A Ford é dona de uma marca centenária cujo valor de mercado supera os US$ 7 bilhões, segundo a consultoria Millward Brown. O emblema azul com inscrições prateadas, com o nome da família fundadora e até hoje controladora da companhia, é internacionalmente conhecido e pode ser encontrado nas estradas e ruas espalhadas pelos quatro cantos do mundo. No que depender dos planos da montadora americana, criada por Henry Ford em 1903, esse símbolo da indústria automobilística passará a frequentar outros cômodos das casas de seus consumidores, em especial a cozinha. A empresa está licenciando sua marca para a carioca NKS, fabricante de eletrodomésticos, que vai produzir fogões, geladeiras, liquidificadores, ferros de passar, entre outros produtos, que estamparão a marca Ford. 

 

120.jpg

Mão na ferramenta: Daian (à esq.) e Dedivitis venderam 20 mil itens em apenas dois meses

 

Até dezembro, a brasileira pretende colocar à venda no mercado cerca de um milhão de eletrodomésticos com a marca. “Tudo está sendo feito junto com a Ford, desde a identidade até a qualidade dos produtos”, afirma Felipe Nabuco, presidente da NKS. Além do Brasil, a empresa será responsável pela venda dos produtos em 30 países, entre eles Alemanha e Estados Unidos. “Teremos de cuidar de toda a estrutura necessária, desde o fornecedor até o pós-venda.” Parte dos produtos, como liquidificadores e batedeiras, sairá das fábricas da NKS, em Queimados (RJ) e Salvador (BA). Os demais serão importados da China, dos Estados Unidos e da Alemanha. A NKS já trabalha com produtos licenciados. 

 

Ela produz, por exemplo, uma linha de equipamentos de higiene e beleza assinada pelas apresentadoras de tevê Ana Maria Braga e Angélica. Para ganhar o aval da Ford, a empresa precisou negociar por cerca de um ano e meio. “Até a solda passou pela aprovação deles”, afirma Nabuco. O cuidado da montadora com a escolha do parceiro se justifica. O lançamento desses itens para o lar faz parte da estratégia global de vendas da Ford, elaborada no ano passado, quando a empresa recuperou o controle de sua marca, que tinha sido dada como garantia a credores em 2006. Naquele ano, a empresa de Detroit enfrentou uma grave crise e quase foi à falência. Para não quebrar, ela precisou recorrer ao socorro do governo dos EUA, que fez um aporte de US$ 23,5 bilhões. 

 

121.jpg

Piloto na cozinha: Nabuco, da NKS, tem planos

de vender produtos em 30 países

 

“Esse produtos vão permitir que os atuais proprietários de carros da Ford tenham uma experiência positiva contínua e mais contato com a marca”, afirma John Nens, gerente global de licenciamento e identidade corporativa da Ford. Segundo Nens, o mercado varejista global vendeu US$ 1,4 bilhão em produtos com o nome Ford no ano passado. A NKS não é a única empresa brasileira a ganhar com a marca Ford. No ano passado, a importadora paulista Nine negociou uma licença para comercializar ferramentas elétricas e manuais com o símbolo da montadora. A operação é realizada pela Etilux, de São Paulo, que também atua com a marca Western. Segundo o sócio da importadora, Gustavo Dedivitis, a aceitação dos produtos foi muito acima do esperado. 

 

“Trouxemos 20 mil itens que acabaram em dois meses, quando a previsão era para um ano”, afirma Dedivitis. No lançamento, a empresa contava com 100 produtos Ford. Hoje, são cerca de mil com o nome da fabricante de veículos, que concorrem com marcas consagradas como Bosch, Makita e Tramontina. A expectativa é de chegar a um faturamento de R$ 120 milhões em três anos no Brasil, de acordo com David Daian, sócio da Etilux. “Já iniciamos também a operação em outros países, como Uruguai e Chile, e estamos indo para a Europa, Oceania, Ásia e os Estados Unidos”, diz Dedivitis. Ao associar sua marca a outros produtos, e não somente a carros, a Ford busca estar presente no dia a dia dos consumidores. 

 

“Se há relação diária com a marca, na hora de escolher o próximo carro, é muito mais fácil decidir por um Ford”, diz Maximiliano Tozzini Bavaresco, sócio da consultoria Sonne Branding, especializada na gestão de marcas. “É uma forma de transcender a compra racional de um veículo.” Essa mesma estratégia é utilizada por outras fabricantes de veículos, como Harley-Davidson, Porsche e Ferrari, que licenciam desde relógios e perfumes até celulares e jogos de videogame. São casos inspiradores, mas difíceis de serem copiados. “A Ford é diferente de uma Harley-Davidson, cuja marca é uma filosofia de vida”, afirma Marcos Vinicius Cardoso, professor de gestão de marcas da faculdade Anhembi Morumbi. “Se quiser transformar a iniciativa em vendas de carros, a monta­dora terá de gerar mais emoção.” Se conseguir, a Ford irá conquistar também os pilotos de fogão.

 

122.jpg