04/04/2012 - 21:00
Vai ser dada a largada para o que promete ser a abertura de capital mais acelerada dos últimos tempos: a Fórmula 1 deve fazer uma oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) em Cingapura. Ainda sem data definida, a expectativa é de que a captação chegue a US$ 1,5 bilhão e represente 15% do capital da empresa que controla um dos maiores eventos esportivos do mundo. O chefe comercial da F1, Bernie Ecclestone, afirmou no dia 22 de março que a decisão final está nas mãos da CVC Capital Partners, fundo americano de private equity que tem o controle majoritário do negócio, com 63,4% de participação, desde 2006, e divide o comando com Ecclestone. A potência da Fórmula 1 não está só nos motores, mas também passa pelos números.
O chamado “circo” movimenta bilhões de dólares anualmente, algo muito atrativo para o pujante mercado de capitais de Cingapura (leia quadro ao final da reportagem). Em 2011 o lucro foi de US$ 3 bilhões, cifra que pode crescer 12,7% ao ano até 2016, segundo a consultoria inglesa Money Sport Media, que elabora o relatório Formula Money. Para saber se vale a pena investir, é preciso entender as corridas como negócio. A receita da F1 é proveniente dos ingressos pagos pelos espectadores, da venda de direitos de transmissão a emissoras de televisão no mundo todo e das cotas dos patrocinadores e dos promotores da corrida, as cidades em que os prêmios são realizados. O problema é que muitas delas, como Barcelona (ES), Melbourne (AU) e Hockenheim (AL), já anunciaram que não têm dinheiro para pagar as taxas e não vão cumprir o contrato em 2013.
Estima-se que a F1 cobre cerca de € 13 milhões das cidades mais tradicionais para realizar as corridas. Nas pistas mais recentes, como a da espanhola Valência, a cifra chega aos € 23 milhões. A esperança de Ecclestone para melhorar as finanças são países como Coreia do Sul, Rússia e Estados Unidos, que já manifestaram interesse em levar o ronco dos motores para suas pistas. O IPO da F1 vem sendo cogitado há tempos, mas o processo só entrou na reta final após a crise europeia ter forçado patrocinadores másteres, como a Peugeot, a cancelar seus aportes em 2011. Além disso, neste ano expira um acordo comercial confidencial entre a CVC e as equipes. As conversas nos boxes dão conta de que a CVC ofereceu participação à Ferrari e à Red Bull. Ecclestone desmentiu que o IPO esteja vinculado a qualquer acordo e garantiu que as escuderias não entrarão na sociedade.
Pelo modelo atual, o ganho das equipes vem de repasses financeiros da direção. Procurada, a CVC não comentou o assunto. Compensa colocar seu dinheiro nesse cockpit? Os pontos positivos são o fato de que a F1 é um evento consagrado e, ao que tudo indica, lucrativo, embora seus números não sejam auditados. “O fluxo de caixa da F1 deve ser bastante estável, pois as corridas ocorrem religiosamente há várias décadas”, diz Ricardo Almeida, professor de finanças do Insper. “O nicho em que a empresa atua também é definido e lucrativo.” Adriano Gomes, professor de finanças da ESPM, avalia que a entrada da CVC Capital profissionalizou a gestão. Segundo ele, a realização de grandes prêmios em novos mercados, como Estados Unidos, Rússia e Oriente Médio, traz novos anunciantes. “O fato de Ecclestone ter uma fortuna de US$ 4,2 bilhões é um bom indicador de que ele sabe tornar esse negócio rentável.”
O risco é a ausência de diversificação, pois a empresa vive de um único evento esportivo. “Qualquer coisa que altere a dinâmica das corridas vai afetar o investidor diretamente e pode até mesmo quebrar o negócio”, diz Almeida. Em 2011, por exemplo, as equipes faturaram € 1,4 bilhão, segundo a empresa italiana de marketing esportivo StageUp. Essa receita vem caindo nas últimas três temporadas por conta da saída de patrocinadores e pela retirada de grandes fábricas, como a Toyota e a Honda. A ameaça mais recente é o mau humor da Ferrari. Insatisfeita com os recursos repassados, a escuderia pode criar uma liga paralela à F1. Riscos como esse têm um impacto forte. “Não é como investir em uma companhia como a Disney, que atua com tevê a cabo, parques temáticos, filmes e licenciamento de produtos”, diz Almeida.