A máquina palaciana nunca trabalhou tanto. Daqui a pouco mais de 20 dias, o governo do presidente Lula estará oficialmente proibido de inaugurar obras, fazer publicidade de seus programas ou conceder qualquer tipo de reajuste salarial. O resultado disso é que ministros, funcionários públicos e empresários estão em contagem regressiva para o dia 1º de julho. Em uma verdadeira economia de palanque, Lula decidiu abrir sua caixinha de bondades às vésperas da eleição. Espalha promessas de aumentos, ensaia uma cara uniformização de carreiras, lança obras aqui e acolá.

E ainda sobra tempo para ampliar programas sociais e fazer agrados aos empresários. O motivo para tanto alvoroço é que o governo dispõe de um caixa superior a R$ 25 bilhões para gastar em apenas três semanas. São restos a pagar do ano passado e sobras de um superávit declaradamente acima da meta para este ano. Sim, o governo está gastando enquanto pode. ?O que estamos assistindo neste ano é irrepetível?, analisa o economista Fabio Giambiagi, do Ipea. O gasto público, diz ele, tem crescido entre 8% e 10% acima da inflação desde 2003. ?Fizemos as opções de gastar mais fortemente no começo do ano para garantir os nossos compromissos no segundo semestre?, justificou o presidente no início da semana passada, durante o lançamento do gasoduto Urucu-Manaus. ?Isso é normal e sempre aconteceu?.

A última novidade disparada por Lula ? com o apoio dos presidentes dos outros dois poderes ? é a unificação das carreiras públicas. Com grande parte do funcionalismo se arrastando em greves que perduram há mais de dois meses, Lula sacou uma proposta que pode abrir a caixa de Pandora e detonar de vez a estrutura de salários do governo. A idéia é reajustar os salários do Executivo, onde a média salarial é de R$ 3,3 mil, para que alcancem os pagamentos oferecidos no Legislativo e no Judiciário, que circulam na casa dos R$ 9 mil. Tal atitude resultaria num acréscimo de R$ 151 bilhões ao ano na folha de pagamentos, que saltaria para estratosféricos R$ 223 bilhões. A possibilidade é tão sombria que suscita o descrédito do funcionalismo. ?Isso é mais um factóide para desviar a atenção do debate em torno da proposta de reestruturação de algumas carreiras?, ataca Ezequiel Nascimento, presidente do sindicato dos servidores do Legislativo. Factóide ou não, Lula conseguiu acalmar os ânimos de movimentos grevistas que volta-e-meia invadem a Esplanada dos Ministérios, como o INSS e o Banco Central. Ambos voltaram ao trabalho na semana passada. Outras oito categorias, entre auditores da Receita Federal e servidores dos tribunais federais, ainda estão paradas, cobrando por planos de carreira que podem atingir os cofres públicos em R$ 13 bilhões, pelos cálculos do Ministério do Planejamento. Mas Lula se comprometeu a atender às reivindicações até o final do prazo estipulado pela Justiça Eleitoral. ?Greve é um direito do trabalhador, mas também é a forma mais fácil de destruir os cofres do governo?, analisa o economista Raul Veloso, especialista em contas públicas. ?Quando se fala em aumento salarial, a sensação que dá é que haverá um novo aumento da carga tributária. O que é inviável?.

Como num passo ensaiado, o presidente também não se afasta dos canteiros de obras mal-iniciadas que espalhou pelo País. Em alguns casos, como o da ferrovia Transnordestina, chegou a participar de três cerimônias de lançamento em menos de seis meses. Nas duas últimas semanas, Lula esteve em oito Estados inaugurando desde a duplicação da BR 060, entre Brasília e Goiás, até uma estação de piscicultura no Rio Grande do Norte. E sempre em tom de campanha.

Para completar a decoração do palanque, o presidente decidiu enfrentar as resistências que vinha sofrendo na Receita Federal. Fonte de incessantes brigas entre os técnicos do Leão e empresários, encontra-se na mesa de Lula a nova versão do Programa de Recuperação Fiscal, o Refis 3. O primeiro indício de que o presidente quer angariar a simpatia dos devedores é a orientação repassada ao ministro Guido Mantega, da Fazenda, na semana passada. Lula exigiu que Mantega usasse de seus poderes hierárquicos para minar as resistências do secretário Jorge Rachid. Mesmo sabendo que o novo Refis pode gerar um prejuízo de R$ 53 bilhões ? dinheiro que deixará de ser pago pelo recálculo do Refis 2 ? Mantega entendeu o recado. Lula prometeu sancionar o projeto até a terça-feira 13. Ainda em tempo de não ser pego pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Verba farta para melhorar a imagem de Lula

Fotos: EFERicardo Stuckert/PR 

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