A indústria da economia criativa está passando por uma grande transformação desde o início dos anos 2000 onde a profissionalização maior do setor fez o Brasil virar destino dos principais espetáculos musicais do mundo. 

É a opinião do empresário Luiz Calainho, que comemora em 2025 os 25 do grupo L21 Corp, que atua na gestão de teatros e casas de shows, como o Blue Note, e que quer ampliar o portfólio para a hotelaria até 2029. 

Calainho conta em entrevista à IstoÉ Dinheiro que o setor de eventos presenciais não deve se sentir ameaçado pelos streamings, pois acredita que nenhuma experiência digital vai se igualar à experiência física. 

“A experiência presencial ela é soberana. Você assistir um show do Nando Reis, do Gilberto Gil ao vivo, ou assistir Hair no teatro, com os atores, atrizes a banda ao vivo, não tem serviço de streaming que chegue perto dessa experiência”, afirmou. 

 

Confira os principais momentos da entrevista com o empresário

A L21 está no mercado de economia criativa desde 2000. O que mudou nesse mercado em 25 anos?

As principais mudanças no mercado da economia criativa podem ser resumidas na sua intensa profissionalização e nos resultados econômicos e de público que essa profissionalização gerou. Embora o Brasil seja muito rico em arte e cultura, faltava um profissionalismo mais profundo no setor e nesse período isso aconteceu em todos os aspectos.

No teatro, por exemplo, essa mudança foi brutal. Nos tornamos o terceiro maior produtor de teatro musical do mundo, um feito impensável 25 anos atrás e que só foi possível devido à profissionalização do setor. Os teatros físicos também se tornaram ultra-profissionais em suas operações, não sendo mais apenas administrados por donos que iam tocando. 

O profissionalismo trouxe uma sustentabilidade efetiva dos negócios, transformando a economia criativa em um setor que exige business plan, demonstrativos de resultado, cálculo de ROI, gestão de caixa e tesouraria, e balanços. Nesse tempo nós formamos atrizes, atores, diretores, mas também profissionais em áreas como controladoria, finanças, marketing, tesouraria e contabilidade, que são essenciais para a estrutura do negócio. 

A economia criativa movimentou R$ 30 bilhões no ano passado e representa 3,11% do PIB brasileiro. O Brasil nunca viveu um momento tão forte em termos de arte e cultura. 

Alguns empresários e setores estão dizendo que há uma crise na noite e se queixando da dificuldade de tirar o público de casa. Você concorda com isso? 

Definitivamente não, pelo contrário. A economia criativa está vivendo um momento de público que o Brasil jamais experimentou. Acredito que isso tem a ver com uma demanda de público que nasceu durante a pandemia, que gerou dois fenômenos positivos para: o aumento do interesse do público, já que pessoas que não eram tradicionalmente ligadas à arte, cultura e entretenimento, durante o confinamento, viram-se “obrigadas” a consumir conteúdo digital, como as lives, e aí tomaram gosto e se conectaram mais com essas manifestações culturais. E também houve um incremento do patrocínio empresarial, as empresas perceberam esse aumento do interesse do público e passaram a buscar o patrocínio de conteúdos presenciais. 

Hoje as empresas são mais receptivas quando vocês vão buscar um patrocínio? 

Muito mais. Mas hoje acontece um caminho contrário, das empresas baterem aqui na porta também. 

O interesse em naming rights, por exemplo, está crescendo muito. Essa modalidade de patrocínio leva a marca da companhia de uma maneira muito orgânica para ambientes editoriais, como matérias em jornais ou transmissões de eventos. Quando o nome de um espaço ou conteúdo inclui o nome de uma empresa, o grau de exposição é muito maior e, por ser editorial, é considerado mais valioso. 

O exemplo que a gente tem aqui na L21 é o BTG Pactual, que passou a patrocinar o Prêmio da Música, e o antigo Teatro Alfa em São Paulo, que será reaberto como BTG Pactual Hall. 

O Brasil é ponta absoluta de lança no conceito de naming rights para arte e cultura. No exterior esse modelo é mais focado em arenas esportivas. A gente trabalha criando jornadas de marketing e comunicação que oferecem grande visibilidade às empresas associadas a esses equipamentos culturais. 

O que as leis de incentivos, como a Rouanet, significam hoje para o setor?

As leis de incentivo são fundamentais para um país em desenvolvimento como o Brasil, que possui desafios econômicos e onde arte, cultura e entretenimento tendem a ter menos foco. Elas permitem que a arte e a cultura sejam produzidas e acessíveis de forma democrática para toda a população, não apenas àqueles com maior poder aquisitivo.

Espetáculos que recebem dinheiro de leis de incentivo, têm requisitos específicos para garantir o acesso ao público mais pobre, como 10% de gratuidade, 20% dos ingressos a um preço máximo de R$ 50 e obrigatoriedade de realizar apresentações para instituições e escolas e isso é muito importante. 

Hoje a gente tem três tipos de leis de incentivo no país, mas somente a Rouanet tem abrangência nacional. Existem leis de incentivos estaduais e municipais, mas que não estão presentes em todo o país.  

Você concorda que elas custam caro? 

De forma alguma. O dinheiro que o governo deixa de arrecadar retorna para a população através da produção de arte e cultura. Para cada R$ 1 incentivado, retornam R$ 1,68 em impostos gerados pela cadeia produtiva do evento. Pra montar um espetáculo musical, a produtora contrata empresas de som, luz, etc., que emitem notas e pagam seus próprios impostos. Essa cadeia de gastos gera mais arrecadação para o governo do que o valor que foi inicialmente incentivado. Ou seja, a Lei Rouanet é superavitária para o governo. A gente vê a indústria automotiva, que recebe isenções muito maiores e não devolvem nada para a população. Pelo contrário, elas usam para aumentar a rentabilidade. 

A companhia agora quer entrar no ramo de hotelaria. Qual vai ser o diferencial deste hotel?

Vai ser um hotel conceito, para o alto padrão, onde o hóspede vai ter uma experiência imersiva e a música será muito privilegiada. Vamos usar a marca da Blue Note, que já é consolidada no mercado da música. 

Entendemos que há uma oportunidade em cima de uma curva de de turismo crescente no Rio de Janeiro por conta dos shows da Madonna e da Lady Gaga que aconteceram. Então identificamos que há essa oportunidade de botar de pé este hotel conceito no Brasil, que é longe o país mais musical do mundo em termos de diversidade de gênero.