Pedro Malan, um dos ministros da Fazenda mais longevos do Brasil, poucas vezes esteve tão preocupado. “Estamos num ponto de inflexão, numa encruzilhada que é das mais importantes que tivemos na nossa história recente”, diz o economista, que comandou a equipe econômica de Fernando Henrique Cardoso por oito anos. A inquietude recai sobre as eleições e o debate em relação aos problemas enfrentados pelo País. “O que eu sinto falta é de percepção do quadro geral”, afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo.

Segundo ele, a poucas semanas das eleições, há o desafio urgente de reduzir o “enorme grau de incompreensão” de parte expressiva da população sobre o problema fiscal. “Sem conseguir equacionar o crescente desequilíbrio das contas públicas no governo federal e nos Estados, não se conseguirá avançar na agenda do desenvolvimento econômico e social”, afirma. “Estamos num curso absolutamente insustentável.”

Aos 75 anos, Malan, que também presidiu o Banco Central na implementação do Plano Real e foi negociador da dívida externa no início dos anos 1990, resolveu contribuir com o debate público. A forma? Um livro.

Uma certa ideia de Brasil: Entre passado e futuro, que será lançado na próxima semana, reúne colunas publicadas nas páginas do jornal O Estado de S. Paulo de 2003, ano da chegada do PT ao poder, até maio deste ano.

“Espero que quem quer que seja eleito tenha consciência do que foram os últimos 15 anos, porque será o maior desafio de sua vida dada a situação do País”, diz Malan. “Disputar a eleição e eventualmente ganhá-la é uma coisa. Governar um país da complexidade do Brasil é algo muito mais complicado.”

No prefácio, Malan explora a ideia de que há necessidade de perspectiva que vá “além da conjuntura” e de ver a história como “infindável diálogo entre passado e futuro”. “Minha visão é da importância da consciência social do passado. Cada geração está sempre revisitando o passado, reinterpretando-o e, às vezes reescrevendo-o à luz das exigências do presente, que sempre coloca algumas perguntas-chave e depois de seus sonhos, desejos e expectativas sobre o futuro.”

Por seus artigos, organizados de forma cronológica ao leitor, é possível acompanhar a visão de Malan sobre o desenrolar dos governos de Lula e Dilma. Segundo o ex-ministro, o Brasil experimentou momentos decisivos e grandes inflexões no período.

Um deles foi a queda, em 2006, de Antonio Palocci, que o sucedeu na Fazenda, e o desmantelamento daquela equipe econômica, que contou com nomes como Murilo Portugal, Joaquim Levy e Marcos Lisboa. Com a saída deles, triunfou a visão do PT de que o Estado deveria se agigantar para acelerar o crescimento da economia.

A defesa do legado do governo Fernando Henrique Cardoso, com o alcance da estabilidade monetária e o controle da inflação, intensifica-se em seus artigos com o passar dos anos conforme aumenta, na percepção de Malan, o discurso petista de que a prosperidade econômica decorria somente de medidas tomadas por Lula.

Lembrar-se dos avanços obtidos em seus anos e da importância dessas conquistas é algo necessário ainda hoje, diz. “Ficamos com essa reputação de ter ideia fixa com o controle da inflação, com a visão fiscalista. A preocupação é com criar as condições macroeconômicas para que o País possa enfrentar seus verdadeiros desafios que estão na área de educação, saúde, segurança, meio ambiente”, afirma.

Segundo o ex-ministro, é preciso que se discuta de forma transparente como resolver a questão fiscal, sem descartar de antemão um aumento temporário de impostos, sob o risco de punir futuras gerações. “Não tem muito como inventar. Ou a conta vem na forma de tributação sobre a geração atual ou na forma de endividamento, que é o que Gustavo Franco (ex-presidente do BC) chama de tributação dos ausentes”, escreve.

O livro de Malan chega às livrarias no início de uma das disputas eleitorais mais incertas das últimas décadas. Ele acredita, contudo, que a visão fiscalmente responsável prevalecerá ao fim. “Acho que 2018 foi uma espécie de final de ciclo, até por isso resolvi publicar agora. É o fim de um ciclo do lulopetismo e do dilmismo na área econômica, seguramente. Talvez também na área política.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.