24/03/2025 - 6:30
Vindo de uma montanha russa desde o segundo semestre de 2024, os fundos imobiliários (FIIs) ensaiam uma recuperação recente, com o principal índice desse mercado – o IFIX – subindo cerca de 10% desde o fim de janeiro.
O mercado de FIIs mostra múltiplos historicamente descontados. Alguns setores possuem múltiplos mais descontados do que na época da pandemia, ficando atrás apenas do período entre 2015-16, com problemas graves na economia doméstica durante o segundo mandato de Dilma.
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Marcos Baroni, Head de Análise de FIIs da Suno Research, explica que o mercado veio de um início de 2024 com ‘clima de juros mais baixos’, com analistas citando um dígito – realidade que logo se mostrou distante.
Dada a correção do mercado de fundos imobiliários com a Selic, esse contexto fez o mercado amargar duras e paulatinas quedas. Todavia, em 2025 alguns investidores tem aproveitado os descontos historicamente altos para encher o carrinho.
“Estamos vendo uma depuração de perfil de investidor. Os FIIs passaram a ser mais interessantes para ETFs internacionais, inclusive. Os fundos estão mais robustos, com liquidez e capitalização de mercado acima de algumas empresas imobiliárias. Existe uma mudança de eixo aí, tem mais institucionais adquirindo” cotas”, comenta Baroni.
Lucas Simon, gestor da Kinea – atualmente a maior asset de FIIs do mercado brasileiro – endossa a tese, dizendo que “os FIIs estão simplesmente trocando de mão”, com mais institucionais comprando cotas.
A leitura da casa é de que nos últimos meses as quedas estiveram atreladas à uma pressão vendedora de investidores pessoa física, ao passo que investidores institucionais (e por ventura, mais especializados) têm comprado cotas aos montes, impulsionando uma recuperação do mercado.
Nesse contexto, alguns fundos tiveram saltos inusuais para a indústria, com uma volatilidade que não é costumeira para a classe de ativos. Nos últimos 30 dias, por exemplo, o GZIT11 salta mais de 12%, enquanto o RBRX11 salta 10,9% e o KNHF11 avança mais de 6%.
Marx Gonçalves, da XP, resume o cenário como de “oportunidades de investimento em um ambiente desafiador”.
“Ao contrário do ano anterior, iniciamos 2025 com um posicionamento de mercado que já reflete um elevado pessimismo, gerando descontos acima dos padrões históricos, que, em muitos casos, não condizem com os fundamentos que identificamos”, diz o especialista em relatório da casa.
Os dados levantados pela research da XP mostram que o cenário de FIIs é “marcado por descontos superiores ao observado no pico da pandemia”.
“O IFIX Tijolo, que considera exclusivamente fundos de propriedades, apresenta um desconto ainda mais acentuado, superado apenas pelo período da crise de 2015- 2016, quando o Brasil enfrentou uma grave recessão econômica. No entanto, o contexto atual é distinto, pois os fundamentos setoriais estão sólidos e não há impactos operacionais severos sobre os resultados.”
‘Os rendimentos estão seguros’
Olhando para os dividendos – que atraem investidores pessoa física para a indústria -, Baroni destaca que os patamares seguem atrativos apesar da volatilidade no IFIX em vários dos fundos listados, mostrando uma resiliência do setor.
“Quando olhamos o dividend yield, concluímos que a maioria dos rendimentos dos fundos estão seguros. Apesar da volatilidade dos FIIs, os rendimentos se mantém estáveis”.
Gonçalves, da XP, observa que os fundos logísticos da preferência da corretora, por exemplo, vêm gerando um rendimento médio ponderado de 10,2% ao ano – o que equivale a IPCA + 10,2% ao ano, considerando os ajustes dos aluguéis pela inflação.
Tijolo caiu mais, mas desconto não é tudo
Apesar do desconto excessivo nos FIIs de tijolo, especialistas seguem mantendo cautela com o segmento. O nicho puxa os descontos do IFIX para baixo, mas ainda que os múltiplos estejam mais baratos, não necessariamente estão mais atrativos – especialmente em se tratando de lajes corporativas.
“Nós fizemos uma análise aqui que é meio grosseira mas funciona. Separamos IFIX entre crédito e tijolo, e vemos o P/VP, vendo ágio e deságio. Ágio do tijolo ficou abaixo da pandemia, só perde pro período Dilma. O que dita hoje é o juros, o macro, e nesse cenário os FIIs de tijolo podem simplesmente ficar baratos por mais tempo. Na época da Dilma ficou bem barato por dois a três anos. Nosso call não é de aumentar tijolo. Estamos 50/50, mas nos últimos seis meses aumentamos crédito”, relata Simon, da Kinea, que faz a gestão de um fundo de fundos (FoF).

Baroni observa que, com poucas exceções – de FIIs com imóveis muito bem localizados – o segmento de lajes não é tão promissor no longo prazo;
“No tijolo versus papel, o tijolo puxa essa média para baixo por conta de lajes, mas hoje o setor de lajes não é mais tão atrativo para o investidor médio. É mais complexo, contratos mais frágeis, companhia mais frágeis, que mudam de escritório. São ativos que quando não estão em localização óbvias, como a microrregião primária de SP, são mais desafiadores”, analisa.
O analista da Suno comenta que alguns fundos ainda carregam uma alavancagem desde a época pandemia e ‘não resolveram’ questões relativas ao endividamento.
Ademais, pontua que há cerca de uma década o setor de lajes representava algo como dois terços do mercado, enquanto hoje em dia representa menos de 10% do mercado de FIIs. “Mostra que a própria classe definhou, não conseguiu ganhar tração”, comenta.
Mais FIIs de papel
Sobre as recomendações para clientes da área de research da Suno, Baroni relata que apesar de a maior parte da carteira ainda estar atrelada a tijolo (galpões logísticos e outros segmentos), as recomendações mais recentes foram de FIIs de papel. Em um cenário de Selic em escalada, a predileção tem sido por fundos com a maior parte da carteira indexada ao CDI – algo mais difícil de encontrar na indústria.
“Predominantemente são fundos mais atrelados ao IPCA, por conta das originações, mas temos boas oportunidades olhando para fundos com carteiras mais atreladas ao CDI”, comenta Baroni.
Simon, da Kinea, comenta que a casa segue gostando de fundos high grade – que investem em dívidas consideradas de alta qualidade, emitidas por empresas ou imóveis com baixo risco de calote.
“Esse segmento dificilmente será impacto, nosso high grade aqui da casa [o KNCR11] passou por Dilma sem dar um soluço, zero default. Dois anos de PIB negativo e não fez nada do fundo ruir. Nós gostamos muito de risco baixo, mas são poucos na indústria hoje. Consideramos high grade uns 6 ou 7 fundos”
Nesse contexto, o gestor diz que a casa tem gostado de ‘algo mais apimentado’, alocando nos middle grades, e que foi uma das primeiras assets a antecipar a deterioração macroeconômica que resultou em uma curva de juros futuros abrindo e ativos mais atrelados ao CDI ficando mais atrativos.
“Tínhamos um call de CDI em alta forte ano passado, e é exatamente o que está acontecendo. O mercado precifica Selic perto de 15% com uma inflação próxima de 6%. Estamos falando de 11% de juro real, o que é muito. Você ganha muito mais juro real estado comprado em CDI do que em uma NTN-B”, analisa Simon.
O gestor completa frisando, assim como Baroni, que há pouco CDI “puro sangue”‘ no mercado, mas que há predileção pela classe de FIIs.