos”, diz José Eduardo Martins, principal executivo da gestora de recursos GPS, associada ao banco suíço Julius Baer.“O interesse também é dos estrangeiros”, afirma Gustavo Raitzin, principal executivo do Julius Baer para a América Latina. O trabalho da GPS por aqui é assessorar endinheirados, cujo capital disponível para investir supera R$ 3 milhões. 

 

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Mizukawa, da Anbima: “o financiamento da infraestrutura

passará pelo mercado de capitais”

 

Os recursos administrados são de R$ 14,5 bilhões. Ao visitar o Brasil na terça-feira 5, Raitzin notou muito interesse dos clientes em diversificar suas aplicações. Pelas contas do mercado, em 2013 devem ser emitidos R$ 220 bilhões em papéis de renda fixa, como debêntures. Desse total, pelo menos R$ 20 bilhões serão de títulos dedicados à infraestrutura. Um bom exemplo são as debêntures que serão emitidas pela Santo Antônio Energia, um consórcio entre a empreiteira Norberto Odebrecht e a estatal Furnas, criado para construir e operar a Usina de Santo Antônio no rio Madeira, em Rondônia. São papéis apetitosos para qualquer aplicador. Seus emissores estão entre as maiores empresas nacionais, ou seja, o risco de calote é baixíssimo. 

 

Financiar a construção de rodovias, portos e usinas, entre outros,

vai movimentar R$ 20 bilhões em 2013

 

Pagam inflação mais 6,2% ao ano, o que representa cerca de 170% dos juros de mercado. Tudo isso isento de Imposto de Renda. São papéis considerados excelentes, mas há particularidades que devem ser observadas. A primeira é o prazo, pois são títulos de dez anos, que vencem em 2023 e só começam a pagar juros em 2018. A segunda é o valor de R$ 100 mil por debênture. Finalmente, são títulos pouco negociados, o que dificulta a vida de quem precisar do dinheiro antes do vencimento. Essas características decorrem do destino que o dinheiro captado vai ter. Construir uma rodovia, uma usina hidrelétrica ou um aeroporto leva tempo. Há riscos, tanto durante a execução da obra quanto pelo seu retorno financeiro – um aeroporto mal localizado pode ficar anos às moscas, o que eleva muito os riscos para o investidor. 

 

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Martins (à direita) e Raitzin, da Julius Baer: queda dos juros vem elevando

a demanda por títulos vinculados à infraestrutura, que são corrigidos

pelos índices de inflação

 

“Esses títulos requerem a avaliação de um profissional especializado”, diz Joaquim Levy, diretor-geral da Bradesco Asset Management. Por isso, os bancos de investimento estão desenvolvendo fundos específicos para as aplicações em infraestrutura. Em fase final de discussão entre a Anbima e as autoridades da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Banco Central (BC), esses fundos serão formados por papéis como os da Santo Antônio Energia, por títulos ainda mais longos destinados a financiar as obras de portos e de aeroportos e também por cotas de outros fundos, que compram títulos a receber de empresas menores e menos conhecidas (leia o quadro abaixo). “Essas carteiras podem ser consideradas até um novo tipo de fundo”, diz Mizukawa. Ele não estabelece um prazo, mas o prognóstico dos profissionais do setor é que essa regulamentação esteja pronta antes do fim de abril.

 

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Cafarelli, do BB: de prontidão para lançar os novos fundos e aproveitar

o interesse dos investidores no brasil e no exterior

 

Bradesco e Banco do Brasil já preparam o lançamento desse tipo de fundos, aguardando apenas o carimbo dos reguladores. Para Paulo Rogério Caffarelli, vice-presidente do BB, o momento é propício e as empresas de infraestrutura devem buscar capital. “Na Europa existem países que remuneram apenas a inflação, por isso os estrangeiros querem nossos produtos.” No ano passado, o BB lançou um fundo imobiliário com características parecidas com as das novas carteiras em sua rede de varejo, e a demanda foi 12 vezes superior à oferta. “As debêntures têm tido grande procura”, afirma Levy, do Bradesco. “Após as novas regras serem aprovadas, os novos fundos estarão no mercado em menos de um mês.” As perspectivas são muito boas. “A captação pode ser de até R$ 10 bilhões em 2013”, diz Mizukawa.

 

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