07/10/2019 - 6:48
As forças dos Estados Unidos no norte da Síria iniciaram nesta segunda-feira (7) sua retirada das zonas próximas à fronteira com a Turquia, o que abre caminho para uma ofensiva militar turca contra milícias curdas e aviva o temor sobre o retorno dos extremistas à região.
Em um comunicado, as Forças Democráticas Sírias (FDS), aliança de combatentes curdos e árabes, anunciaram que as “forças americanas se retiravam das zonas de fronteira com a Turquia”, ao mesmo tempo em que a ONG Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH) confirmou uma retirada das tropas dos Estados Unidos de posições importantes em Ras al-Ain e Tal Abyad.
No domingo à noite, o governo dos Estados Unidos anunciou que a retirada permitirá à Turquia realizar “em breve” uma incursão militar “prevista há algum tempo no norte da Síria”.
O presidente Donald Trump justificou sua decisão, alegando que cabe aos atores da região resolverem a situação e que seu país deve deixar as “ridículas guerras intermináveis”.
“Turquia, Europa, Síria, Irã, Iraque, Rússia e curdos agora terão que resolver a situação e o que querem fazer com os combatentes do ISIS capturados em seu ‘bairro'”, tuitou Trump, usando a sigla em inglês do grupo Estado Islâmico (EI).
“É hora de sairmos dessas ridículas guerras sem fim, muitas delas tribais, e levar nossos soldados para casa. LUTAREMOS ONDE SEJA EM NOSSO BENEFÍCIO, E LUTAREMOS SOMENTE PARA VENCER”, acrescentou.
Poucos minutos depois, o senador Lindsey Graham, um dos republicanos mais próximos a Trump, pediu ao presidente para “revogar a decisão” de retirar as tropas americanas do norte da Síria, por considerar que a medida era um “desastre em formação”.
“Além disso, se este plano avançar será apresentada uma resolução do Senado em oposição e para pedir a revogação da decisão. Espero que receba um forte apoio bipartidário”, tuitou o republicano.
O também senador republicano Marco Rubio considerou a decisão um “grave erro”, com impactos para além da Síria.
“Confirmará a visão do Irã sobre este governo e irá estimulá-los a uma escalada de ataques hostis que, por sua vez, podem disparar uma guerra regional mais ampla e perigosa”, tuitou.
O senador republicano Mitch McConnell, um dos principais aliados de Trump no Congresso, adotou o mesmo tom, advertindo que uma retirada “precipitada” beneficiará Rússia, Irã e o governo Bashar al-Assad.
“Uma retirada precipitada das forças americanas da Síria apenas beneficiaria Rússia, Irã e o regime de Assad”, afirmou o líder da maioria republicana no Senado, em um comunicado.
“E aumentaria o risco de que o EI e outros grupos terroristas se reagrupem”, acrescentou.
Temendo o efeito deste anúncio para os curdos, a ex-embaixadora de Trump na ONU, Nikki Haley, lembrou que eles foram “determinantes no combate” dos americanos contra o EI na Síria. “Nós temos de defender sempre nossos aliados, se esperamos que eles nos defendam”, alegou, também pelo Twitter. “Deixá-los morrer é um grave erro”, insistiu.
Em reação às críticas, Trump lançou um alerta à Turquia. “Se a Turquia fizer algo que eu, com minha grande e inigualável sabedoria, considerar que ultrapassa os limites, vou destruir e arrasar completamente a economia da Turquia”, advertiu Trump.
– Pentágono reage
O Departamento da Defesa afirmou que os EUA não apoiam uma operação turca no norte da Síria e alertou Ancara para as “consequências desestabilizadoras” de potenciais ações neste território.
“O Departamento da Defesa deixou claro para a Turquia, tal e como disse o presidente, que não apoiamos uma operação turca no norte da Síria. As Forças Armadas dos Estados Unidos não vão apoiar, nem vão participar de uma operação deste tipo”, frisou o Pentágono, em um comunicado.
“Trabalharemos com nossos aliados da Otan e, com os sócios da coalizão, para reiterar para a Turquia as possíveis consequências desestabilizadoras de potenciais ações para a Turquia, para a região e além dela”, ressaltou o porta-voz do Pentágono, Jonathan Hoffman, na mesma nota.
De acordo com uma fonte do Departamento de Estado, Washington retirou “um número muito pequeno” de soldados desta região, deslocados a “uma distância muito pequena”.
– ONU se prepara para o pior
Algumas horas antes, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, afirmou que o Exército de seu país está pronto para iniciar a qualquer momento as operações contra milícias curdas na Síria, após o anúncio de Washington de que não vai apresentar oposição à intervenção.
“Há uma frase que sempre usamos: podemos chegar a qualquer noite, sem aviso”, disse Erdogan à imprensa.
A Turquia está decidida a “limpar” o norte da Síria de “terroristas” que ameaçam sua segurança, declarou o ministro turco das Relações Exteriores, Mevlüt Cavusoglu.
Erdogan havia afirmado na semana passada que a Turquia estava perdendo a paciência com Washington a respeito da criação de uma “zona de segurança” no norte da Síria. E ameaçou com uma operação militar iminente.
Nesta segunda (7), a ONU afirmou que se prepara para o pior na região norte da Síria, após a retirada dos Estados Unidos e sua anuência a uma intervenção militar turca.
“Não sabemos o que vai acontecer (…) nos preparamos para o pior”, declarou o coordenador humanitário da ONU para a Síria, Panos Moumtzis, em uma entrevista coletiva em Genebra.
A União Europeia considerou, por sua vez, que uma ofensiva “vai exacerbar o sofrimento da população civil e provocará deslocamentos em massa”.