14/03/2014 - 21:00
Quando Murilo Ferreira assumiu o comando da Vale, em maio de 2011, ele tinha um desafio duplo: reconquistar a confiança dos investidores privados sem deixar de lado os interesses do governo, que é um dos maiores acionistas da mineradora por meio dos fundos de pensão de empresas estatais. Nesses três anos, a Vale mudou radicalmente sua estratégia ao concentrar sua atuação na mineração. O resultado é que a empresa reduziu custos e vem apresentando números acima do esperado. O desempenho operacional de 2013, calculado pelo lucro antes dos juros e impostos, o chamado Ebit, foi de R$ 33,4 bilhões, mais que o dobro dos R$ 15 bilhões de 2012.
Projeto itabirito: criado em 2010, compreende usinas
no interior de Minas Gerais
Os lucros, porém, caíram para perto de zero (veja quadro ao final da reportagem). Isso quando a atividade econômica da China, o principal cliente da Vale, dá sinais de arrefecimento. No entanto, se essa combinação afetou pouco o faturamento, o mesmo não pode ser dito das ações. Desde que Ferreira chegou à presidência, os papéis acumulam uma queda de 28%, 18% somente em 2014. “O mercado está passando por um pessimismo exagerado e as ações estão sendo negociadas com preços muito descontados”, diz Victor Penna, do BB Investimentos. “A estratégia de ganhos operacionais é aprovada, mas qualquer notícia sobre a China ou os Estados Unidos causa uma fuga para ativos mais seguros e as ações sofrem.”
Cliente gigante: desaquecimento da economia chinesa e pressão para reduzir preço
do minério acendem uma luz amarela na Vale
Mesmo assim, a Vale ainda é uma das queridinhas do mercado. Todas as nove corretoras consultadas por DINHEIRO recomendam a compra da ação e seus analistas preveem bons ganhos até dezembro. No caso do BB Investimentos, a alta esperada para as ações ordinárias é de 42,1%, e de 53% para as preferenciais. O HSBC espera uma valorização ainda maior da preferencial, de 61,9%, para R$ 47. “A Vale é a nossa mineradora preferida na América Latina”, diz Rodolfo Angele, analista do JP Morgan, em relatório. Para ele, o preço-alvo das American Depositary Receipts (ADRs) é de US$ 24, o que representaria um ganho de 72,53%.
Murilo Ferreira: presidente da Vale: “A empresa está muito bem preparada
para um crescimento sólido de volume nos próximos anos
e um fluxo de caixa confortável”
“A combinação de uma história mais simples, uma gestão forte e níveis de preço interessantes fazem dela nossa principal recomendação”, explica. Marcelo Aguiar, do Goldman Sachs, também classifica a Vale como atraente. “Esperamos que as ações reajam bem aos resultados e a uma melhora da geração de caixa”, afirma, em relatório. Pessimismo mesmo só o dos analistas do Citi nos Estados Unidos. Para eles, os prognósticos de queda de preços do minério de ferro são preocupantes. Dos US$ 113 a tonelada de 2014, o Citi espera um recuo para US$ 90 por tonelada em 2015, e mais uma queda em 2016, para US$ 80.
Foco na commodity: a Vale tem concentrado esforços na produção de minério
de ferro, que deve atingir 312 milhões de toneladas em 2014
“Continuamos com uma recomendação de compra para a empresa, assumindo uma posição de observação com um olhar cuidadoso sobre a China no curto prazo”, escreveu o analista Alexander Hacking, em relatório. Por isso, o preço-alvo foi reduzido de US$ 18 para US$ 17 para as ADRs. A revisão, porém, foi o suficiente para derrubar as ações em 3,7% ao ser divulgada, no dia 7 de março. Por trás da queda dos preços do minério estão o fim dos movimentos especulativos das commodities e o esforço da China em fazer as cotações voltarem aos níveis da década de 2000, diz Rubens Sawaya, coordenador do curso de economia da PUC-SP.
“O presidente da Vale disse que isso é um efeito transitório, e eu concordo, o preço vai se manter”, diz Sawaya. “A estratégia de Ferreira é produzir minério com maior valor agregado, o que faz do produto um dos melhores do mundo em termos de qualidade”, afirma Carlos Honorato, economista da FIA. “Ferreira chegou à presidência em um momento de desconfiança do mercado, que temia novas interferências do governo, mas ele provou que, apesar da proximidade com o governo, a gestão da Vale tem sido profissional e independente”, acrescenta. Isso mostra que os objetivos de Ferreira de reconquistar a confiança do governo e do mercado foram alcançados. Agora, só falta as ações refletirem isso.