O comentário publicado no Instagram por um dos fundadores e CEO da G4 Educação, Tallis Gomes, em que ele diz “Deus me livre de mulher CEO”, provocou uma série de reações de executivas nas redes sociais, especialmente no LinkedIn. Por meio de posts, as executivas criticaram a fala de Gomes e reforçaram o orgulho de serem mulheres nos postos que ocupam. Para Gomes, mulheres que presidem empresas não fazem o “melhor uso da energia feminina”.

A presidente do Banco do Brasil, Tarciana Medeiros, fez menção indireta ao caso durante palestra em Nova York, na quinta-feira, em evento do Pacto Global da ONU. A mediadora, Ana Fontes, da Rede Mulher Empreendedora, abriu o debate questionando se estava “tudo bem ser uma mulher CEO à frente de um banco”. “Está tudo ótimo”, respondeu Tarciana, sendo aplaudida.

Na quarta-feira, 18, Tallis Gomes havia escrito no Instagram que, “salvo raras exceções, essa mulher (CEO) vai passar por um processo de masculinização que vai colocar meu lar em quarto plano, eu em terceiro plano e os meus filhos em segundo plano”. E disse que posições como a dele exigem que o CEO seja “muito cascudo para suportar”, que “o mundo começou a desabar exatamente quando o movimento feminista começou a obrigar a mulher a fazer papel de homem”. E completou afirmando que as mulheres devem usar “a energia feminina nos lugares certos, lar e família”.

Depois da primeira postagem, quando sua posição já havia repercutido em grupos de WhatsApp que incluíam advogadas e mulheres do setor empresarial, Gomes tentou se retratar. Fez nova publicação em que pedia desculpas pelo “erro” e dizia ter sido “infeliz ao dizer qual tipo de mulher eu gostaria para a minha vida”. Antes, ele também havia recebido comentários contra sua publicação de ex-alunas mulheres da G4, que se diziam arrependidas por terem pago pelos cursos da empresa.

‘Tom errado’

“Em momento algum no meu texto eu quis questionar a capacidade de uma mulher ser CEO, disse única e exclusivamente, com as palavras erradas e com o tom errado, quem eu gostaria do meu lado como minha mulher”, tentou se explicar.

Procurado, o empresário não respondeu à reportagem do Estadão. A G4 Educação, por meio de nota, afirmou que Gomes errou e que o posicionamento do presidente “não representa a empresa nem sua trajetória”. “Entendemos que o Tallis errou e estamos aqui para reforçar que tanto ele quanto a G4 não têm compromisso com o erro. Queremos nos desculpar pela fala do Tallis, ainda que tenha sido algo pessoal e não representar a G4”, diz ainda a nota.

A executiva Sandra Chayo, sócia-diretora e herdeira do Grupo Hope, saiu em defesa de Gomes – que ocupa uma cadeira no conselho de administração da empresa. Segundo ela, as declarações não refletem sua conduta. “Realmente, o Tallis foi infeliz com as palavras, já reconheceu e pediu desculpas. Trabalho com ele há muitos anos e sei que o ‘story’ que ele postou não representa a pessoa que ele é.”

A tentativa de se retratar, porém, não bastou para conter a repercussão negativa. Nomes como Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza, Gabriela Onofre, do grupo Publicis, e Carol Paiffer, do grupo Atom, entre outras mulheres que lideram grandes companhias, usaram a rede para rebater os seus comentários.

Presidente do conselho de administração do Magazine Luiza, Luiza Trajano se posicionou nas redes ao ser cobrada por uma parceria feita recentemente entre o Magalu e a G4 Educacão. Ela explicou que a relação com a empresa de Gomes era “pontual” para um evento, e não um contrato de longa duração. “Não concordo em nada com o posicionamento de um dos sócios da empresa a respeito das mulheres”, escreveu. “Criei três filhos trabalhando muito, inclusive como CEO do Magalu. Soube cuidar deles e dos idosos da família.”

Presidente do Publicis Groupe no Brasil, Gabriela Onofre usou o LinkedIn para destacar o papel das mulheres que chefiam os negócios e disse comemorar não ser a única mulher no mercado, mas uma das diversas gestoras que ocupam o alto escalão das companhias. “Sou CEO. Sou mulher. Sou mãe. Sou esposa. Gero milhões em Ebitda (medida de geração de caixa). E que felicidade saber que sou apenas uma entre milhares”, disse ela, na plataforma.

CEO e fundadora da agência de relações públicas Pros (do grupo americano Stagwell), Daniela Graicar lamentou a publicação de Gomes, lembrando que comentários como o do fundador da G4 foram responsáveis por incentivar a criação do movimento Aladas, que treina e incentiva a carreira de mulheres no mundo dos negócios. “Sim, sou mulher, CEO, empreendedora e minha vida é isso e muito mais. Sou (muito bem) casada, mãe de três rapazes, amiga de uma galera, apaixonada por tênis, viagens, conteúdo e por encorajar mulheres a perseguir seus sonhos. Eu aguento a pressão do dia a dia de CEO há muitos anos, todos os dias. Eu já chorei, já pensei em desistir, mas nunca deixei de acreditar em mim. Deus me livre não ser o que eu quiser ser”, escreveu.

‘Vergonhoso e indigno’

A advogada tributarista Glaucia Lauletta, sócia do escritório Mattos Filho, publicou em sua rede social que a ausência de mulheres em posições de liderança se deve, principalmente, “ao reforço de estereótipos equivocados e à disseminação de crenças limitantes”. “Tudo isso alimenta o inconsciente e o consciente coletivos, que ainda tendem a reduzir a mulher a único papel, em geral de subserviência. Negar à mulher simetria de oportunidades é injusto, vergonhoso e indigno. Além de ser um enorme desperdício.”

Em sua conta no Instagram, Carol Paiffer, que é a diretora-presidente da Atom Educacional, rebateu os comentários de Gomes sem citá-lo diretamente: “Minha humilde opinião. Se você tem medo de perder seu parceiro(a) para o trabalho, repense sobre isso”, publicou ela, ao explicar que recebeu inúmeras mensagens sobre o caso. “Isso não é uma questão de gênero ou ‘energia’; é sobre conhecimento e capacidade”, escreveu.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.