10/01/2019 - 10:40
O ex-prefeito de Ferraz de Vasconcelos (2013/dezembro 2015), Acir Filló (PSDB), acusa seu antecessor, Jorge Abissamra (PSB), de montar uma “quadrilha” para fraudar licitações e pagar propinas a pelo menos 18 vereadores e ex-vereadores da cidade nos últimos treze anos. Ele acusa, ainda, seu sucessor, que foi seu vice, José Izidro Neto (MDB), e o atual prefeito de Ferraz, José Carlos Chacon (PRB), o “Zé Biruta”, de supostamente perpetuarem um esquema de corrupção na cidade com cerca de 170 mil habitantes situada na Grande São Paulo.
Filló foi preso em abril de 2017 após investigações do Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do Ministério Público, apontarem licitações irregulares que teriam lesado os cofres públicos em pelo menos R$ 15 milhões. Ele está recolhido na Penitenciária de Tremembé, no interior paulista.
Em outubro de 2017, o tucano pediu para fechar acordo de delação premiada e relatou, sob sigilo, esquemas envolvendo contratos da prefeitura.
Os relatos de Filló preenchem 16 anexos sobre contratos que envolvem licitações para aquisição de pães, merendas, cestas básicas, além de prestação de serviços de coleta de lixo e execução de obras municipais com verbas do Fundo Metropolitano de Financiamento e Investimento (Fumefi).
A negociação para delação do tucano, no entanto, foi arquivada em setembro de 2018 pelo procurador de Justiça João Antonio Bastos Garreta Prats, até que Filló apresente provas de suas acusações.
“Houve interesse inicial por parte da Procuradoria-Geral de Justiça em fazer tratativas com o interessado”, anotou Garreta, em parecer. “Ocorre que, apesar de instado a indicar provas e a apontar o montante que seria devolvido aos cofres públicos, nenhuma prova material foi apresentada e nenhum valor foi indicado.”
Filló também citou o deputado estadual Gilmaci Santos (PRB), líder do PRB na Assembleia Legislativa de São Paulo, acusando o parlamentar de supostas fraudes em certames e adjudicações da prefeitura de Ferraz. Essa parte da investigação também foi arquivada pelo procurador de Justiça-coordenador Cícero José de Morais por considerar as imputações “genéricas e insustentáveis”.
O ex-prefeito Jorge Abissamra, citado por Filló, foi preso pela Polícia Civil em novembro de 2017 após denúncia da Promotoria de Ferraz por supostas fraudes em processos licitatórios durante sua gestão (2005-2012). Em fevereiro do ano passado, a 3ª Vara de Ferraz deu liberdade provisória a Abissamra.
“Nos oito anos da gestão de (Jorge) Abissamra, a Prefeitura de Ferraz de Vasconcelos foi literalmente saqueada por uma quadrilha liderada pelo então prefeito”, afirma Filló. Segundo ele, ao assumir o cargo, em janeiro de 2013, “herdou” o quadro de funcionários, que havia saltado de 900 para 4 mil, e se tornou “refém” do suposto esquema criminoso.
Filló afirma que os contratos foram assinados por Abissamra e perpetuados pela sua gestão (2013-2015), a de seu vice, José Izidro Neto (PMDB) e do atual prefeito, José Carlos Chacon (PRB), o “Zé Biruta”.
O ex-prefeito afirma que quase 20 vereadores teriam participado do esquema fraudulento e recebido propinas que variam de R$ 200 mil a R$ 400 mil durante os últimos anos.
Um contrato envolve uma empresa responsável por auxílio em transporte terrestre. De acordo com o Filló, os acordos eram fraudulentos e tinham sido “herdados obrigatoriamente” pela administração.
“Afirmo peremptoriamente que todos os contratos/licitações foram fraudados também na minha gestão, gerando propinas para mim, para o vice-prefeito, para todos os vereadores e outros agentes políticos”, confessa Filló, em sua proposta para acordo de delação.
