A ópera é um gênero musical único, uma história contada com cores e emoções fortes, por meio de canto sofisticado, interpretações marcantes e poesia. Envolve os espectadores de uma forma arrebatadora desde o século 16, quando surge em Florença, na Itália. A primeira ópera, chamada Dafne, conta a triste história de Apolo, que desafia o pequeno Cupido e vê recaindo sobre si uma maldição que o persegue desde então. Além da reflexão sobre o que podemos fazer, mas não necessariamente devemos fazer, quero convidar a atenta leitora, o interessado leitor a analisar a forma, mais do que o conteúdo: uma ópera não é a música, nem a interpretação, a cenografia ou a iluminação, mas é uma fusão harmoniosa de tudo isso e ainda mais. Sobrevive há mais de 400 anos porque é uma construção sólida, alicerçada profundamente na humanidade dos que a concebem, interpretam e assistem.

Resta pouca dúvida que a IA impõe uma ameaça séria ao futuro da nossa carreira, mas assim como ocorre com uma ópera, nossa atuação profissional não se resume ao que fazemos, à nossa profissão, mas sim ao conjunto das nossas competências, habilidades e atitudes frente ao que deve ser feito. Importa (cada vez mais!) como nos integramos com aqueles que produzem conosco (fornecedores e colegas), como nossos produtos e serviços agem sobre o mundo durante e após o seu uso e como nos diferenciamos dos concorrentes de forma sustentável e lucrativa.

“O futuro não será do homem contra a máquina, mas sim do homem ou mulher íntegros e com máquina contra aqueles sem máquina. Ser eficiente na era do conhecimento significa ter tempo e energia para aportar valor de novas maneiras, para clientes novos e antigos, para a empresa e seus sócios”

Defendemos nossa posição da IA entendendo e nos apoiando nas características que nos tornam humanos: conexão, compaixão, responsabilidade, disciplina, flexibilidade, tenacidade, perspicácia, esperança, dentre tantas outras… O futuro não será do homem contra a máquina, mas sim do homem ou mulher íntegros e com máquina contra aqueles sem máquina. O nosso constante reaparelhamento em disciplinas-chave (IA, estatística, storytelling, liderança, gestão da mudança, design thinking) precisa estar continuamente na ponta do seu mouse. O desafio daqueles engajados com o seu próprio desenvolvimento técnico não está na disponibilidade do conteúdo em si, mas exatamente no oposto — no excesso de oferta! Os profissionais mais experientes são curadores sofisticados do conteúdo que consomem — têm meios eficientes de identificar quais livros, cursos, artigos valem o seu empenho de tempo e energia. O seu trabalho estará razoavelmente protegido na medida em que se integrar a ele a busca sistemática por formas inovadoras de se conectar e servir ­— não temos mais o luxo de fazer a mesma coisa por muito tempo!

Exercite fazer novas perguntas, amplie suas competências técnicas e dê foco para a construção contínua de conexões mutuamente benéficas, incorporando IA em tudo que puder ser automatizado (e a lista do que pode ser automatizado cresce a cada dia). Ser eficiente na era do conhecimento significa ter tempo e energia para aportar valor de novas maneiras, para clientes novos e antigos, para a empresa e seus sócios. As melhores também têm fôlego para ativamente se engajar em ações e projetos que buscam tornar mais justa a sociedade que se serve.

Humanos jamais serão automatizados, tarefas sim. A ópera continua!

Luís Guedes é professor da FIA Business School