11/04/2019 - 9:44
O presidente Omar al-Bashir, que governou o Sudão com mão de ferro por 30 anos, foi derrubado nesta quinta-feira (11) por um golpe militar após um levante popular, e substituído por um “conselho militar de transição”, que dirigirá o país por dois anos.
“Eu anuncio, como ministro da Defesa, a queda do regime e prendo seu chefe em um lugar seguro”, disse o ministro da Defesa, Awad Ibnouf, em pronunciamento na televisão estatal.
Awad Ibnouf prestou juramento como líder dessa instância na presença do mais alto representante do sistema judicial, em um ato retransmitido pela televisão.
Ao mesmo tempo, milhares de sudaneses se manifestavam nesta noite em frente ao quartel general das forças armadas, ignorando o toque de recolher noturno imposto pelo exército.
Os manifestantes gritavam “Paz! Justiça! Liberdade!” enquanto enchiam o extenso complexo de Cartum pela sexta noite consecutiva.
Líderes do movimento de contestação rejeitaram o golpe de Estado militar e prometeram continuar com as manifestações.
“O regime realizou um golpe de Estado militar apresentando os mesmo rostos (…) contra os quais nosso povo se levantou”, denunciou em um comunicado a Aliança pela Liberdade e a Mudança.
“Nós pedimos ao povo que continue a mobilização em frente ao quartel-general do Exército (em Cartum) e em todo o país”, acrescentou.
A União Africana (UA) também criticou a destituição do presidente sudanês afirmando que “o golpe militar não é a resposta adequada aos desafios enfrentados pelo Sudão e às aspirações do povo”.
Já o secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu que a transição no Sudão cumpra as “aspirações democráticas” de seu povo, segundo o seu porta-voz.
Guterres pediu “calma e máxima moderação de todos”.
O ex-chefe rebelde sul-sudanês, Riek Machar, exilado em Cartum, disse esperar que a destituição do presidente sudanês não afete o processo de paz em curso em seu país. O Sudão do Sul, de maioria cristã, se tornou independente do Sudão em 2011, após 22 anos de conflito, e em dezembro de 2013 mergulhou em uma guerra civil, marcada pelo enfrentamento entre o político sul-sudanês Salva Kiir e Riek Machar.
Washington pediu que o exército sudanês integre civis no novo governo. “Os Estados Unidos continuam pedido às autoridades de transição que mostrem moderação e abram espaço para uma participação dos civis no governo”, declarou à imprensa o porta-voz do Departamento de Estado, Robert Palladino.
Bashir, que governou o país desde que assumiu o poder em um golpe apoiado pelos islamitas em 1989, foi expulso depois que a força militar não conseguiu encerrar quatro meses de protestos em todo o país pedindo sua saída.
“O regime caiu”
“O regime caiu, o regime caiu!”, comemoraram os sudaneses reunidos no centro da capital.
Em pleno marasmo econômico, o Sudão é palco desde dezembro de manifestações motivadas pela decisão do governo de triplicar o preço do pão. A contestação logo se transformou em um movimento pedindo a queda de Bashir, que há anos é alvo de ações judiciais internacionais.
Desde sábado, milhares de manifestantes exigiam, em frente ao quartel-general do Exército, o apoio dos militares.
A televisão estatal interrompeu esta manhã sua programação normal para informar “um importante anúncio das Forças Armadas”, que finalmente foi feito no início da tarde.
Além da destituição do presidente, o ministro da Defesa anunciou sua substituição “por um conselho militar provisório por dois anos e a suspensão da constituição de 2005 no Sudão”.
Também anunciou “um estado de emergência em todo o país por três meses e o fechamento das fronteiras e do espaço aéreo do país até que um novo anúncio seja feito”.
Ibnouf disse que o conselho militar também declarou um cessar-fogo nacional, que inclui as regiões devastadas pela guerra de Darfur, Nilo Azul e Kordofan do Sul, onde o governo de Bashir lutava há tempos contra rebeldes de minorias étnicas.
Os militares também decidiram impor um toque de recolher noturno no país.
Em 2009, o Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia, emitiu um mandado de prisão contra Omar al-Bashir por “crimes de guerra” e “contra a humanidade” em Darfur, antes de acrescentar em 2010 a acusação de “genocídio”.
O conflito em Darfur deixou mais de 300 mil mortos e 2,5 milhões de deslocados, segundo a ONU.
Pouco antes do anúncio do ministro da Defesa, o poderoso serviço de inteligência do Sudão (NISS), ponta de lança da repressão às manifestações, havia divulgado a libertação de todos os presos políticos no país, segundo a agência oficial Suna.
No total, 49 pessoas morrem devido à violência ligada às manifestações, segundo responsáveis locais.
A ONG Human Rights Watch divulgou um balanço de 51 mortos, incluindo crianças.
“O povo quer a queda do regime”, gritaram durante a noite os manifestantes em Cartum, que fizeram o “V” da vitória e usaram os telefones celulares para iluminar o local.