O tucano diz que, apesar de ter deixado a gestão municipal, Abissamra continuou a exigir pagamento de propinas de R$ 20 mil da empresa. Os montantes seriam entregues na sede e no estacionamento da prefeitura.
Acir Filló admitiu que, com o dinheiro das propinas, adquiriu imóveis em nome da empresa Jovi Empreendimentos Imobiliários. Ao todo, teriam sido três casas em Ferraz de Vasconcelos, estimadas em mais de R$ 1 milhão, uma casa em Guarulhos, também na Grande SP, avaliada em R$ 1,25 milhão e um terreno em Ferraz de Vasconcelos no valor de R$ 250 mil.
“Os proprietários das empresas [supostamente envolvidas nos esquemas fraudulentos], reiteradas vezes, afirmaram para mim que Abissamra exigia propinas sob ameaças de denunciar/perseguir os empresários trazidos por ele para Ferraz de Vasconcelos”, diz Filló.
Vereadores
O ex-prefeito afirma que o esquema de propinas formado na administração municipal contava com a participação de pelo menos 18 vereadores, que receberam entre R$ 200 mil a R$ 400 mil durante os últimos anos.
O dinheiro seria entregue pelas empresas beneficiadas ao próprio Acir Filló e ao então secretário de Cultura, Edson Pascoto, que “redistribuía o montante aos políticos em suas residências, locais públicos e até na sede da Prefeitura”.
De acordo com Acir Filló, os beneficiados foram:
– Luiz Fábio Alves da Silva (MDB), vereador e ex-presidente da Câmara Municipal (2013-2016) – R$ 20 mil por 30 meses entre 2013 e 2015. Total: R$ 600 mil.
– Roberto Antunes de Souza (SD), ex-vereador – R$ 20 mil por 30 meses. Total: R$ 600 mil.
– Juracy Ferreira da Silva (PMDB), ex-vereador e ex-secretário municipal de Saúde e de Governo (2013-2016)- R$ 20 mil por 30 meses. Total: R$ 600 mil.
– Ana Acilda Alves da Silvan (PV), ex-vereadora – R$ 20 mil por 24 meses. Total: R$ 480 mil.
– Marcos Antonio Castelo (SD), vereador – R$ 20 mil por 30 meses. Total: R$ 600 mil.
– Clenilson Lima Dias (PSDB), ex-vereador – R$ 15 mil por 30 meses. Total: R$ 450 mil.
– Aurélio Alegrete (PPS), ex-vereador – R$ 15 mil por 30 meses. Total: R$ 450 mil.
– Maria Simplício (PT), ex-vereadora – R$ 7 mil por mês recebidos pelo marido e ex-vereador Aparecido Marabraz por 30 meses. Total: R$ 210 mil.
– Antonio Carlos Correa (PSD), ex-vereador – R$10 mil por 14 meses. Depois que virou oposição ao governo, deixou de receber os valores. Total: R$ 140 mil.
– Claudio Ramos (PT), vereador – R$ 10 mil em pagamentos “esporádicos”, totalizando 15 meses. Total: R$ 150 mil.
– José Nelson Ferreira (PRB), vereador – R$ 7 mil por 30 meses. Total: R$ 210 mil.
– Walter Marsal Rosa (PTB), ex-vereador – R$ 7 mil por 30 meses. Total: R$ 210 mil.
– Cicero do Gás (PTB), ex-vereador – R$ 7 mil por 30 meses. Total: R$ 210 mil.
– Flávio de Albuquerque Castilho (PSC), ex-vereador – R$ 7 mil por 30 meses. Total: R$ 210 mil.
– Edson Elias Khouri (PSB), ex-vereador – R$ 10 mil por apenas quatro meses, pois era da oposição. Total: R$ 40 mil.
– Henrique Marques, ex-vereador falecido em 2017 – R$ 7 mil por 30 meses. Total: R$ 210 mil.
