O ritmo é vertiginoso, industrial. Três novas faculdades particulares são abertas a cada semana no País. Em 1995, quando teve início o atual governo, haviam 684 instituições de ensino superior privadas. Desde então, foram criadas exatas 1.003 novas faculdades. Só na capital federal, o número de faculdades saltou no período de 12 para 63. Nunca foi tão fácil abrir uma dessas no Brasil. As opções também jamais foram tão variadas. A cada semana, dentro desse universo de faculdades são criados dez novos cursos para as mais diversas profissões, como Webdesign e Pedagogia. Somente este ano, foram criados 188 cursos ? ao todo eram 16.386 até a tarde de sexta-feira 24. Haviam 3.500 cursos em 1995. Em São Paulo, a oferta pulou ou de 1.300 para 2.200 opções. Da mesma forma, nunca foi tão fácil conseguir um canudo. Nos últimos quatro anos, o número de vagas nas instituições privadas tem crescido 17% ao ano. Há 2,2 milhões de alunos matriculados nessas faculdades, 1 milhão a mais que em 1985. O campeão das preferências, entre empresários do ensino e postulantes a um título acadêmico, é o curso de Administração. Há no Brasil, hoje, 630 mil estudantes desta matéria. Junto com os de Direito, que são 400 mil, e Economia, compõem 40% do mercado.

Ao mesmo tempo em que desperta exclamações, a multiplicação das faculdades causa apreensão. O procurador da República Guilherme Schelb acaba de dar início a uma investigação sobre possível tráfico de influência no governo para a liberação de novos cursos superiores. ?Há fortes indícios que precisam ser esclarecidos e, por isso, já fiz uma representação ao MEC?, revela o procurador. No Congresso Nacional, o tema também promete esquentar. Há uma audiência pública sobre o assunto marcada para 5 de junho. ?Pode virar CPI?, informa a deputada Esther Grossi, presidente da Comissão de Educação da Câmara. O ministro da Educação, Paulo Renato Souza, tem um argumento na ponta da língua para se defender das acusações. ?Estamos democratizando o acesso à educação superior. Trata-se de uma revolução.?

O marco da explosão desse mercado é a aprovação da Lei de Diretrizes e Base, em 1996, na qual o MEC flexibilizou os critérios para a criação de novas faculdades e cursos superiores. Pelas novas regras, abrir uma faculdade ficou quase tão fácil quanto abrir um cursinho pré-vestibular. Outro fator foi a derrubada dos vestibulares ? hoje há faculdades buscando clientes no pátio da concorrência. A fiscalização e as dificuldades foram todas transferidas para a reconhecimento dos diplomas prometidos aos alunos. As faculdades em pleno funcionamento, com a caixa registradora aberta para recolher as mensalidades que podem ser superiores a R$ 1 mil, precisam cumprir uma série de quesitos, como equipamentos e titulação dos professores, para receberem conceitos que vão do A ao E. Há milhares de cursos com conceitos baixos e centenas com dificuldades de obter o reconhecimento do diploma prometido. Há 12 cursos no paredão, que têm até o final do ano para melhorar, ou serão lacrados. Uma explicação para o boom dos cursos de Administração é a facilidade com que eles podem ser abertos. A rigor, bastam salas, cadeiras, lousas e alguns professores para se abrir uma faculdade dessas. Equipamentos caros ou laboratórios não são necessários.

Apesar dos problemas de qualidade, há motivos para o sucesso desses empreendimentos. Primeiro, uma enorme demanda reprimida por diplomas de curso superior. Ademais, faculdades têm conseguido manter a margem de lucro na faixa de 25%, permitindo um crescimento rápido e auto-sustentado. Assim, o mercado da educação superior gerou potências corporativas. A maior instituição do País é a Universidade Paulista (Unip), do professor João Carlos Di Genio (leia entrevista ao lado), fundador do Grupo Objetivo, com 80 mil alunos em todo o País. Também chamam a atenção a Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, com 70 mil estudantes, e a Universidade Luterana do Brasil, com 40 mil, do Rio Grande do Sul a Tocantins.

?Há uma concepção cultural no Brasil de que o importante é ter um canudo?, diz o professor Afonso Avelar, fundador da mais nova instituição nacional de ensino, as Faculdades Nenhuma das Anteriores, ou NDA, lançada ao mercado na semana passada, em Brasília. O caso é ilustrativo. A NDA tem esse prosaico nome em referência às provas de múltipla escolha. Nasceu em 1996, como cursinho pré-vestibular e cresceu a taxas médias de 43% ao ano, sempre girando o dinheiro dos próprios estudantes. O grupo tem hoje faturamento anual de R$ 8 milhões e se prepara para a construção de um fabuloso campus à beira do Lago Paranoá, com 45 mil m2 de área construída e outros 95 mil m2 de jardins.

Hora de parar
 

O professor João Carlos Di Genio, maior empresário da educação do País, dono do Grupo Objetivo e da Unip, comanda 400 mil alunos e 15 mil funcionários. Abaixo, suas idéias sobre a explosão do ensino superior privado:

DINHEIRO ? Faculdade é um bom negócio?
DI GENIO ? Para os centros universitários, é excelente. Eles têm todas as regalias de uma universidade, mas não precisam fazer pesquisa. Conseguem, assim, rodar uma folha de pagamentos 40% menor do que as universidades.

DINHEIRO ? A poítica de expansão do ensino superior está correta?
DI GENIO ? Num primeiro momento, sim, pois acabou com os cartórios. Hoje tem até quem queira abrir franquias de faculdades. Chegou a hora de o MEC parar e exigir qualidade.

DINHEIRO ? Ela democratizou o acesso ao ensino superior?
DI GENIO ? Hoje há vagas para todos, o que não há é dinheiro para pagar as mensalidades. A inadimplência está entre 35%.