Profissional experiente, ágil na detecção dos movimentos no mercado em que atua, Paulo Pontes, presidente da empresa de recrutamento Michael Page (especializada na busca por executivos em nível de alta gerência), tem um novo desafio nas mãos. Em poucos meses, desde que eclodiu nos Estados Unidos a crise financeira que afeta mercados no mundo todo, houve uma mudança brusca no perfil de executivos que seus clientes – em geral grandes empresas, nacionais e multinacionais – procuram para ocupar postos-chave em seu organograma. O figurino do profissional procurado mudou sobretudo nas diretorias financeiras. Antes, cabia como uma luva nas necessidades da companhia executivos com bom trânsito no mercado financeiro, capazes de lidar com IPOs e complexas operações estruturadas junto a bancos. Hoje o figurino é outro. “Na hora de contratar, as companhias querem agora um ótimo diretor em controladoria”, diz Pontes. O fenômeno já está até quantificado. Do começo de 2007 a junho deste ano, 65% a 70% das vagas para altos cargos em finanças tinham o primeiro perfil. Atualmente o segundo grupo, voltado para a redução de custos e eficiência operacional, representa 80% das contratações.

Até junho, de 65% a 70% das vagas para diretoria de finanças exigiam bom trânsito no mercado. Hoje, 80% são voltadas para custos

O novo perfil do profissional de finanças não é mero modismo – também o mercado executivo, às vezes, é sujeito a eles. Se as empresas buscam hoje profissionais mais voltados a acompanhar com olhos de lince cada gasto e cada processo, é, em grande parte, em virtude dos prejuízos obtidos por algumas delas com operações financeiras exóticas, sem relação com o principal negócio da companhia. “O profissional de finanças continuará valorizado”, afirma Fernando Mantovani, diretor da empresa de recrutamento Robert Half. “Os novos contratados, porém, terão de usar competências distintas nesse momento da economia.” A principal delas, segundo Nilton Cano Martin, professor do curso MBA Controller, da Fipecafi, será verificar a qualidade do desempenho financeiro de uma empresa, o equilíbrio entre o uso de recursos e a rentabilidade. “Quando os quadros executivos das companhias entenderem a importância do controller, nenhuma deixará de tê-los”, diz.

Além de executivos de finanças, os diretores de vendas devem
ganhar importância dentro das corporações

Para quem almeja alçar posições dentro da estrutura das corporações, cursos nessa área podem ser um passo importante. Há, no entanto, outras áreas que tendem a se valorizar, segundo os headhunters. Pontes, da Michael Page, elenca, além dos diretores de finanças, os de vendas como os mais importantes dentro das organizações, seguidos pelos diretores de logística (leia reportagem à pág. 66). Pontes faz, no entanto, uma ressalva: “Algumas empresas começam a perceber que não têm o melhor capitão para tocar o barco em tormentas.” Qual seria então o executivo ideal? “Aquele que possui uma visão do que deve ser feito e apresenta propostas inovadoras que se convertem em realizações”, argumenta.

Vice-presidente executivo de administração e finanças da T-Systems, provedora de tecnologia da informação do grupo Deutsche Telekom, o suíço Dominik Maurer, de 40 anos, vive no dia-a-dia as novas demandas do mercado. A subsidiária brasileira continua com o mesmo volume de negócios. O que mudou foi o pulso da matriz alemã quando se trata de aplicações financeiras. Ela agora prescreve uma lista de bancos nos quais a subsidiária pode fazer investimentos. “Tenho restrições a respeito, só posso aplicar dinheiro em bancos selecionados pela própria matriz. É uma relação de instituições seguras, que não vão quebrar”, revela Maurer. Com faturamento de R$ 300 milhões em 2007 e estimativa de crescimento de 12% para este ano, a T-Systems tem no controle do fluxo de caixa o foco atual da área financeira. “Mas não acho que esse executivo deve ficar apenas lendo os números em uma sala fechada, sem saber o que acontece lá fora”, opina Maurer. “Ele precisa ter uma visão global do mercado, conhecer os concorrentes e seus pontos fortes e fracos.” No cargo de CFO, ele supervisiona os setores jurídico, de RH, controladoria, qualidade, finanças, compras e segurança da informação.

Outra informação fundamental para quem busca melhores colocações vem de Mantovani. Para ele, apesar da turbulência global, o mercado brasileiro de recrutamento não terá retração em 2009. “Um crescimento de 3% do PIB, como é esperado, continuará demandando contratações”, afirma. “Até agora, apenas dois bancos internacionais que iam se estabelecer no País pediram para aguardarmos três meses.” A própria Robert Half, empresa comandada por ele, é um exemplo de que a procura por talentos continuará intensa. A companhia de origem americana chegou ao Brasil em junho do ano passado e começou com cinco recrutadores. Hoje são 50 e a previsão para 2009 é de 100. “Um número crescente de companhias de médio e pequeno porte passou a usar nossos serviços, o que era incomum até então”, diz Mantovani. “Investimentos em infra-estrutura não podem parar, decisões já foram tomadas e há um gap de profissionais de média gerência, especialmente nas áreas de engenharia, e-commerce e TI.”