31/01/2007 - 8:00
Museu do Louvre, em Paris: instituição receberá 750 milhões de euros para instalar unidade nos Emirados Árabes.
Na agenda de exportação da França, percebe-se uma preocupação em vender os mais variados produtos aos países da Ásia, devido ao avanço de suas economias, e ao Oriente Médio, onde o dinheiro jorra sob a forma de petróleo. Os franceses intensificaram a comercialização de vinho, de roupas, de jóias e acessórios em couro e até de equipamentos militares para os países da região. Mas o ápice da sede de comércio gaulesa foi revelado quando o Ministério da Cultura da França anunciou a abertura de uma filial do Museu do Louvre, em Abu Dabhi, nos Emirados Árabes.
Foto: AFP
Pompidou em Metz: projeto do museu que irá para a cidade de Metz, próxima à Alemanha e Inglaterra
Trata-se de um negócio sem precedentes no mundo da arte. Primeiro porque a cifra envolvida é colossal: 750 milhões de euros para ter o direito de usar a marca Louvre por 20 anos, receber temporariamente parte de seu acervo e contar com a ajuda de seus especialistas. Segundo porque a iniciativa de exportar esse símbolo da cultura partiu do presidente Jacques Chirac, lendário por cultivar o nacionalismo francês ao extremo, que por vezes beira a xenofobia. Logo depois do anúncio, a resistência mostrou suas armas. ?Os museus não estão à venda?, estampou na manchete o jornal Le Monde. No mesmo tom, o site La Tribune de l?Art organizou um abaixo assinado contra a iniciativa. Ainda não se sabe, ao certo, o que irá acontecer diante de tantas manifestações contrárias. Mas o assunto trouxe a luz para o milionário mundo dos museus.
Foto: AFP
Audácia: a construção, que deverá ficar pronta em 2008, custará cerca de ?60 milhões
Nos últimos anos, as grandes instituições do universo da arte passaram a explorar seus nomes e suas reputações de olho no lucro, seja de forma direta ou indireta. Isso porque, além do Louvre, o também francês Georges Pompidou anunciou que abrirá uma filial em Xangai. Por trás desses movimentos, especulam o jornal americano The New York Times e o inglês The Guardian, se escondem interesses comerciais em relação aos Emirados Árabes. De 1996 a 2005, por exemplo, a França vendeu máquinas militares como caças Mirage num valor superior a US$ 10 bilhões e, recentemente, a Emirates Airlines encomendou 43 aviões Airbus A380. Essa teoria da ?conspiração? não é descabida. Isso, porém, não significa que os museus franceses estejam cometendo ato de loucura. Apesar de os especialistas em arte observarem qualquer transação desse tipo como tabu, esse modelo de franquia não é novo. A Fundação Guggenheim foi uma das primeiras do mundo a espalhar seu nome em vários países mediante o pagamento de uma taxa de franquia e royalties. Hoje, por mais que seja duramente criticado, o Guggenheim tem bandeira cravada em Nova York e Las Vegas, em Bilbao, em Berlim, em Veneza e, em 2010, também abrirá uma filial em Abu Dabhi. É um modo de conseguir recursos de outras fontes.
Foto: AFP
O original: o Georges Pompidou, em Paris, ficou pequeno para o tamanho de seu acervo de 58 mil obras
Além das doações, os grandes museus geram receita com as lojas que vendem produtos de arte, restaurantes, bilheteria e com o empréstimo de obras de arte. O Louvre, que em 2006 recebeu um público de 8,3 milhões de pessoas, costuma ganhar dessa maneira. Um exemplo: ao emprestar 185 de seus quadros ao High Museum de Atlanta por 11 meses, a instituição recebeu um cheque de 13 milhões de euros. O dinheiro das franquias, com certeza, ajudará na ampliação do acervo e na expansão das marcas dentro da França. O próprio Louvre vai construir outro museu em Lens, norte da França. A obra de 22 mil metros quadrados deverá custar US$ 139 milhões e ficará pronta em 2008. Ali, serão expostos trabalhos que não cabem mais no Louvre de Paris. Mais: como a cidade de Lens fica próxima à Inglaterra e Alemanha, poderá receber mais bilheteria. O Pompidou segue o mesmo raciocínio. Com um acervo de 58 mil obras de arte, ele não tem espaço físico para expor. Decidiu, então, construir um outro Pompidou em Metz, norte da França. A um custo de 60 milhões de euros, ele terá um projeto futurista e abrirá as portas em 2008.
Foto: AFP
Guggenheim: inaugurada em 1997, a filial em Bilbao, na Espanha, custou cerca de ? 650 milhões. Em uma década, o dinheiro foi recuperado.
Pode parecer exagero um investimento tão alto para abrigar um museu de porte. Não é. Para receber o Guggenheim em Bilbao, uma ousada obra arquitetônica de Frank Gehry inaugurada em 1997, o governo espanhol investiu cerca de 650 milhões de euros. Passada mais de uma década, o dinheiro foi resgatado pois o local tornou-se uma atração turística muito procurada. A cidade do Rio de Janeiro pretendia fazer o mesmo. Chegou a anunciar a vinda do Guggenheim, mas o projeto foi cancelado pois o custo para os cofres da cidade fluminense seria superior a R$ 600 milhões. O ideal para o Rio seria receber o museu nos mesmos moldes do Rodin que foi inaugurado na Bahia (leia quadro) há um mês. ?Não somos uma franquia e não pagamos royalties?, diz Katia Fraga Jordan, superintendente adjunta para a área de conteúdos do Museu Rodin Bahia. ?O que temos é um intercâmbio cultural com os franceses?, ressalta. É negócio cada vez mais raro no milionário mundo da arte.
RODIN À BAIANA
Foto: Aristeu Chagas
Museu Rodin Bahia: instituição inaugurada em dezembro passado.
O Brasil foi o primeiro país da América Latina a receber uma filial do Museu Rodin, um dos mais respeitados do planeta, especializado nas obras de Auguste Rodin. Instalado no Palacete Comendador Catharino, uma construção do século 19 em Salvador, o Museu Rodin Bahia foi inaugurado em dezembro passado por meio de um intercâmbio cultural entre os governos da França e do Brasil. ?Ele não é uma franquia e não pagamos royalties para usar o nome?, diz Katia Fraga Jordan, superintendente adjunta de conteúdo do Museu Rodin da Bahia. Atualmente, há duas exposições no local. Uma que mostra a história do palacete que abriga o museu e outra com as obras do escultor Mario Cravo. As peças de Rodin, 62 esculturas de gesso originais, virão em comodato dentro de três meses. ?Estamos procurando parceiros na iniciativa privada para financiar outras exposições?, diz Jordan.