– Willians Santos(PTB), ex-vereador – R$ 15 mil por 20 meses. Total: R$ 300 mil.
– Renato Ramos de Souza (PPS), vereador – R$ 8 mil em pagamentos mensais por 24 meses para atividades políticas, contratações de assessores e outros gastos “eleitorais” visando a eleição de 2016 a qual se elegeu vereador – R$ 192 mil.
Salmo 23
Acir Filló também delatou o processo licitatório da Salmo 23, empresa contratada para prestar serviços de informática à Prefeitura de Ferraz de Vasconcelos. A irregularidade motivou investigação do Ministério Público e a prisão do tucano em abril do ano passado.
De acordo com o delator, o esquema de dispensa de licitação que favoreceu a Salmo 23 era irregular e ele tinha consciência disso, mas os procedimentos “não geraram dividendos financeiros” por se tratar de valores “irrisórios”.
“As ilegalidades nesses procedimentos tiveram o único objetivo de ajudar, favorecer um pequeno empresário simpatizante de nossa campanha eleitoral”, afirmou Filló.
Defesas
A Prefeitura de Ferraz se manifestou sobre o caso: “com relação à demanda da solicitação desse órgão de imprensa a Administração Municipal não tem nada a manifestar diante de uma Delação arquivada pelo Ministério Público por falta de provas”.
“Vale ressaltar que, o Governo Municipal pauta pela transparência nos atos da administração sendo que em recente publicação do Ministério da Transparência CGU Ferraz de Vasconcelos ficou na posição de 97 entre todos os municípios do Estado de São Paulo em divulgar em tempo real seus atos no portal da transparência, isso mostra a seriedade no trato da coisa pública”.
Procurada pela reportagem, a Câmara Municipal de Ferraz de Vasconcelos divulgou nota. “Em resposta ao questionamento, em nome do seu presidente, Agílio Nicolas Ribeiro David (PSB), a Câmara Municipal de Ferraz de Vasconcelos tem a informar que até a presente data desconhece por completo a existência de acusações contra vereadores ou ex-parlamentares da Casa e muito menos a respeito do teor da delação do ex-prefeito, Acir Filló. Além disso, acrescenta esse Poder Legislativo que em nenhum momento fora comunicado oficialmente por qualquer órgão do Poder Judiciário paulista sobre o assunto. Por fim, a Câmara Municipal continua a inteira disposição para futuros pedidos de informação por esse conceituado veículo de comunicação, assim como, para o restante da mídia em geral”.
O ex-prefeito José Izidro Neto disse: “fui funcionário público de carreira há trinta anos e então foi vereador por 16 anos, três anos como vice-prefeito e um ano como prefeito. Eu não respondo a nenhum inquérito policial. Eu sempre procurei trabalhar com respeito e tenho muito temor à Deus e não tenho nenhum problema com a Justiça. As alegações do Filló são ações desesperadas da parte dele para diminuir sua pena, como estamos acompanhando em casos nacionais, como o ex-ministro Antônio Palocci, para conseguir algum benefício da Justiça. Eu acredito na Justiça de Deus e na Justiça do Estado de São Paulo que deve apurar tudo direitinho. Se ele eventualmente estiver falando alguma coisa que fizer algum sentido, tenho certeza que a Justiça irá apurar. E as pessoas que ele apontar, se tiver alguma culpa, terão de responder. Eu estou muito tranquilo com o período em que fiquei na Prefeitura, eu tinha uma procuradoria que acompanhou as obras que fiz. Então, estou muito tranquilo em relação a isso e não tenho preocupação.”
O ex-prefeito Jorge Abissamra, declarou que apenas se posicionará sobre o caso pessoalmente.
Segundo assessoria de imprensa, o deputado estadual Gilmaci Santos não se pronunciará sobre o caso e diz que o despacho do Ministério Público pelo arquivamento da representação e da delação fala por si só.
A reportagem busca contato com a defesa de todos os citados. O espaço está aberto para manifestações.