16/11/2005 - 8:00
DINHEIRO ? Qual a avaliação que o senhor faz da oferta de ações da Nossa Caixa?
CARLOS EDUARDO MONTEIRO ? O balanço é positivo. Estava otimista desde o começo. No dia do lançamento até apostei que o preço de fechamento da ação ficaria em R$ 36. Fechou em R$ 36,45. Foi uma operação muito boa, com um mercado favorável e a Nossa Caixa tinha uma bela história para contar.
DINHEIRO ? Quanto foi captado?
MONTEIRO ? Lançamos um total de 26,7 milhões de ações, ao preço total de
R$ 829,5 milhões. Entretanto, o governo de São Paulo ainda pode oferecer ao mercado mais 15% de ações sobre o lote inicial, o chamado green shoe. Se houver esse exercício, dará R$ 953 milhões, correspondente a um total de 28,7% das ações do banco.
DINHEIRO ? Onde serão aplicados esses R$ 953 milhões?
MONTEIRO ? Esse dinheiro vai para o Estado de São Paulo, que era o dono das ações vendidas. Não vem para o banco, que continua com o mesmo capital. Só que agora, além do Estado, temos os investidores privados.
DINHEIRO ? O que muda na gestão da Nossa Caixa uma vez que pelo menos 25% do capital foi para as mãos de investidores privados?
MONTEIRO ? O fato de sermos a primeira e única instituição financeira a entrar no chamado Novo Mercado da Bovespa implica uma série de regras de governança corporativa e de transparência. Isso será fundamental para a sobrevivência do banco a longo prazo. A partir de agora, deveremos assegurar a participação, a fiscalização, a vigilância e os interesses dos acionistas minoritários. O banco muda porque cada vez mais teremos de dar mais satisfação ao acionista e termos a administração voltada a resultados.
Independente: “Não há interferência do governador Geraldo Alckmin no banco”
DINHEIRO ? Por que a Nossa Caixa optou por lançar ações no Novo Mercado?
MONTEIRO ? O Novo Mercado é importante para qualquer banco. Já tínhamos condições favoráveis. Uma delas é o fato de não termos ações preferenciais, só ordinárias (com direito a voto). O segundo ponto é ter pelo menos 25% das ações em poder do público. Por fim, as ações negociadas no Novo Mercado têm atingido um patamar de valor melhor que as outras. No futuro, a pergunta será por que determinada companhia não está no Novo Mercado. Hoje são 16 empresas listadas, sendo duas estatais paulistas, a Nossa Caixa e a Sabesp. A tendência é que mais empresas entrem nesse grupo. Nós, inclusive, aceitamos a arbitragem para a solução de conflitos de natureza societária.
DINHEIRO ? Como convencer o investidor a aplicar num banco estatal em face das possíveis instabilidades provocadas por um ano eleitoral que se aproxima?
MONTEIRO ? Esse cenário eleitoral já existia na cabeça dos investidores antes de lançarmos as ações. Mas nós os convencemos de que o banco tem uma bela história, que projeta uma boa trajetória. O fato de estar no Novo Mercado, de oferecer tag along, isto é, se o Estado de São Paulo for vender o controle do banco, o investidor privado tem os seus direitos assegurados, são vantagens muito grandes. Além disso, o banco tem blindagem máxima contra ingerência política negativa. Nesse ponto, o banco está bem melhor hoje do que no passado.
DINHEIRO ? Mas o risco de uma interferência política sempre existe em um banco estatal, não?
MONTEIRO ? Essa interferência política é muito mais difícil agora que o banco tem capital aberto. Temos um Comitê de Auditoria atuante. Dos dez membros do Conselho de Administração do banco, cinco são independentes. Além disso, a supervisão do Banco Central sobre os bancos estaduais melhorou bastante em relação ao passado. Hoje é mais difícil haver interferência política nos bancos estaduais. Além disso, a Nossa Caixa tem zero de interferência política. O governador Geraldo Alckmin faz questão que seja assim. Não há interferência do governador no banco.
“A conta da Prefeitura de São Paulo teve um preço alto, que não pagaríamos”
DINHEIRO ? O que muda na estratégia da Nossa Caixa após a abertura do capital? O banco vai expandir a sua rede?
MONTEIRO ? O banco tem uma estratégia clara, definida em 2004, cujo foco é o estado de São Paulo. Não pensamos em ampliar a sua área de atuação para outros estados. Estamos em todos os 645 municípios do estado, seja com agências ou com correspondentes bancários. E temos sete agências fora de São Paulo, incluindo uma em Brasília. Mas isso não significa uma política de expansão.
DINHEIRO ? Em maio deste ano a Nossa Caixa vendeu 51% da sua subsidiária de seguros e previdência para o grupo espanhol Mapfre. O que mudou no banco com a chegada de um parceiro financeiro privado e estrangeiro?
MONTEIRO ? Decidimos que o que fizer parte do negócio bancário ficará inteiramente com a gente. Isso inclui as operações de crédito, a financeira, a distribuição de títulos e de valores mobiliários. O que for produto de balcão será alvo de parcerias ou mesmo de venda, como fizemos com a área de seguros e previdência. Dessa forma, venderemos produtos de terceiros, que trazem a sua experiência. Devemos fazer a mesma coisa com capitalização e ainda estamos estudando se repetiremos a fórmula para outros ramos de seguros, como residencial e automóveis.
