26/10/2001 - 8:00
A equipe de operadores mais temida do mercado brasileiro pode mudar de chefe na virada do próximo ano. Os sócios brasileiros que fizeram a fama de mau do CSFB Garantia, e que já faziam isso pelo banco quando o Crédit Suisse ainda não havia chegado e o controle pertencia a Jorge Paulo Lemann, estarão livres para deixar a instituição em dezembro. Um pacote de bônus milionários prendia os sete sócios remanescentes ao banco, mas chegou ao fim em agosto e foi estendido em comum acordo apenas até o fim do ano. Depois disso, estão todos livres para voar. Eric Hime e Fernando Prado, que detêm as maiores participações e são os líderes naturais do grupo, já começaram a se movimentar. Seu destino, porém, pode acabar sendo dentro da própria casa. De um leque de alternativas que começaram a analisar, a que mais agrada a esse grupo de sócios é nada menos que recomprar a parte do banco pertencente aos suíços, que são majoritários, para então assumir o controle da instituição e fazer renascer a marca Garantia. As primeiras sondagens já foram feitas junto ao Crédit Suisse e os executivos europeus se mostraram abertos a negociações. As conversas preliminares correm em sigilo completo.
O argumento mais forte que Hime e Prado têm a apresentar para os suíços, em defesa de sua proposta de compra, é que se eles e sua turma forem embora, o banco perde valor. O Crédit Suisse pagou pouco mais de US$ 400 milhões pelo Garantia há três anos justamente para ter sob sua bandeira a equipe conhecida como a mais agressiva do País. Não há outro ativo que justifique o preço. Na época da aquisição, o banco vinha de tomar um tombo de quase US$ 100 milhões, com a crise da Ásia, mas, depois de comprado, teve desempenho à altura da fama que carregava. As metas de rentabilidade fixadas pelos suíços para três anos, em dólares, foram batidas logo nos dois primeiros. Nova meta foi estabelecida para o terceiro ano, completado em agosto, e novamente ela foi superada.
Cumpridas as metas, um grupo de cem funcionários do banco ganharia passe livre em agosto passado e teria direito a um prêmio de US$ 325 milhões. O dinheiro ficou para ser pago em janeiro, devido ao prolongamento do compromisso de permanência dos sócios no banco, e por isso deverá vir ainda mais gordo. A parte do leão fica mesmo para Hime e Prado, que comandam as mesas de operações, além de Luiz Alberto Rodrigues, o ?Careca?, e José Ricardo de Paulo, o Ricardinho. Junto com essa bolada, eles receberão ainda o bônus regular de fim de ano, relativo ao desempenho do banco em 2001. O pacote completo vai dar a cada um deles um rendimento maior até do que o dos executivos suíços que, no papel, chefiam o banco. Constrangimento que não ajudaria em nada no já difícil ambiente da instituição. Os suíços não têm pressa em vender, já que o CSFB Garantia até agora sempre deu dinheiro, mas não têm porque recusar conversas. A fase no grupo é mesmo de redução de riscos, contenção de despesas e mudança de estilo. O executivo-chefe, John Mack, chegou em julho do Morgan Stanley, onde prevalece a cultura de equipes, e abriu guerra à ostentação e ao estrelismo que costumavam marcar o CS First Boston. A meta é de cortar US$ 1 bilhão dos custos anuais. Já conseguiu façanhas como convencer um grupo de executivos a aceitar redução de US$ 75 milhões em seus pagamentos deste ano. Tirou o grupo de negócios em que era grande, mas tinha pouco lucro, como o mercado de ouro. Demitiu 2 mil operadores e levou as ordens de contenção de despesas ainda mais longe, determinando cortes até em gastos prosaicos como os de confecção de placas comemorativas de negócios fechados pelo banco. Cortou 400 carros de diretores e tirou o transporte para quem começa a trabalhar antes de 6 horas da manhã. Mesmo assim, o banco perdeu dinheiro no trimestre, o que não acontecia desde 1997. Para completar, a holding teve classificação de risco rebaixada devido a perdas com empresas como Swissair e Swiss Life.
Nada disso combina com o estilo dominante no brasileiríssimo CSFB Garantia. Hime, Prado e seus sócios, se não quiserem se enquadrar, têm ainda a opção de sair para montar negócio próprio. Ir para outro banco não podem, porque o contrato de venda do Garantia aos suíços já proibia esse tipo de troca de lado. Pelo mesmo motivo, também não podem abrir instituição financeira própria. A alternativa mais à mão é a de abrirem companhias de investimento ou de simplesmente mudarem de vida, uma vez que todos acumularam fortunas pessoais no banco. Hime, o que ganhou mais fama no mercado, têm brinquedos como um jato de US$ 20 milhões, uma mansão em Angra dos Reis de US$ 1,5 milhão e duas Ferraris, cada um de um modelo. Continuar no CSFB Garantia é ainda uma opção confortável para todos, já que o poderio do Crédit Suisse garante a eles acesso a dinheiro barato para bancar suas apostas no mercado, mas só fará sentido se eles conseguirem preservar o padrão de remuneração e independência a que estão acostumados. Caso contrário, o divórcio pode estar próximo.