Há dez anos, Izidelte Santos da Silva convive com a ausência do filho. Em 2003, Fábio Eduardo Soares Santos de Souza, de 20 anos, desapareceu, ao deixar uma festa, em Queimados, na Baixada Fluminense. A mãe conta que o rapaz sumiu depois de passar por uma abordagem policial e acredita que agentes do Estado estejam envolvidos no desaparecimento.

“Ele estava em uma festa junina, aí, foi abordado por um policial a caminho de casa. Até hoje, eles não deram retorno do meu filho, não sei dele”, disse Izidelte, que chegou a ingressar com uma ação na Justiça pedindo explicações sobre o caso.

Situações em que as vítimas desaparecem e nunca são encontradas, com envolvimento direto ou indireto do Estado, são chamadas de desaparecimentos forçados. Em 2010, as Nações Unidas (ONU) instituíram o dia 30 de agosto como uma data para conscientizar governos a combater o crime – que costuma combinar a prisão ilegal, o sequestro, o assassinato e a ocultação de cadáver, por grupos de extermínio ou por policiais, por exemplo.

Autor do livro Das “técnicas” de fazer desaparecer corpos, o sociólogo Fábio Alves Araújo, diz que a investigação desse tipo de desaparecimento sempre é um desafio. Segundo ele, as vítimas de desaparecimentos forçados costumam ser moradores de áreas mais pobres, como as favelas, jovens e negros. “São pessoas que a PM define como ‘inimigo’”, disse. “Estamos há anos tentando um diálogo com a Secretaria Estadual de Segurança, com a Polícia Civil, tentando pesquisar sobre essas práticas, mas observamos que esse tema é tratado como um problema menor”, acrescentou.

Para dar apoio às famílias que perderam parentes nessas circunstâncias, foi criado um grupo de apoio que reúne mães das vítimas, chamado Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência. Formada por mães de vítimas, o grupo luta para que os casos sejam investigados e julgados.

“A rede tem o papel de dar encaminhamento jurídico e psicológico às famílias e de fazer denúncia no nível nacional e internacional”, acrescentou a representante, Maria da Silva. “A violação de direitos humanos na favela é uma constante”, declarou.

Um dos casos do país com maior repercussão foi o do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, que desapareceu em 2013, após uma abordagem da Polícia Militar, na Rocinha, na zona sul da cidade do Rio, em uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Depois de apresentarem versão mentirosa sobre o ocorrido, policiais foram descobertos e acusados de assassinar Amarildo. O julgamento levou 25 policiais militares ao banco dos reús pelo crime, incluindo um major e um tenente. Eles foram condenados por tortura e ocultação do corpo de Amarildo.

Entre 2003 e 2017, foram registrados 77 mil desaparecimentos no estado do Rio de Janeiro, segundo o Instituto de Segurança Pública. No entanto, os dados não separam quais foram forçados. 

Em 2010, o Brasil assinou uma convenção da ONU para combater o crime. A norma considera como desaparecimento forçado a prisão e detenção ilegal, sequestro ou qualquer outra forma de privação de liberdade por agentes do Estado ou pessoas e grupos agindo com a autorização, apoio ou consentimento do Estado, como são casos envolvendo policiais militares. O Ministério da Justiça criou, em 2015, um banco de dados para integrar os registros de desaparecimentos forçados nos estados. O banco, porém, não avançou.

Procuradas pela reportagem, as secretarias estaduais de Segurança e de Direitos Humanos do estado do Rio não se manifestaram sobre combate e monitoramento dos desaparecimentos forçados.

* Colaborou Isabela Vieira, da Agência Brasil