DINHEIRO ? As vendas de produtos de seguro e previdência aumentaram desde a chegada da Mapfre?
MONTEIRO ? A chegada da Mapfre ainda é recente. Entre a compra, em maio, e a aprovação pela Susep (Superintendência de Seguros Privados), passou pouco tempo. Mas a expectativa é muito boa. Até porque o leque de produtos é maior hoje. Em termos de previdência, eles continuam a oferecer PGBL e VGBL, que já tínhamos. Mas eles têm mais alternativas de seguros de vida.
DINHEIRO ? Que subsidiárias devem ser vendidas?
MONTEIRO ? Uma delas é a capitalização. A empresa já está constituída, mas ainda não opera. Ainda estamos decidindo se vendemos o controle da companhia ou se firmamos um contrato de parceria com alguma empresa para vender produtos. A solução virá em 2006.
DINHEIRO ? Além da capitalização, quais os planos da Nossa Caixa para os outros segmentos bancários?
MONTEIRO ? Montamos uma empresa de administração de cartões de crédito, mas resolvemos fazer os cartões dentro de casa, como todos os nossos concorrentes fazem. No ramo de seguros elementares ? como habitacional, automotivo e rural ? ainda vamos decidir o que fazer. No caso dos consórcio, não temos autorização legislativa para constituir a empresa. Provavelmente, faremos uma parceria para vender produtos de terceiros na rede. Ainda não temos uma Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários. Pretendemos criar uma DTVM no ano que vem para aumentar um pouco o nosso leque de atuação.
DINHEIRO ? Os aumentos nos índices de inadimplência preocupam o banco, que tem forte atuação no crédito consignado?
MONTEIRO ? Uma parcela muito grande do nosso crédito consignado é de servidor público estadual. Por isso, nosso índice de inadimplência é baixíssimo. Se existe realmente essa bolha de inadimplência no crédito consignado, não é o nosso caso.
DINHEIRO ? Tem havido muita competição pelos funcionários públicos. Um exemplo é a disputa entre Itaú, Santander-Banespa e Bradesco pela Prefeitura de São Paulo. A Nossa Caixa vai entrar nessa briga?
MONTEIRO ? Entramos em várias disputas. Só neste ano já conquistamos 70 prefeituras no Estado. A Prefeitura de São Paulo, na nossa avaliação, teve um preço alto demais (Nota da Redação: o Itaú pagou R$ 510 milhões pela conta-salário dos funcionários públicos paulistanos), que nós não pagaríamos.
DINHEIRO ? Com a sinalização pelo Copom de uma queda gradual na taxa de juros, quais as aplicações que deverão ganhar força daqui para frente?
MONTEIRO ? Esse é um ponto que sempre nos questionam, porque temos uma carteira de títulos públicos bastante grande. A trajetória dos últimos quatro anos mostra que a nossa carteira de crédito cresce mais do que o decréscimo da taxa de juros. E, daqui para frente, projetamos um crescimento ainda maior da nossa carteira de crédito em comparação com a queda da taxa de juros. Portanto, vamos fazer essa transição com muita facilidade. Sobre as aplicações que devem evoluir, ainda há um espaço bem grande para crédito pessoal. Com a queda dos juros e o aumento da população bancarizada, os empréstimos tendem a ficar mais atraentes.
DINHEIRO ? São essas operações de crédito que já estão puxando para cima o resultado da Nossa Caixa?
MONTEIRO ? Sim. Nosso lucro de R$ 379,5 milhões registrado no primeiro semestre foi recorde. A carteira de crédito cresceu 27,8% no período, o terceiro maior crescimento de todo o sistema financeiro nacional. Temos um cenário muito bom pela frente.
DINHEIRO ? Que fatores tornam as ações da Nossa Caixa atraentes para os investidores, que levaram o papel a uma alta de 17,6% no dia do lançamento?
MONTEIRO ? Hoje está subindo de novo. Vamos ver em quanto está? (Monteiro deixa a sala onde dava a entrevista para checar a cotação da ação no seu computador e volta sorridente). Agora (tarde do dia 31 de outubro) está em R$ 37,05, alta de 1,65% em relação a sexta-feira. São vários os fatores que atraem os investidores. Primeiro, entramos no Novo Mercado. Depois, todo o cenário atual é bom. Vale lembrar que tem pouquíssimas ações de bancos na Bovespa. E esse é um setor que tem apresentado bons resultados. Somos uma noiva bem atraente.
DINHEIRO ? O que mudou na vida do senhor desde o lançamento das ações? Está se tornando um escravo do mercado, olhando a cotação toda hora?
MONTEIRO ? Não (risos). O que existe é uma certa curiosidade em saber quanto está o preço da ação. Mas não dá para virar um escravo do mercado. Se ficar acompanhando a cotação o dia inteiro, ninguém trabalha, não se faz mais nada. E assim não dá. Vamos continuar a fazer o nosso trabalho, mantendo o foco do banco, que é ser forte no Estado de São Paulo, e gerando valor para os acionistas. Só que agora, como ganhamos mais acionistas, a responsabilidade aumenta.